Sustentabilidade insustentável
Falta o essencial, água e solo, mas a tecnologia vai safar a coisa, abruptamente, quase como que por magia.
Pelo PÚBLICO ficou acessível em Portugal A Quarta Revolução Industrial, de Klaus Schwab, presidente executivo do Fórum Económico Mundial que há uns dias se juntou em Davos para mais do mesmo; conversarem uns com os outros sobre a “sustentabilidade insustentável”. Querem convencer-nos que é normal a riqueza do planeta estar na mão de 1% das pessoas e que é possível em Portugal consumirmos limões do Chile a dois euros o quilo, enquanto os nossos limoeiros estão abandonados. Uma viagem para Londres é muito mais barata do que para o Porto e achamos natural, certamente sustentável. Os que querem, sabem que está em passo acelerado a sexta grande extinção do planeta Terra — os insetos polinizadores a acabar e os chineses com pincelinho de flor em flor a fazer a polinização são uma trágica ironia. Esta é a verdade, ainda confortável para a escassa minoria que lê jornais. Já que a inteligência humana parece não dar conta do recado, a solução está agora na nova tecnologia emergente, como se lê no livro e se conversou em Davos. Falta o essencial, água e solo, mas a tecnologia vai safar a coisa, abruptamente, quase como que por magia. Por magia, porque todos continuamos a ter o mesmo modo de vida, a exigir cada vez.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
Pelo PÚBLICO ficou acessível em Portugal A Quarta Revolução Industrial, de Klaus Schwab, presidente executivo do Fórum Económico Mundial que há uns dias se juntou em Davos para mais do mesmo; conversarem uns com os outros sobre a “sustentabilidade insustentável”. Querem convencer-nos que é normal a riqueza do planeta estar na mão de 1% das pessoas e que é possível em Portugal consumirmos limões do Chile a dois euros o quilo, enquanto os nossos limoeiros estão abandonados. Uma viagem para Londres é muito mais barata do que para o Porto e achamos natural, certamente sustentável. Os que querem, sabem que está em passo acelerado a sexta grande extinção do planeta Terra — os insetos polinizadores a acabar e os chineses com pincelinho de flor em flor a fazer a polinização são uma trágica ironia. Esta é a verdade, ainda confortável para a escassa minoria que lê jornais. Já que a inteligência humana parece não dar conta do recado, a solução está agora na nova tecnologia emergente, como se lê no livro e se conversou em Davos. Falta o essencial, água e solo, mas a tecnologia vai safar a coisa, abruptamente, quase como que por magia. Por magia, porque todos continuamos a ter o mesmo modo de vida, a exigir cada vez.
Entretanto, as máquinas foram-se e a Indústria 4.0 vai-nos “obrigar” a ser inteligentes e a juntar o digital com o físico e o biológico. Pois bem, embora a “nova” retórica possa soar bem, designadamente com novos enquadramentos de “boa governança”, falta-nos o essencial: um novo modo de vida. Desculpem o aparente pessimismo, mas acredito muito mais no realismo de Stephen Emmott e no seu Dez mil milhões – enfrentando o nosso futuro (Ed. Circulo de Leitores, 2013). Tudo se resume à insustentabilidade do nosso modo de vida. O caos insustentável em que vivemos conduz-nos a um conjunto de acontecimentos apocalípticos, que são incontornáveis. E o mais grave de tudo é que isto é verdade, pois não temos solo e recursos suficientes para alimentar a atual população da Terra, e muito menos vamos ter para os tais anunciados dez mil milhões dentro de poucos anos. A perda de muitos ecossistemas, e dos serviços ambientais prestados por estes, põem em causa a nossa sobrevivência. É absurdo, mas existem atualmente cerca de 700 milhões de pessoas com fome e outras tantas sofrem de uma grave doença que se chama obesidade. Que mundo é este? Quanto às alterações climáticas em curso, elas vão provocar a deslocação de três mil milhões de pessoas. Uma classe muito presente nas mais importantes reuniões científicas sobre o tema são os militares. Porque será?
Stephen Emmott pertence a uma classe de cientistas únicos na vanguarda da investigação, coordenando uma vasta equipa interdisciplinar, e não hesita em anunciar “uma emergência planetária sem precedentes que nós próprios criámos”. Como escreve, só temos duas hipóteses: solução tecnológica ou mudar radicalmente de comportamento. Com facilidade se prova que, pela primeira via, não é possível encontrar uma solução; e de igual modo também se compreende que a mudança de comportamento não vai acontecer. Esta segunda via necessitaria de uma mudança radical de consciência da humanidade, impossível de acontecer no tempo necessário, face aos interesses corporativos existentes. Aliás, alguém ainda acredita que os governos decidem alguma coisa?
A globalização e o atual modo de usar e gerir os recursos atrasam o problema e transferem a fatura para um futuro muito mais próximo do que julgamos. Bem podemos dizer que nos preocupamos com as alterações climáticas, mas depois fazemos tudo ao contrário — cada vez de forma mais intensa, mais e mais. Acredito cada vez mais no up local em detrimento do up global que nos tem governado há umas décadas. Por cá, seria bem avisado que, enquanto temos tempo, ocupássemos o nosso interior despovoado da maneira que mais nos interessa, e que pensássemos na suficiência alimentar. Já agora, e porque é o passo fundamental, que tal mudarmos de hábitos alimentares?
O autor escreve segundo o novo Acordo Ortográfico