“Estamos inevitavelmente condenados a entendermo-nos com o PSD”

O CDS chega ao Congresso Nacional com uma liderança consolidada e uma união interna em torno de Assunção Cristas. Lisboa foi proveta num ensaio que tem nas Legislativas 2019 o seu principal acto. Será que um partido unido chega para a direita voltar ao poder?

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É uma ideia transversal no discurso dos militantes do CDS: o objectivo principal do partido é que a direita tenha a maioria em 2019. Não se fala noutro número que não “116 deputados” - aqueles que são necessários para uma maioria no Parlamento.

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É uma ideia transversal no discurso dos militantes do CDS: o objectivo principal do partido é que a direita tenha a maioria em 2019. Não se fala noutro número que não “116 deputados” - aqueles que são necessários para uma maioria no Parlamento.

Parece ser certo que a direita parlamentar vai ter de se entender se quiser ser Governo, por isso também os centristas estão atentos a Rui Rio, porque o sucesso parlamentar está também nas mãos da nova liderança do PSD.

Em entrevista ao PÚBLICO, o vice-presidente dos centristas, Nuno Melo, diz que “já não basta ao PSD ou ao CDS vencerem eleições para poderem governar”. O eurodeputado antevê a repetição da actual solução governativa “se a direita não tiver maioria absoluta”, deixando o cenário resumido a um “ou nós ou eles”. Apesar de não ser o maior partido da oposição, Nuno Melo garante que o CDS “é muitas vezes o motor da oposição”.

Diogo Feio, coordenador do Gabinete de Estudos do CDS, diz que António Costa criou um novo modelo para a política em Portugal. “Nas últimas legislativas, um partido que não venceu as eleições acabou por poder formar uma maioria. António Costa teve a possibilidade de formar uma maioria com PSD/CDS,  mas optou por fazer uma maioria com Bloco de Esquerda e PCP. Por isso, foi António Costa que gerou essa divisão”.
O dirigente do CDS acusa mesmo o actual primeiro-ministro: “Se nós hoje ainda não temos acordos que sejam de médio prazo, há um grande responsável por isso: António Costa, que não tem qualquer interesse neles”. E indo mais longe garante que “enquanto António Costa for líder do PS, as coisas vão naturalmente passar-se assim”.
Sobre as relações e o diálogo com o PSD, Nuno Melo diz que este é um partido com o qual o CDS “está inevitavelmente condenado a entender-se”, e que “não seria normal ter uma fractura com o PSD a nível nacional quando todos os dias há nas autarquias boas relações”. O político deixa assim antever uma aproximação com os sociais-democratas em várias áreas.

A propósito de Rui Rio, Nuno Melo fala em alguém que “teve sempre boas relações com o CDS”, tendo os centristas feito parte da coligação liderada por Rio à Câmara Municipal do Porto, entre 2001 e 2013. Já Diogo Feio não comenta a liderança do PSD, mas diz que há um espaço alternativo ao Partido Socialista, onde estão o CDS e o PSD, e, repete a frase já tantas vezes ouvida, “o objectivo é ter mais um deputado do que a maioria absoluta”.

Fim do voto útil

A líder do CDS, Assunção Cristas, disse na passada segunda-feira, em Matosinhos, que a direita pode ter a maioria parlamentar em 2019, antevendo uma ligação natural com os sociais-democratas. Questionado sobre se os portugueses podiam ver estas declarações como um “votar no CDS ou num PSD vai dar ao mesmo”, Nuno Melo diz que se trata, sim, do contrário. O eurodeputado entende que esta solução governativa “acabou com a lógica do voto útil”, que “estava a prejudicar o CDS”.

Diogo Feio reitera essa afirmação, ao dizer que o voto útil “já estava num processo de erosão, e agora não tem qualquer sentido”. Para o político, o resultado que Cristas teve em Lisboa nas autárquicas de Outubro passado tem de servir “como alento” ao CDS. Insiste que o partido já está a trabalhar desde há dois anos para as próximas legislativas e que vai trabalhar para ter “o melhor resultado possível” a nível nacional.

A aposta passa por “políticas, simples e compreensíveis, e por apresentar caras - antigas, mas também novas”, sublinha Diogo Feio. Em relação às prioridades, são três: “Saúde, Educação, Segurança Social, e tudo o que tem a ver com as necessidades do dia-a-dia das famílias, integrado dentro de uma política de natalidade”.

Diz a história recente que os dois partidos da direita habitualmente coligam-se ou apoiam-se em eleições. Se ainda podia haver uma porta aberta para que CDS e PSD concorressem juntos nas próximas legislativas, os militantes do CDS parecem querer fechar essa hipótese. Diogo Feio também descarta essa possibilidade. “O CDS vai apresentar o seu projecto de um modo autónomo, de forma a fazer um caminho que permita um partido mais forte, a crescer, e que seja uma alternativa ao PS em Portugal”, adianta.

O centrista acrescenta que essa será “uma alternativa aberta a todos, e não apenas a um eleitorado em específico”. Para Diogo Feio, “há muita tendência de se tentar acantonar o CDS num caminho que vai da direita para o centro, e o CDS deve ser cada vez mais um partido que fala para todo o eleitorado”.

Cabeça fria

Num vídeo publicado em Janeiro na sua página de Facebook, Diogo Feio dizia que “é necessário fazer um discurso alternativo em relação àqueles que estão estritamente preocupados com o défice e a dívida”. Questionado sobre essa declaração, o político é categórico: “Entre aumentar funcionários públicos ou ter os hospitais a funcionar, eu prefiro que os hospitais estejam a funcionar bem; e isso é uma opção política”.

Diogo Feio acusa o primeiro-ministro de apenas se preocupar com “os défices e os bons números que Mário Centeno quer apresentar em Bruxelas”, para dizer que prefere “conseguir à mesma cumprir os limites do défice, mas ter escolas com cantinas que possam ser frequentadas pelos alunos”.

“Se nós hoje ainda não temos acordos que sejam de médio prazo, há um grande responsável por isso: António Costa, que não tem qualquer interesse neles”.

Diogo Feio

Para o centrista, todos esses “problemas” são “problemas que a governação de António Costa não está a conseguir resolver”. Considerando que “o primeiro-ministro está muito preocupado em gerir o seu dia seguinte, mas não consegue ultrapassar aquela semana”, Diogo Feio afirma que isto acontece porque António Costa “tem de gerir uma coligação que é contra-natura, e que o sustenta”.

Diogo Feio aponta que, quando se fala no Parlamento em reformas da Segurança Social, da Educação ou da Saúde, o CDS tem apresentado inúmeras soluções, mas o primeiro-ministro “rejeita-as sistematicamente”. Para o centrista, “o país precisa de quem tenha cabeça fria não para gerir politicamente, mas para governar”.

"Sem espectáculos”

A 10 e 11 de Março, os centristas reúnem-se em congresso nacional na cidade de Lamego. Este encontro marca os dois anos de liderança de Assunção Cristas à frente do CDS. Pelo meio, houve eleições autárquicas, que deram um resultado histórico para os centristas na cidade de Lisboa, e também regionais nos Açores, onde o CDS conseguiu eleger mais um deputado.

Diogo Feio resume o que serão os três dias do próximo congresso do CDS: “Vai ser um congresso de manutenção de rumo, de continuação de trabalho e de uma mensagem de grande esperança para os portugueses”. O antigo deputado revela que o CDS “não vai dar um grande espectáculo de desunião, que tantas vezes dá cor aos congressos”, mas vai dar, por outro lado, “uma ideia de solidez, trabalho e de um partido que está muito virado para os problemas que os portugueses têm no seu dia-a-dia”.

Já o eurodeputado Nuno Melo vai apresentar uma moção no congresso, “sobre Europa, naturalmente”. Certo é que o CDS se vai apresentar sozinho nas eleições europeias de 2019, com a esperança de aumentar o número de eurodeputados, já que nesta altura Nuno Melo é representante único dos centristas no Parlamento Europeu.