Democracia, Ensino Superior e novos públicos: a Educação a Distância
A aprendizagem aberta, online e em rede emerge como um dos grandes desafios educativos do presente século.
No âmbito da apresentação das conclusões preliminares do relatório da OCDE sobre o Sistema de Ensino Superior, Ciência e Inovação, a pedido do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, é urgente que o poder político se empenhe na definição e implementação de estratégias que conduzam as universidades portuguesas a níveis mais altos da universalidade da sua missão: formar cidadãos, produzir conhecimento e fazer Ciência.
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No âmbito da apresentação das conclusões preliminares do relatório da OCDE sobre o Sistema de Ensino Superior, Ciência e Inovação, a pedido do Ministério da Ciência, Tecnologia e Ensino Superior, é urgente que o poder político se empenhe na definição e implementação de estratégias que conduzam as universidades portuguesas a níveis mais altos da universalidade da sua missão: formar cidadãos, produzir conhecimento e fazer Ciência.
A educação dos cidadãos para uma cultura participativa apela a novas lógicas sensíveis não só à diluição de fronteiras individuais, institucionais e nacionais, como também à articulação de políticas orientadas para os ideais de democracia, coesão social e igualdade de acesso à Educação. Deste modo, pensar a educação para os direitos humanos, a cidadania, a inclusão social, no âmbito da Sociedade Digital, significa, necessariamente, uma reflexão sobre os papéis do Ensino Superior neste novo paradigma.
Envolvidas em processos de mudança, frequentemente justificados por políticas difusas e medidas instrumentais avulsas, as instituições do Ensino Superior, ainda muito marcadas por uma cultura educativa tradicional e elitista, confrontam-se com a urgência de reinventarem o seu papel científico, social e educativo. Este novo paradigma emergente vincula-se, praticamente, a todos os âmbitos de organização económica, social, cultural e política e resulta, entre outros, a) do processo de globalização da economia e da comunicação; b) da evolução de uma consciência de mundialização; c) de uma cultura em rede; d) da internacionalização do saber e da ciência; e) da estreita relação entre a participação digital e as novas práticas de cidadania.
A Educação Superior a Distância tem sido, desde a sua génese, um agente ativo neste processo de transformação. No entanto, a partir praticamente dos inícios do séc. XXI, a emergência de novas culturas e instrumentos digitais dão à Educação a Distância uma outra visibilidade e exigência social. As culturas em rede, a interatividade e colaboração, os ambientes híbridos e imersivos, as comunidades online ampliaram o espetro de possibilidades e de ação da EaD, associando-a a um novo âmbito de intervenção: o eLearning.
A aprendizagem aberta, online e em rede emerge, assim, como um dos grandes desafios educativos do presente século. No entanto, este desafio exige pensamento e estratégias orientados não só para a sustentabilidade das instituições que a promovem e para a qualidade da sua oferta educativa, como também para a definição de políticas que, sensíveis às profundas assimetrias sociais e educativas existentes na sociedade digital, integrem a Educação a Distância no quadro de uma pedagogia pública, de uma democracia participativa.
A Educação a Distância em Portugal tem sido cenário de grandes contradições. Pese embora os relatórios e outros documentos produzidos por investigadores, consultores e outros especialistas sobre as potencialidades da EaD e da Universidade Pública Portuguesa de EaD na expansão do Ensino Superior, este subsistema tem ocupado um lugar de “agente menor” do sistema educativo. Se, por um lado, a EaD se associa aos ideais de democracia, coesão social, igualdade de acesso à Educação ou da Aprendizagem ao Longo da Vida, os setores mais conservadores e grande parte das políticas que têm adotado têm sistematicamente ignorado o valor da EaD no quadro de mudança do Ensino Superior, traduzindo-se esta postura em silêncios ou em más decisões pautadas por uma discriminação negativa.
Tratando-se de um subsistema com fortes potencialidades no campo da Educação e Formação ao Longo da Vida de nível superior, considera-se prioritária a alteração deste estado de coisas. Esta mudança deverá fazer-se acompanhar de um pensamento, de estratégia e de planos de ação de espetro amplo, ancorados, entre outros, nos princípios e medidas que passamos a referir.
A Educação a Distância contribui para o desenvolvimento de novas formas de participação democrática, no quadro da globalização; a Educação a Distância incorpora, na sua matriz, o princípio de uma Educação Superior para todos e ao longo da vida, afirmando, por esta via, a sua responsabilidade social, cultural e científica; Educação a Distância tem um papel central na promoção da inclusão social e digital, através de dinâmicas de rede, de parceria com organizações sociais e culturais, de âmbito global e local.
Em Portugal, a concretização dos princípios antes mencionados passa, entre outras, pelas seguintes medidas: clarificação e regulamentação da Educação a Distância (EaD) em Portugal; consolidação do papel da Universidade Pública de Educação a Distância neste domínio; desenvolvimento de instrumentos legais em áreas específicas, a saber:
- Qualidade da EaD e eLearning — a urgente definição de referenciais de qualidade para a oferta educativa em EaD e eLearning;
- Financiamento da EaD — o sistema de financiamento das IES deve ser definido tendo em conta esta especificidade;
- Infraestruturas para a EaD — estas infraestruturas têm de acompanhar, necessariamente, a evolução tecnológica do mundo digital, exigindo, portanto, medidas de discriminação positiva também neste âmbito;
- Formação de docentes para a EaD — a definição de referenciais pedagógicos para o ensino e a aprendizagem em contextos digitais;
- Inovação e investigação em EaD — a criação de linhas específicas de financiamento de projetos em EaD e eLearning é uma opção fundamental para a inovação neste campo.
O que assim se evidencia é a clara consciência de uma profunda mudança conceptual e operatória do ensino a distância universitário (é ele que fundamentalmente neste texto está em causa), paralela à dinâmica de transformação das universidades convencionais, particularmente na Europa, e não raro interagindo com essa transformação. No entanto, este tipo de discurso social não se tem feito acompanhar de ações que viabilizem a sua concretização.
No caso concreto da Educação a Distância em Portugal, e das suas potencialidades na expansão do Ensino Superior, verifica-se que este subsistema não tem tido a importância devida no sistema educativo e no quadro das políticas educativas seguidas na última década. Embora fazendo parte do programa de Governo, a atual tutela do Ensino Superior praticamente ignora o ensino a distância, veja-se o relatório da OCDE que referimos no início deste texto.
Esperemos que a estratégia da inovação anunciada pelo Governo seja na verdade um passo para alterar e melhorar o cenário do ensino superior português, sobretudo com princípios e inovações operatórias fundamentais para o desenvolvimento do ensino a distância em Portugal.
Os autores escrevem segundo o novo Acordo Ortográfico