Fisco tem a Saipem Portugal no núcleo dos grandes contribuintes
Empresa sediada na zona franca é uma das mais de 400 empresas que têm de ser fiscalizadas por uma unidade dos serviços centrais da AT.
A Saipem Portugal Comércio Marítimo, licenciada na zona franca da Madeira, é uma das mais de 400 empresas que o fisco colocou no perímetro de controlo do seu núcleo central que se ocupa em exclusivo do acompanhamento e fiscalização das sociedades com grandes volumes de negócios ou geradoras de mais receita fiscal.
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A Saipem Portugal Comércio Marítimo, licenciada na zona franca da Madeira, é uma das mais de 400 empresas que o fisco colocou no perímetro de controlo do seu núcleo central que se ocupa em exclusivo do acompanhamento e fiscalização das sociedades com grandes volumes de negócios ou geradoras de mais receita fiscal.
É precisamente à Unidade dos Grandes Contribuintes (UGC), a mesma que nos últimos meses passou a acompanhar também cerca de 760 contribuintes singulares com mais rendimentos e património, que cabe fazer o controlo da Saipem Portugal.
Apesar de as competências fiscais relativas ao regime fiscal da zona franca estarem na alçada dos serviços tributários da região autónoma, a Saipem está incluída na lista das entidades em relação às quais a UGC tem de exercer poderes de controlo, porque a empresa cumpre pelo menos um dos critérios previstos na lei para entrar nesse leque de contribuintes. Nessa situação estão, por exemplo, empresas com um volume de negócios superior a 200 milhões de euros, sociedades gestoras de participações sociais com rendimentos acima desse montante ou empresas que pagam mais de 20 milhões de euros em impostos. Um universo onde se incluem entidades que vão desde a Ascendi às sociedades do grupo EDP, passando pela Caixa Geral de Depósitos, o Banco de Portugal, a Santa Casa da Misericórdia ou a Sonae (grupo dono do PÚBLICO).
A UGC tem 15 grandes atribuições. E, como tal, são válidas em relação à Saipem Portugal e a todos as outros nomes da lista dos grandes contribuintes publicada pela directora-geral da AT, Helena Borges: desde o poder de instaurar e instruir processos de inquérito à possibilidade de realizar inspecções à contabilidade, acompanhar os processos de atribuição de benefícios fiscais, ou simplesmente prestar informações, prestar assistência quanto ao preenchimento de declarações e estar atenta ao comportamento tributário da empresa.
A Saipem Portugal, com 23 anos, tem vindo a invocar benefícios fiscais que foram sendo fixados ao longo dos anos ao abrigo do regime do Centro Internacional de Negócios da Madeira.
Além de estar sediada no Caniçal, em Machico, a Saipem Portugal Comércio Marítimo está referenciada numa base de dados internacional como tendo sido registada na Austrália em 2002, na Índia em 2004 e em Chipre em 2015. Por sua vez, há três sociedades Saipem Spa que aparecem referenciadas nas bases de dados públicas dos Paradise Papers, uma das fugas de informação do Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (CIJI) que teve como principal fonte documentos confidenciais do escritório Appleby e outras operadoras de serviços offshore em diferentes territórios. Uma das sociedades aparecia ligada às Baamas, outra a Malta e outra a um dos territórios das Antilhas Holandesas.
À Autoridade Tributária e Assuntos Fiscais da Região Autónoma da Madeira (AT-RAM) cabe “acompanhar e coordenar o exercício das actividades desenvolvidas” na zona franca, “nomeadamente no procedimento administrativo relativo aos processos de pedidos de licenças remetidos pela concessionária” do centro de negócios, a Sociedade de Desenvolvimento da Madeira (SDM), detida maioritariamente (em 51%) pelo Grupo Pestana e com o restante capital (49%) nas mãos do Governo regional, a quem cabe receber 62% da receita.
O diploma que há um ano veio rever a orgânica da AT-RAM determinava, ao mesmo tempo, que a Autoridade Tributária e Aduaneira sediada em Lisboa continua a assegurar a realização dos procedimentos administrativos e informáticos até a autoridade fiscal da Madeira ter “instalados todos os meios logísticos necessários ao exercício da plenitude das atribuições e competências” fiscais (onde se inclui o acompanhamento das actividades da zona franca). E referia que esse acompanhamento incluiu os procedimentos relacionados com a liquidação e a cobrança dos impostos que são receita da região autónoma.
Questionado sobre as situações em que uma empresa está na zona franca e é um grande contribuinte, o Ministério das Finanças garantiu que todas as grandes empresas que constam da lista dos grandes contribuintes – como é o caso da Saipem Portugal – “são acompanhadas pela UGC”, incumbida de fazer o “controlo e inspecção” das sociedades.
O actual regime da zona franca permite às novas empresas que ali se instalem até ao final de 2020 beneficiar de um IRC de 5% (até 2027) para os lucros das operações desenvolvidas com entidades licenciadas na zona franca ou com outras entidades que não sejam residentes em Portugal. Nas operações com empresas ou entidades residentes no país (fora da zona franca) o IRC pago é de 21%; a excepção está nas operações de produção e montagem, em que beneficiam da taxa reduzida mesmo que estejam em causa situações que têm a ver com entidades residentes no território português.