Le Pen quer rebaptizar a FN como Reagrupamento Nacional
Líder pretende suavizar a imagem radical do partido de extrema-direita francês junto do eleitorado. Faltou-lhe fazer o mesmo ao discurso.
Foi preciso esperar até ao último suspiro do congresso da Frente Nacional (FN) para se ficar a conhecer o nome que Marine Le Pen quer dar ao partido de extrema-direita francês e, com o gesto, prosseguir na sua interminável missão de o ‘desdiabolizar’ junto do eleitorado. Ao fim de mais de uma hora de um discurso de encerramento agressivo e hostil contra imigrantes, capitalistas, globalistas e europeístas, em nada distinto de um qualquer outro comício por si protagonizado, a líder reeleita anunciou que pretende rebaptizar a FN de Reagrupamento Nacional – Rassemblement National, no original.
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Foi preciso esperar até ao último suspiro do congresso da Frente Nacional (FN) para se ficar a conhecer o nome que Marine Le Pen quer dar ao partido de extrema-direita francês e, com o gesto, prosseguir na sua interminável missão de o ‘desdiabolizar’ junto do eleitorado. Ao fim de mais de uma hora de um discurso de encerramento agressivo e hostil contra imigrantes, capitalistas, globalistas e europeístas, em nada distinto de um qualquer outro comício por si protagonizado, a líder reeleita anunciou que pretende rebaptizar a FN de Reagrupamento Nacional – Rassemblement National, no original.
A proposta de Le Pen, apresentada este domingo em Lille, recupera a matriz política assumidamente “gaullista” da FN. Pouco depois da II Guerra Mundial, o general Charles de Gaulle fundou um partido e chamou-lhe Reagrupamento do Povo Francês – opção semelhante foi tomada mais tarde por Jacques Chirac, com a criação do Reagrupamento para a República, em 1976.
A nova denominação da FN ainda terá, no entanto, de ser aprovada pela maioria dos militantes, através de voto postal, num processo que dificilmente estará concluído em menos de seis semanas, de acordo com a própria Le Pen.
“O nome da Frente Nacional carrega consigo uma História épica e gloriosa, que ninguém deve negar. Mas também sabemos que é um obstáculo psicológico para muitos franceses”, justificou Le Pen, em clara contradição com o seu pai e fundador do partido, Jean-Marie Le Pen, que já considerara a intenção de mudar o nome da FN como um “suicídio”.
“[O Reagrupamento Nacional] deve ser mais do que um projecto. Deve ser um grito de reunião, um chamamento para que aqueles que têm a França e os franceses no seu coração se juntem a nós”, explicou a líder.
O desejo de romper de uma vez por todas com o legado de Jean-Marie Le Pen e com o rótulo de organização radical, xenófoba, racista e fascista, que a FN tem com mais ou menos vigor desde a sua fundação (1972), é o principal motivo para esta mudança de nome e da missão liderada por Marine desde que, em 2011, recebeu a chefia do partido. É ele que explica, por exemplo, a naturalidade com que se aprovou durante o congresso deste fim-de-semana a supressão do cargo de presidente honorário da FN, detido por Jean-Marie, hoje com 89 anos.
E é também esse desejo que explica o crescimento brutal da FN nos últimos anos, assentes na moderação do seu discurso mais extremista e no redireccionamento das suas prioridades para as camadas sociais mais desfavorecidas da sociedade francesa, sem nunca abdicar das chamadas “políticas de identidade”. Com esta mudança, a Frente Nacional transformou-se numa organização suportada por uma máquina partidária robusta e por um eleitorado com representação nacional e chegou à segunda volta das presidenciais de Maio de 2017.
Mas a derrota contra Emmanuel Macron e a identificação de alguns erros estratégicos cometidos por Le Pen nas semanas anteriores às eleições, provaram que a suavização do discurso foi insuficiente para lograr voos mais altos. A FN entrou em ebulição e Marine ficou fragilizada e a precisar de reafirmar a sua legitimidade como líder. Este 16.º congresso surgiu, assim, na altura certa.
Mesmo com o nome da sobrinha Marion (que suspendeu a actividade política) a ecoar pelos corredores e com a presença de Steve Bannon no congresso a revelar-se uma distracção – o ex-conselheiro do Presidente americano Donald Trump causou enorme polémica ao aconselhar os militantes da FN a utilizarem as acusações de racismo, nativismo e xenofobia de que são alvo como “medalha de honra” e ao defender que a História "está do lado" do movimento antiglobalista e da extrema-direita –, Le Pen foi eleita para um terceiro mandato, sem qualquer oposição.
“Originariamente éramos um partido de protesto, depois fomos [um partido] de oposição. Que não restem dúvidas de que agora somos um partido de governo”, foi uma das mensagens fortes deixadas num discurso muito crítico para Macron e para a sociedade de “nómadas” e “globalistas” que, disse, o Presidente promove.
E foi ao som de cânticos de “Estamos em nossa casa”, alimentados com promessas favoráveis à protecção dos franceses e da sua cultura e por um desprezo publicamente assumido tanto para com a imigração legal como a para a ilegal, que uma Marine Le Pen legitimada foi aclamada pelas bases da FN, ou, de acordo com a intenção da líder, do Reagrupamento Nacional. Que o nome proposto para partido é diferente não restam dúvidas. Quanto ao discurso, esse, para já, mantém-se polidamente semelhante.