Nesta guest house, a música está do outro lado da porta

Basta atravessar a passadeira da Avenida da Boavista para ir ver um concerto à Casa da Música, no Porto. Cruze de volta e está à porta da Porto Music Guest house, outra casa onde a música quase entra pelas janelas.

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Há hóspedes que espreitam pela janela do quarto, apontam para o outro lado da Avenida da Boavista e perguntam: “Que edifício estranho é aquele?”. “Aquilo é a Casa da Música”, responde tantas vezes Susana Mota Freitas, sem precisar de ver para onde estão a apontar.

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Há hóspedes que espreitam pela janela do quarto, apontam para o outro lado da Avenida da Boavista e perguntam: “Que edifício estranho é aquele?”. “Aquilo é a Casa da Música”, responde tantas vezes Susana Mota Freitas, sem precisar de ver para onde estão a apontar.

Há também os que chegam à guest house que gere com o marido no final de um concerto ou de uma visita guiada e a esses não há muito mais a explicar. Já vêem espantados. Entre as várias ofertas de alojamento local no Porto, aos apreciadores de música chama a atenção a proximidade entre a sala do Viajante, onde agora nos sentamos, e a sala de espectáculos que se ilumina à nossa frente. A vizinhança é tão óbvia — direcções: esperar que o semáforo fique verde e atravessar a passadeira — que a última emprestou parte do nome à primeira: chamaram-lhe então Porto Music Guest House.

Em noite de concerto, se as cortinas estiverem abertas, a “luz da escadaria exterior da Casa da Música entra quarto adentro”, garante-nos Susana Mota Freitas, 47 anos. Conta pelos dedos: além da sala comum, três dos sete quartos estão virados para a casa projectada pelo arquitecto holandês Rem Koolhaas (são eles os únicos dois que não estão equipados com kitchenette e o estúdio, com varanda, cozinha e possibilidade de comportar uma cama extra).

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Joana Gonçalves

A localização, embora feliz, diz-nos, “foi um mero acaso”. “A casa centenária pertence à família desde que o meu pai a comprou, logo com o intuito de a vender”, explica. Enquanto isso não acontecia, o primeiro piso e o terraço recebiam festas e almoços de família. É também ali que, de há três anos para cá, está a cozinha semi-industrial que recebe o outro negócio de Susana Freitas, uma empresa de catering empresarial onde por vezes também se confeccionam alguns dos produtos com que nos deparamos na mesa do pequeno-almoço — mas já lá vamos.

Tanto ela como ele acabavam por entrar na casa quase todos os dias. E tentavam não se apegar. Diziam sempre: “Quando se vender, vendeu-se e paciência.” Até que chegou uma proposta e, paciência, não a venderam. “Senti-me encurralada e disse que não”, ri-se, com um encolher de ombros. “Mas sabia que tinha de fazer mais alguma coisa com uma casa deste tamanho.”

O edifício tem três pisos, ligados por uma escadaria de madeira que se mantém fiel à estrutura original. Por isso é que não foi construído um elevador, o que dificulta o acesso a pessoas de mobilidade reduzida.

Desde Junho último, a casa de família que não o era realmente transformou-se em casa de hóspedes e consegue acomodar 17 pessoas em simultâneo. São recebidos um a um, com um cálice de vinho do Porto e uma lista com sugestões de actividades que Susana rabisca numa folha pela manhã.

“A relação que cultivamos com os hóspedes é bastante diferente da que temos com os clientes do catering empresarial.” E não lhe restam dúvidas: “É a razão principal para dizermos que isto é realmente engraçado.”

Susana e António Maria Pires pensaram um sítio onde se pudesse estar à vontade — essa foi, aliás, uma das preocupações a nível da decoração, que ficou à responsabilidade de António. “A nossa filosofia é sempre ‘Esteja como está em sua casa, com todo o apoio de que necessita’”, cita.

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Joana Gonçalves

É por isso que por lá não encontramos portas fechadas, mesmo depois das 22h, hora a partir da qual a casa fica exclusivamente nas mãos dos hóspedes, que podem entrar com o código que lhes é atribuído aquando do check-in.

“Acho que tem um bocadinho a ver com a nossa maneira de ser, do que gostamos de ver quando viajamos, como também da própria casa.” E os hóspedes, garante, “também sentem isso”. “Isto é uma casa familiar, não é um hotel. E não nos queremos mascarar como tal.” Prova disso é também o pequeno-almoço.

É domingo e Susana Freitas regressa por volta das 9h, depois de ter deixado dois turistas franceses em Serralves. Faz isto sempre que pode, caso todos os hóspedes já tenham descido até à sala de pequeno-almoço e não tenha entradas previstas para essa hora. “Não custa nada e, apesar de termos muitos transportes públicos a passar por aqui, ao fim-de-semana são menos frequentes”, explica, enquanto entra. “E como hoje toda a gente decidiu madrugar…”

Bom, quase toda a gente. Estamos sozinhos na sala quando nos aproximamos da mesa do bufett. À nossa frente há três tipos de pão, em miniatura, para que “se possam aventurar por todos”, panquecas acabadas de fazer que chegam ainda quentes, bolo caseiro e queijadinhas de laranja, sumo, café, leite, compotas, queijo, fiambre e manteiga. Parece familiar? “É um pequeno-almoço assumidamente português”, diz-nos, perante a ausência dos ovos mexidos e do bacon e da presença do croissant brioche, ao invés do francês. O design, os utensílios, electrodomésticos, máquinas de café e restantes materiais utilizados na decoração também têm todos ADN português.

É mais ou menos esta a fórmula diária. Bolos caseiros sempre diferentes, pequenas alterações caso alguém aponte intolerâncias ou alergias alimentares e, caprichosamente, sim, “poderá haver ovos mexidos ou cozidos”. “As outras coisas arranjam em qualquer outro sítio e assim podem sair daqui a dizer que tiveram uma mesa portuguesa.” Caso queira sair e ter outra experiência portuguesa, a fadista Cuca Roseta actua esta noite, do outro lado da passadeira. E temos a certeza que o concerto não escapou à lista de sugestões de Susana.

A Fugas esteve alojada a convite da Porto Music Guest House

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