Parlamento preocupado com racismo e violência na polícia e nas prisões
Deputados querem sair da Assembleia e visitar prisões, fazer debates, audições e colocar o tema na agenda. "Cultura de impunidade e complacência" é transversal, denunciam PS e BE. "Portugal tem um problema de racismo", reconheceram.
Da esquerda à direita, os deputados da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias do Parlamento manifestaram esta quarta-feira preocupação com o problema da violência policial, do racismo e da violação de direitos humanos nas prisões denunciadas no relatório do Comité Anti-Tortura do Conselho da Europa, divulgado na semana passada.
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Da esquerda à direita, os deputados da Comissão de Assuntos Constitucionais, Direitos, Liberdades e Garantias do Parlamento manifestaram esta quarta-feira preocupação com o problema da violência policial, do racismo e da violação de direitos humanos nas prisões denunciadas no relatório do Comité Anti-Tortura do Conselho da Europa, divulgado na semana passada.
Os deputados querem sair da Assembleia e visitar prisões, fazer debates, audições e colocar o tema na agenda. Até à próxima semana, planeiam calendarizar essas iniciativas, anunciou o presidente daquela comissão, Pedro Bacelar Vasconcelos. Isto no dia em que a Inspecção-Geral da Administração Interna (IGAI) divulgou que no ano passado recebeu 772 queixas contra as forças de segurança, valor mais alto dos últimos quatro anos e mais 42 do que em 2016.
A ideia da visita ao Estabelecimento Prisional de Lisboa foi sugerida no início pelo deputado do PSD Carlos Peixoto, que se referiu a “descrições dantescas” no relatório e afirmou que deveriam ouvir os diversos intervenientes do sistema como polícias, guardas, magistrados. “Quando o Comité coloca Portugal no último lugar nos direitos humanos devem soar sinais de alerta. São denúncias de maus tratos, racismo, xenofobia, supremacia da raça branca e tortura, tudo aquilo que envergonha um país”, referiu.
A responsável do Comité que elaborou o relatório referiu ao PÚBLICO que Portugal está no topo dos países da Europa Ocidental com o maior número de casos de violência policial e o relatório sublinhava que os riscos de abusos são maiores para afrodescendentes portugueses e estrangeiros, o que indicia discriminação racial. Relatava vários casos de abusos pelas forças de segurança e violação de direitos humanos nas prisões.
O deputado do PS Filipe Neto Brandão alertou para o facto de o relatório ser mais uma denúncia de "patologias do sistema" que têm tido persistência. “O que se passa é que há uma cultura de impunidade e complacência transversal.” E sublinhou a referência que o comité faz à discriminação racial e étnica como “preocupante”.
Já a deputada do mesmo partido Isabel Moreira foi mais concreta: “Não é todos os dias que se discute o fenómeno do racismo tão presente na sociedade portuguesa”, referiu. “É uma realidade que existe em Portugal, um apartheid que se verifica ao nível do emprego, das condições sociais, da forma como as pessoas são percepcionadas e tem consequências no que estamos a discutir neste relatório. Era importante ouvir os próprios”, sublinhou. Lembrou outras avaliações internacionais a Portugal que denunciavam a discriminação racial, afrofobia, denúncias que têm sido feitas “insistentemente” por “pessoas que se dedicam à matéria” e por associações no terreno.
Para o Bloco de Esquerda, pela voz de José Manuel Pureza, a “crítica sobre prática de violência policial é demasiado recorrente". Isto porque "atravessa anos a fio, governos a fio e não pode deixar de merecer a maior das preocupações”.
Reconheceu que a abordagem ao tema é difícil porque “são práticas instaladas há muito tempo” mas este relatório tem duas dimensões que acrescentam gravidade: a de se tratar de “violência perpetrada no sistema prisional” e a “violência com natureza racista”. Isto “mostra que Portugal tem efectivamente um problema de racismo”. Sugeriu, então, o reforço dos mecanismos de prevenção e de sanções “e actuar na formação”.
Também o CDS, através da deputada Vânia Dias da Silva, referiu "a gravidade" do problema da violência policial e das condições das prisões, e disse ter recebido “com muita preocupação os sucessivos relatórios”. Porém, referiu que a “violência contra os polícias tem aumentado”, fenómeno sobre o qual se devem também debruçar.
A gravidade das situações relatadas “não pode ser subestimada”, sublinhou, por outro lado, António Filipe do PCP, por isso deve existir, pela parte da Comissão, uma atenção e acompanhamento permanentes.
A comissão vai em breve ouvir a ministra da Justiça, Francisca Van Dunem, que já respondeu positivamente à comissão sobre o pedido da sua presença mas ainda não definiu data. Bacelar de Vasconcelos referiu que faz sentido alargar essa audição a outros responsáveis visados no relatório, como o Ministério da Administração Interna.