O futuro da geometria variável
Em 2019 não será fácil repetir a equação e manter a “geringonça” a funcionar de modo igual.
Curioso, como os números nos desmontam duas realidades que temos por certas com esta “geringonça”. Por um lado, solidez: em mais de dois anos de legislatura, as bancadas parlamentares do PS, do BE e do PCP votaram juntas em 72% das votações. Solidez? Sim, mas compare com a legislatura passada, quando PSD e CDS (em coligação) votaram juntos em 99% dos projectos e propostas de lei. E pergunte-se: consegue imaginar um governo em que o maior partido não concorda com 28% das medidas?
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Curioso, como os números nos desmontam duas realidades que temos por certas com esta “geringonça”. Por um lado, solidez: em mais de dois anos de legislatura, as bancadas parlamentares do PS, do BE e do PCP votaram juntas em 72% das votações. Solidez? Sim, mas compare com a legislatura passada, quando PSD e CDS (em coligação) votaram juntos em 99% dos projectos e propostas de lei. E pergunte-se: consegue imaginar um governo em que o maior partido não concorda com 28% das medidas?
Por outro lado, a bipolarização crescente entre esquerda e direita: quantas vezes terão estado juntas as bancadas do PS e do PSD? Ao contrário do que aparenta, em 54% das votações. E com o CDS também: 54%. Os números são quase iguais aos da legislatura passada, quando os socialistas, tão antitroika, votaram em 48% das vezes tal e qual como o PSD de Passos Coelho. A conclusão só pode ser esta: António Costa tem governado à esquerda, sim, mas num permanente jogo de equilíbrio parlamentar.
E pur si muove, é claro que “geringonça” funciona. Mas funcionou numa conjuntura favorável. Primeiro, do ponto de vista programático, em que reverter as medidas de austeridade se tornou o alfa e ómega de tudo. Segundo, do ponto de vista económico, em que o vento correu de feição. E o factor económico não é de somenos. Portugal está a caminho do seu quinto ano de crescimento económico consecutivo – que é, aliás, o que mostra taxas de crescimento real do PIB mais baixas de sempre. No final desta legislatura, se tudo correr bem, serão seis anos.
No historial registado pela Pordata, não há um só ciclo de crescimento desde o 25 de Abril com mais do que nove anos. Pelo que, como explicou Bruno Faria Lopes no Negócios, tudo indica que a próxima legislatura pode ser diferente da actual – não só pelo registo histórico, como pela reversão da política de estímulos do BCE, que provavelmente passará a ser liderado por um alemão.
Este é o ponto de partida para a próxima legislatura, aquela em que muitos cenários nos parecem possíveis. Aquela em que continuará a ser necessário reduzir a dívida, em que será preciso responder aos desafios desta era de permanente mudança, velocidade e flexibilidade. Nesta fase, a mais de meio da legislatura, o PS de António Costa já esgotou quase todo o seu programa comum com as esquerdas. E tenta gerir os temas do futuro em geometria variável, da Uber à flexibilidade, da descentralização ao arrendamento urbano. Em 2019 não será fácil, por tudo isto, repetir a equação e manter a “geringonça” a funcionar de modo igual.