Com jóias ecológicas, ela muda a vida das mulheres em São Tomé

Estrela Matilde tem 32 anos e vive na ilha do Príncipe desde os 26. A ideia de fazer um negócio de jóias artesanais a partir de garrafas de vidro, ajudando a capacitar as mulheres de São Tomé, garantiu-lhe o primeiro lugar do Prémio Terre de Femmes.

Foto
Estrela Matilde Gustavo Galhardo Figueiredo

Foi depois do mestrado em Biologia da Conservação, em Évora, que Estrela Matilde decidiu partir para a ilha do Príncipe, em São Tomé, com 26 anos. Tudo começou com um “projecto de seis meses para fazer a certificação ambiental de um dos hotéis da ilha”. “Achei que seria uma oportunidade única de vida, [mas] cinco anos depois ainda cá estou”, conta, em entrevista telefónica ao P3. Agarrou a missão de “criar oportunidades de desenvolvimento económico e social que permitam a conservação da natureza e protecção das espécies”. E, pelo meio, “melhorar a qualidade de vida das pessoas”.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

Foi depois do mestrado em Biologia da Conservação, em Évora, que Estrela Matilde decidiu partir para a ilha do Príncipe, em São Tomé, com 26 anos. Tudo começou com um “projecto de seis meses para fazer a certificação ambiental de um dos hotéis da ilha”. “Achei que seria uma oportunidade única de vida, [mas] cinco anos depois ainda cá estou”, conta, em entrevista telefónica ao P3. Agarrou a missão de “criar oportunidades de desenvolvimento económico e social que permitam a conservação da natureza e protecção das espécies”. E, pelo meio, “melhorar a qualidade de vida das pessoas”.

Esta constante preocupação levou-a agora a vencer a 9.ª edição do Terre de Femmes 2018, o prémio atribuído pela Fundação Yves Rocher que distingue projectos amigos do ambiente com assinatura feminina. É o caso da Cooperativa de Valorização de Resíduos, uma iniciativa concebida por um grupo de dez mulheres da comunidade local “de forma espontânea”. E uma forma de Estrela ajudar as são-tomenses a criar o seu próprio negócio, ao mesmo tempo que protegem o ambiente. 

Foto
A corporativa dedica-se a criar jóias a partir de garrafas de vidro usadas Gustavo Galhardo Figueiredo

A ideia inicial era “pegar nos vidros e fazer areia para construção”, mas rapidamente perceberam que não seria um negócio rentável. “Era preciso muito vidro para fazer pouca areia”, conta a bióloga. Então, com a ajuda de Estrela, surge um novo plano. A partir de garrafas de vidro usadas, começaram a fazer jóias artesanais e, com a recolha de resíduos orgânicos, iniciaram a produção de composto para a agricultura. “As dez senhoras já recebem um ordenado certo todos os meses. E, portanto, a Cooperativa já está a dar rendimento a estas famílias.”

Mas nem sempre foi fácil, confessa a jovem de 32 anos. “Foram quase dois anos sem receberam nada” e, por isso, era “difícil mantê-las a trabalhar”. Viam-se obrigadas a procurar outra ocupação. “Como tinham que ir fazer dinheiro para outro sítio, acabavam por não produzir. Como não produziam, também não faziam dinheiro.” Hoje, “têm mais procura do que oferta”, mas como “não têm transporte para ir fazer a recolha da matéria orgânica, acabam por não conseguir ter matéria orgânica suficiente”. Mas em breve esse cenário pode mudar: os dez mil euros do prémio vão ser usados na compra de uma carrinha. O primeiro lugar também permitiu à Cooperativa entrar na corrida pelo prémio internacional, no valor de cinco mil euros, sujeito a votação online (a decorrer até 26 de Março).

É melhor conservar do que destruir

Quando o projecto começou, Estrela era técnica da Fundação Príncipe Trust, a organização não-governamental que ajudou a desenvolver o projecto e que financiou a formação das mulheres. Entretanto Matilde foi convidada para assumir a direcção, cargo que agora desempenha. Na fundação, já estão a ser marinadas planos para o futuro. “Estamos a crescer todos os dias”, revela. Actualmente com 47 funcionários, estão “sempre a ganhar novas parcerias e a receber convites para integrar outros projectos”.

O seu trabalho na ilha, porém, arrancou muito antes. “Começámos com um projecto de troca de plástico” numa parceria com o governo regional, em que foram realizadas acções de educação ambiental sobre o plástico e os resíduos em todas as escolas. Além disso, também foram feitas campanhas de sensibilização sobre as espécies da ilha, criou-se uma associação de guias locais para proteger o parque natural e apostou-se no trabalho com jovens. “Tentamos mostrar que conseguem fazer mais dinheiro a proteger e a conservar do que a destruir.”

Enquanto sentir que faz a diferença, o Príncipe vai continuar a ser a casa de Estrela Matilde. “Enquanto eu sentir que as pessoas precisam que eu esteja na ilha e que têm melhores condições de vida por causa do trabalho que estou a fazer, vou ficando.” O objectivo final — e “cenário ideal” — é formar e capacitar pessoas locais para assumirem os seus projectos. “E aí posso sair descansada porque as coisas ficam em boas mãos.”

Foto
Antes das jóias, a ideia era pegar nos vidros e fazer areia para construção Gustavo Galhardo Figueiredo