Luís Montenegro deixa o Parlamento, mas marca terreno para o futuro
Assumindo-se como candidato a líder na reserva, Montenegro anunciou no palco o que ninguém sabia, nem a mulher: deixará o Parlamento.
Faz parte da história do PSD que nos congressos haja a afirmação de quem marca lugar para concorrer à liderança no futuro. Por vezes, muitas vezes, foi o candidato derrotado à liderança. Mas no conclave que hoje termina no centro dos Congressos em Lisboa, o marcar do terreno para o futuro foi feito por alguém que deliberadamente não quis candidatar-se agora: Luís Montenegro.
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Faz parte da história do PSD que nos congressos haja a afirmação de quem marca lugar para concorrer à liderança no futuro. Por vezes, muitas vezes, foi o candidato derrotado à liderança. Mas no conclave que hoje termina no centro dos Congressos em Lisboa, o marcar do terreno para o futuro foi feito por alguém que deliberadamente não quis candidatar-se agora: Luís Montenegro.
“Desta vez decidi não, se algum disser sim, já sabem, não vou pedir licença a ninguém”, atirou Luís Montenegro da tribuna do congresso, assumindo que pode ser candidato a líder no futuro. E fez mesmo questão de garantir: “Conhecem a minha determinação. Se for preciso estar cá, cá estarei.”
Depois de ter liderado o grupo parlamentar do PSD durante o consulado de Pedro Passos Coelho como primeiro-ministro, em que deu a cara pelas posições do Governo no Parlamento, aquele que era visto como o sucessor preferido por Passos para liderar o partido depois de si, fez um discurso frontal e politicamente corajoso, surgindo ao longo da tarde de sábado como o único congressista a assumir-se abertamente como crítico de Rui Rio e como putativo futuro candidato na reserva. E ainda anunciou a novidade de que tinha decidido abandonar o lugar de deputado eleito por Aveiro – uma notícia que, de acordo com as informações do PÚBLICO, surpreendeu a sua própria mulher.
A frontalidade com que falou no congresso levou mesmo Luís Montenegro a afirmar numa alusão que encaixa como uma luva em Rui Rio: “Não fui eu que estive dez anos à espera de disputar a liderança do PSD entre desejos alternantes de ser primeiro-ministro e presidente da câmara”, garantiu, para rematar, mordaz: “Tal como Rui Rio fez noutras ocasiões, a minha decisão de não candidatura foi de liberdade. Se querem dar esse selo de calculismo podem dar, mas há aí alguém que deve ter a caderneta cheia.”
Luís Montenegro não se poupou a expor o corpo às balas por fazer uma intervenção crítica – a única verdadeiramente critica e distante de toda a tarde de sábado. E recusou qualquer acusação de deslealdade, assegurando que não recebe “lições de ninguém” no que diz respeito a “coragem e autenticidade”.
Estabelecendo limites de desafio a Rui Rio, aludiu à intervenção feita pelo agora presidente do PSD no dia 13 de Janeiro, no seu discurso de vitória nas directas. E atirou ao actual líder o objectivo de que se concentre “na sua equipa e nos adversários externos”, para rematar: “Não deixe que o PSD se transforme do grupo de amigos de Rui Rio ou da agremiação dos amigos de Rui Rio. Confio em si. Sei que se vai afastar da intrigalhada e da mesquinhez. Isso ensombra os fracos, sei que Rui Rio é forte. Eu confio em si.”
A resposta da direcção de Rio foi dada em declarações à Lusa, por Castro Almeida, vice-presidente a partir de domingo. Castro Almeida considerou que Montenegro “mostrou claramente que tem talento político, tem coragem política, tem mérito, tem valor” e assegurou que “a unidade de um partido convive bem com divergências de opinião, com críticas” e que na sua intervenção de Montenegro “colocou-se dentro do âmbito da crítica aceitável”. E esvaziando a situação, desdramatizou: “Acho normal que ele queira agora fazer uma pausa para tratar da vida profissional e que se disponibilize e anuncie a sua disponibilidade para poder regressar à vida política. Sorte tem um partido que tem uma pessoa com o talento dele disponível para regressar à vida política.” Para concluir: “O limite intolerável da crítica é quando alguém está num partido e deseja a derrota do seu próprio partido. Este é o limite que é intolerável e inaceitável.”
Pouco depois do antigo líder do grupo parlamentar do PSD discursar no congresso, foi a vez do seu sucessor à frente da bancada, Hugo Soares, subir ao palco. Num tom mais cordato do que utilizou desde que Rio foi eleito e que ficou claro que deixaria o cargo no Parlamento, Hugo Soares repetiu a sua defesa de que o PSD tem que deixar claro que não vota o Orçamento do Estado para 2019 (OE2019). E argumentou que a aprovação do OE2019 só favorecerá o PCP e o BE. Mais, sustentou: “O PS não executa o orçamento que apresenta, é um orçamento falso, porque depois cativa tudo.”
Hugo Soares fez questão de prestar a “homenagem devida a um grande primeiro-ministro e um grande social-democrata”, referindo-se a Passos Coelho. E virando-se para Rio, pediu-lhe que que “confie no partido”, garantindo: “O partido está aqui unido, para fazer de si o próximo primeiro-ministro.”
E aproveitou para pedir um referendo sobre legalização da eutanásia, argumentando que esta medida legislativa não constou de nenhum programa eleitoral. E em jeito de herança pediu que fosse constituída uma comissão de inquérito à Segurança Social por causa das adopções de crianças de forma eventualmente ilegal por membros da IURD.