CDS quer crescer à custa do PSD e ser a “única alternativa” à esquerda

Assunção Cristas coloca o CDS como alternativa ao Governo das “esquerdas unidas”, ou como adaptou no discurso deste sábado, “das esquerdas encostadas”.

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Assunção Cristas tem a ambição de fazer do CDS o principal partido do centro-direita Adriano Miranda

Nunca o PSD é referido de forma explícita, mas o discurso da líder do CDS assume que o partido quer ser a alternativa, a “única alternativa”, às esquerdas “encostadas”, o “primeiro no espaço do centro-direita”. Ou seja, a fasquia é ser o número um face ao PSD de Rui Rio. Os recados indirectos aos sociais-democratas ficaram por conta de outros dirigentes democratas-cristãos.

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Nunca o PSD é referido de forma explícita, mas o discurso da líder do CDS assume que o partido quer ser a alternativa, a “única alternativa”, às esquerdas “encostadas”, o “primeiro no espaço do centro-direita”. Ou seja, a fasquia é ser o número um face ao PSD de Rui Rio. Os recados indirectos aos sociais-democratas ficaram por conta de outros dirigentes democratas-cristãos.

No discurso do primeiro-dia do 27.º congresso do CDS em Lamego, Assunção Cristas falou para dentro do partido – com um balanço da oposição dos últimos dois anos –, mas também para fora. “Queremos ser o primeiro partido no espaço do centro e da direita, sem hesitações, sem complexos”, proclamou, traduzindo a ideia de que o CDS tem de ser a “primeira escolha” como já tinha vindo a sublinhar. Sinal de que Cristas não espera pelo PSD é o anúncio de que a bancada centrista irá levar a votos o Programa de Estabilidade apresentado pelo Governo. O texto, que aponta caminhos para o Orçamento do Estado de 2019, não é votado em si mesmo, mas pode ter associados projectos de resolução cuja votação reflecte um sinal político. O CDS já tomou esta mesma iniciativa no ano passado, fazendo o contraste com o PSD de Passos Coelho.

No dia em que Cristas, numa entrevista ao Expresso, diz que é “melhor” do que Rui Rio e que se vê como primeira-ministra, a líder centrista coloca o CDS como alternativa ao Governo das “esquerdas unidas”, ou como adaptou no discurso deste sábado, “das esquerdas encostadas”. Mais do que isso, o partido foi apresentado como a “única alternativa”, numa expressão que só pode ser lida face ao seu antigo parceiro de coligação no Governo – o PSD.  

Num discurso em que gastou boa parte a prestar contas de dois anos de oposição, a líder do CDS traçou algumas linhas essenciais de crítica ao “Governo das esquerdas encostadas”. É por gerir o “dia-dia”, por “não ter uma visão de futuro para o país”, por esconder “a austeridade na degradação dos serviços públicos essenciais”, a “austeridade nos impostos indirectos”, por “continuar a aumentar a dívida pública em valores absolutos, e voltar aos vícios do passado”. Num traço comum ao discurso do PSD de Rui Rio, Cristas considera que o Governo está a desperdiçar a “oportunidade de trabalhar mais em prol do crescimento sustentado e da competitividade de Portugal”.

As alfinetadas ao PSD, ainda que indirectas, ficaram a cargo de Diogo Feio, coordenador do gabinete de estudos do partido, quando chamou a atenção para a necessidade de reformas. “Discutimos reformas, sim, mas, no Parlamento, à vista de todos”, disse, sem se referir às conversações que decorrem directamente entre dirigentes do PSD e ministros sobre descentralização e fundos comunitários, e que não passam pela Assembleia da República.

Respondendo de certa forma ao debate que se instalou sobre ideologia ou pragmatismo, Cristas encarnou uma síntese dos dois. Assume-se como pragmática – porque quer “chegar a todos” –, mas reconhece que o seu CDS “é o que tem a democracia cristã como eixo da roda”, recordando as palavras de Adriano Moreira, considerando que o partido é “a casa do centro e da direita das liberdades, juntando conservadores e liberais”. Com o objectivo de passar a imagem de esforço, de trabalho, Cristas diz-se uma “pessoa de acção” e com uma linguagem acessível. “A doutrina não se proclama, mas põe-se em acção, enformando as nossas propostas concretas”, resumiu.

A mesma ideia de que a ideologia não vive sem pragmatismo foi partilhada por Francisco Rodrigues dos Santos, líder da Juventude Popular (JP), quando disse que “não são um casal divorciado” e são sim “irmãos siameses”. Uma sem a outra é “como professar uma religião sem ter fé, é como querer ver o mundo de olhos fechados”, disse, num tom inflamado. Rodrigues dos Santos recebeu aplausos de pé dos congressistas depois de dizer que quer ver a eleição de Cristas como “primeira-ministra” e que o CDS tem de “crescer, crescer, crescer”.

Em jeito de propaganda de um partido que está a crescer e que é de proximidade, o palco do congresso – com três ecrãs gigantes – abrigou por momentos dezenas de novos militantes, alguns dos quais deram o seu testemunho em vídeo. Foi um momento de festa ao som da música “Changes”, de Faul Wad and Ad, a festa que Assunção Cristas já disse gostar num congresso. A festa acabaria por ficar manchada com a intervenção de Filipe Lobo d’Ávila, crítico de Assunção Cristas, e que no último congresso liderou uma lista alternativa ao Conselho Nacional. O deputado anunciou que vai deixar o Parlamento “em breve” não sem antes denunciar “práticas internas surrealistas” e sublinhar a necessidade de haver “diversidade e pluralismo” no partido. Prometendo que não irá “atirar a toalha ao chão”, o ex-secretário de Estado da Administração Interna negou quaisquer divisões internas: “Aqui não há cisões, não há dissidências, aqui não há birras.”

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O tema ideologia e pragmatismo constou de vários discursos de militantes, fossem eles autores de moções globais ou sectoriais. Um deles foi o de Abel Matos Santos, porta-voz da Tendência Esperança em Movimento, corrente interna, que vê o CDS como um partido de “causas e de valores da democracia-cristã”. Como representante da corrente interna na comissão política nacional, Abel Matos Santos defende que é por essa via que o CDS tem de se saber distinguir: “Não queremos ser um PSD pequenino, um PSD azul e branco.”

Sem esquecer a sua proximidade ao ex-líder Manuel Monteiro, Abel Matos Santos quis apelar à reconciliação interna e deixou uma crítica implícita ao facto de Cristas não ter convidado Monteiro para a homenagem do sábado de manhã ao líder histórico Adriano Moreira. “Para crescermos e nos afirmarmos precisamos de todos – incluindo Manuel Monteiro, senhora presidente”, disse, depois de referir que Assunção Cristas “não pode ficar refém dos estados de alma de ninguém”.

Houve quem considerasse inútil a discussão sobre a matriz do partido. João Gonçalves Pereira, líder da distrital de Lisboa, lançou uma pergunta na sala: “A Assunção Cristas, o Nuno Melo, o Telmo Correia, o Filipe Lobo d’Ávila, não são verdadeiros democratas-cristãos? Alguma dúvida com isto? Não devíamos estar a perder tempo com isto”.