Advogado de Trump pede fim da investigação sobre a Rússia
Declaração pode ser vista como tentativa de obstrução da Justiça e chega depois de o antigo director-adjunto do FBI ter sido despedido a 26 horas da reforma.
Horas depois de o director-adjunto do FBI ter sido despedido, numa decisão vista pelos críticos de Donald Trump como uma vingança pelo seu papel na investigação sobre a Rússia, o advogado do Presidente norte-americano veio dizer que o Departamento de Justiça devia pôr fim a toda a investigação, sugerindo o despedimento do procurador especial Robert Mueller.
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Horas depois de o director-adjunto do FBI ter sido despedido, numa decisão vista pelos críticos de Donald Trump como uma vingança pelo seu papel na investigação sobre a Rússia, o advogado do Presidente norte-americano veio dizer que o Departamento de Justiça devia pôr fim a toda a investigação, sugerindo o despedimento do procurador especial Robert Mueller.
"Rezo para que o procurador-geral-adjunto, Rosenstein, siga o brilhante e corajoso exemplo do Gabinete de Responsabilidade Profissional do FBI e do procurador-geral, Jeff Sessions, e ponha fim à investigação sobre o alegado conluio com a Rússia, fabricada pelo chefe de McCabe, James Comey, com base num dossier fraudulento", disse John Dowd num e-mail enviado ao site The Daily Beast no sábado de manhã.
Segundo a jornalista que escreveu a notícia, o advogado começou por dizer que estava a falar em nome do Presidente, "como seu advogado", mas depois de a notícia ter sido publicada disse que tinha falado em nome pessoal.
Ao sugerir que o procurador especial Robert Mueller seja despedido antes de apresentar as conclusões da investigação sobre a Rússia, o advogado de Trump indica que a estratégia da Casa Branca está a mudar – até agora, os advogados do Presidente tinham dito que iriam colaborar sempre com a equipa de Robert Mueller, apesar de não concordarem com a investigação.
Também no sábado, o próprio Presidente Trump disse que "a investigação de Mueller nem sequer deveria ter começado porque não houve conluio nem nenhum crime".
"Baseou-se em actividades fraudulentas e num dossier falso pago pela Desonesta Hillary e pelo Partido Democrata, e usado de forma imprópria para fazer um pedido de vigilância sobre a minha campanha. CAÇA ÀS BRUXAS!", escreveu Trump no Twitter.
Noutro tweet, o Presidente norte-americano disse que o antigo director-adjunto do FBI, Andrew McCabe, despedido na sexta-feira à noite, "foi apanhado e despedido".
"Quantas centenas de milhares de dólares foram dados à campanha da mulher dele pelo amigo da Desonesta H [Hillary] Terry M [McAuliffe], que também foi investigado? Quantas mentiras? Quantas fugas de informação? O Comey sabia de tudo, e de muito mais!"
Conspiração do "deep state"
Com esta pressão sobre a investigação de Robert Mueller, Trump e o seu advogado reforçam a tese, dirigida principalmente aos apoiantes do Presidente, de que houve uma conspiração contra ele por parte daquilo a que chamam o deep state – um suposto grupo de altos funcionários do Governo americano e do mundo empresarial que serão os verdadeiros líderes dos Estados Unidos, cuja existência nunca foi demonstrada.
Ao mesmo tempo, a investigação do procurador especial Robert Mueller parece estar cada vez mais próxima do Presidente Trump – na semana passada, Mueller intimou o grupo empresarial fundado por Donald Trump, a Trump Organization, a entregar toda a sua documentação relacionada com a Rússia.
Esta aparente aproximação à vida empresarial do Presidente é uma linha vermelha para Donald Trump – em Setembro do ano passado, numa entrevista ao New York Times, o Presidente norte-americano não chegou a afirmar que despediria Robert Mueller se o procurador especial quisesse investigar as finanças da sua empresa ou da sua família, mas disse que isso seria uma violação das tarefas que lhe foram pedidas.
Apesar de ser o Presidente norte-americano ser o responsável máximo pelo Departamento de Justiça e pelo FBI, existe uma tradição nos Estados Unidos de independência nas investigações federais, especialmente quando estão envolvidos altos representantes políticos – uma tradição reforçada após o escândalo Watergarte, na década de 1970, depois de o Presidente Richard Nixon ter tentado forçar o procurador-geral e o procurador-geral-adjunto a despedirem o procurador responsável pela investigação (os dois procuradores demitiram-se para não o fazerem); e que foi mantida quando o Presidente Bill Clinton foi investigado e alvo de um processo de impeachment no Congresso, na década de 1990.
Apesar de parecer razoável que o Presidente Trump se defenda publicamente através de tweets em que acusa antigos directores do FBI de corrupção e manipulação – e de se congratular com o despedimento do antigo director-adjunto Andrew McCabe a 26 horas da reforma, dizendo que foi "um grande dia para a democracia" –, os seus críticos dizem que isso é um desvio da tradição de se garantir independência ao FBI, o que abre as portas à discussão sobre onde acaba a defesa legítima e onde começa a obstrução da Justiça.
Para a Casa Branca, a investigação sobre a Rússia foi fabricada pelo ex-director do FBI, James Comey, despedido em Maio do ano passado pelo procurador-geral-adjunto, Rod Rosenstein, após pressões públicas do Presidente Trump. Comey é acusado pela Casa Branca de ter favorecido Hillary Clinton ao não recomendar uma acusação formal contra ela na investigação sobre os e-mails, e de ter fabricado a investigação sobre a Rússia com base apenas num dossier recolhido por um ex-espião britânico que contém informações não confirmadas sobre episódios da vida sexual de Trump na Rússia.
Nessa suposta cabala estará também envolvido o antigo director-adjunto do FBI, Andrew McCabe, que é, aos olhos do Presidente, um apoiante de Hillary Clinton porque a sua mulher candidatou-se ao Senado pelo Partido Democrata e recebeu fundos de um amigo de Clinton – e apesar de o próprio McCabe estar registado no Partido Republicano.
Tanto Comey como McCabe dizem que registaram por escritos as conversas que tiveram com o Presidente Trump enquanto estiveram em funções. Numa mensagem partilhada esta semana no Twitter, o antigo director do FBI antecipou a publicação do seu livro sobre o tempo em que teve de lidar com a Administração Trump: "Sr. Presidente, os americanos vão ouvir a minha história em breve. E poderão julgar por eles próprios quem é honrado e quem não é."
Até agora, Donald Trump pode dizer que não despediu ninguém; apenas se congratulou com decisões de outros sobre as pessoas que tiveram responsabilidades na investigação sobre a Rússia – de facto, o despedimento de James Comey foi ordenado pelo procurador-geral-adjunto, Rod Rosenstein; o despedimento de McCabe foi ordenado pelo procurador-geral, Jeff Sessions, por recomendação do Gabinete de Responsabilidade Profissional; e os congressistas do Partido Republicano decidiram pôr fim à investigação sobre a Rússia que estava a decorrer na Câmara dos Representantes, chegando à conclusão de que não houve conluio entre a Rússia e a campanha de Donald Trump – uma decisão que o Partido Democrata diz ter sido tomada para favorecer o Presidente.
Mas, em todos estes casos, o Presidente tomou posições públicas que coincidiram com o desfecho de cada um deles, o que leva os seus críticos a dizer que a pressão do Presidente foi determinante para o resultado final.