Segurança Nacional: “Se Trump estiver a ver a série, adorava falar com ele sobre ela”

Donald Trump é bom para um thriller político como Homeland, cuja sétima temporada se estreia nesta sexta-feira na Fox, diz o produtor Alex Gansa. “Se Hillary Clinton tivesse ganhado, estaríamos a filmar Segurança Nacional em Washington? Acho que não.”

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Claire Danes é Carrie Mathison em Segurança Nacional Antony Platt/Showtime

O thriller de espionagem Segurança Nacional tem uma forma especial de incorporar elementos muito reais – como o fenómeno “fake news”, a tensão entre um Presidente e a comunidade dos serviços secretos e a guerra ao terrorismo – nas suas linhas narrativas. A sétima e penúltima temporada, que se estreia nesta sexta-feira na Fox, segue o mesmo caminho.

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O thriller de espionagem Segurança Nacional tem uma forma especial de incorporar elementos muito reais – como o fenómeno “fake news”, a tensão entre um Presidente e a comunidade dos serviços secretos e a guerra ao terrorismo – nas suas linhas narrativas. A sétima e penúltima temporada, que se estreia nesta sexta-feira na Fox, segue o mesmo caminho.

Conversámos com o showrunner, argumentista e produtor Alex Gansa sobre como ele chega à descrição (às vezes) exacta dos detalhes envolvidos na recolha de informação secreta, sobre as filmagens, que nesta temporada foram em Richmond, no estado da Virginia, e sobre aquilo que, inesperadamente, tem em comum com o Presidente Donald Trump.

O que é que era notícia quando a série estava a ser escrita?
Bem, isso é um teste à minha memória – meu Deus, aconteceu tanta coisa! É espantoso. Não só é aterrorizador que tudo seja real, como é aterrorizador tentar estabelecer paralelos com a nossa série e estarmos preocupados que as notícias ultrapassem a história. Começámos a pensar na temporada no final de Abril. É quando fazemos a nossa visita de estudo anual a Washington e nos reunimos com os nossos consultores, com pessoas na comunidade dos serviços secretos e com alguns jornalistas.

Nos anos anteriores, tivemos [reuniões] pessoas que trabalham na Casa Branca e no Departamento de Estado, mas este ano não tivemos esse acesso. Donald Trump era Presidente há um par de meses e estávamos em Washington naquele momento, e a Coreia do Norte era o que estava em cima da mesa. A Coreia do Norte não entra na nossa história este ano, mas houve uma enorme preocupação sobre o que é que aAadministração [Trump] estava a planear na península norte-coreana.

Então de que forma é que os acontecimentos actuais se infiltraram nesta temporada?
Temos um Presidente isolado e entrincheirado que acredita que o “deep state [uma visão conspiratória que acredita que existe um Estado dentro do Estado, um conjunto de pessoas que verdadeiramente gerem o país segundo a sua própria agenda]” está contra ele. Na nossa história, temos uma Presidente que se sente da mesma maneira.

A principal forma é o antagonismo entre um Presidente recém-eleito e as pessoas que povoam o Governo – as pessoas que lá estão de um governo para outro. É esse conflito essencial entre estes dois campos que influenciou verdadeiramente a série. E quão polarizada e dividida está hoje a América. Quando vemos a democracia assim, dividida ao meio, ela torna-se um alvo muito vulnerável para outros países que podem querer enfraquecer-nos. Isso também se tornou uma parte importante da história nesta temporada.

Esta temporada é como um delírio febril de Donald Trump?
A série não é de todo sobre a Administração Trump. É a sua própria ficção. Mas parte do que é entusiasmante em escrever Segurança Nacional é que estamos a escrever a série em tempo real, mais coisa, menos coisa, por isso não conseguimos evitar que o que se passa no mundo real influencie a história e a forma como a contamos. Quando é revelada uma notícia importante, às vezes é impossível não a ver na história. E podemos educar as pessoas, de certa forma, sobre as dinâmicas internas do funcionamento de Washington.

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Fale-me um pouco mais dessas visitas de estudo.
Duram cinco dias – levamos todos os argumentistas, a nossa produtora executiva Lesli Linka Glatter, e [os actores] Mandy Patinkin e Claire Danes. Somos cerca de 10, 12 pessoas e ficamos num velho clube em Georgetown, onde recebemos pessoas, das 9h às 18h, todos os dias.

Este ano não podia ter sido mais diferente do que foram as visitas anteriores. Nessa altura, recebíamos pessoas da comunidade dos serviços secretos que nos faziam briefings, depois vinha um jornalista famoso do Washington Post ou do New York Times e fazia um contraponto completo do que tínhamos ouvido antes. Este ano, pela primeira vez, e de uma forma estranha, a comunidade dos serviços secretos e o Quarto Poder pensavam o mesmo. Duas comunidades distintas, ambas acreditando ser guiadas pelos factos, alinharam-se de uma maneira que nunca vimos nos quatro anos anteriores. Claramente havia muitas fugas de informação da comunidade dos serviços secretos para os jornalistas, e essa parceria era, até este ano, algo inédito. Na verdade, dá alguma credibilidade à paranóia que existe na Casa Branca de Trump de que há grandes forças aliadas contra ele.

No passado, andávamos à procura de uma história para contar, como na quarta temporada, em que quisemos pôr a Carrie num cargo de operacional dos serviços secretos no estrangeiro. O que perguntávamos na sala [de reuniões com essas fontes] era: “Se fossem colocados, onde seriam colocados?” Na altura, toda a gente dizia “Afeganistão” ou “Paquistão”, e foi aí que estabelecemos a nossa história.

Na sexta temporada, como sabíamos que ia para o ar durante a transição [entre Obama e Trump], investigámos muito as transições entre administrações presidenciais. Esta temporada, claro, foi toda sobre Trump – só falávamos disso.

Têm muitos fãs famosos no Governo, como os antigos presidentes Obama e Clinton, e no mundo dos serviços secretos. Até que ponto é que isso vos pressiona?
É um pouco intimidador saber que essas pessoas estão a ver a série, mas não podemos senão cometer erros. A liberdade criativa que temos de ter será recebida com revirares de olhos por parte de alguns dos nossos consultores. Mas o que é mais recompensador é estarmos confiantes de que, embora possamos não estar a fazer as coisas bem à letra, na maior parte das vezes acertamos no seu espírito. É aí que está a fronteira.

Como tem sido filmar na Virginia?
Richmond é fantástico. É um óptimo substituto para Washington. Estamos a usar muitos edifícios oficiais. Filmados do ângulo certo, podíamos mesmo estar à porta da Casa Branca ou do Capitólio. E temos planos da verdadeira Washington, por isso é um truque fácil de fazer. Somos a única série a filmar aqui – seria seguramente diferente filmar em Nova Iorque, onde há 150 séries em rodagem ao mesmo tempo.

Para onde é que a série vai depois disto?
Temos mais uma temporada, e já começámos a pensar nela. Adoraríamos levar Segurança Nacional ao local onde começou, em Israel. Será exequível? Veremos.

Por que é que esta temporada se passa em Washington?
Se Hillary Clinton tivesse ganhado, estaríamos a filmar Segurança Nacional em Washington? Acho que não. Há algo irresistível, e de perturbador para alguns de nós, no que está a acontecer no país. Situar lá a história dá-nos uma oportunidade de o comentar. Se Hillary Clinton fosse Presidente, seria o mesmo de sempre. Não seria este ciclo noticioso de 24 sobre 24 horas em que acontece alguma coisa louca todos os dias. Penso que não existiria tanta ansiedade do espectador sobre onde estamos, e isso é útil para um thriller.

Alguma vez o chateia que as pessoas se foquem tanto no que há de baseado na vida real na série? Alguma vez diz: “Vá lá, é uma história ficcional!”?
Isso não me ofende tanto quanto me ofende que as pessoas pensem que somos islamofóbicos ou... Sabe, a esquerda está a acusar-nos de sermos islamofóbicos e a direita está sempre a acusar-nos de sermos apaixonados pela comunidade muçulmana. As pessoas vêem na série uma agenda política que acho que não existe. O que tentamos fazer é pegar numa personagem, Carrie Mathison, que era uma agente secreta, e se há uma coisa que aprendemos ao falar com agentes e pessoas na comunidade de serviços secretos é que, pense-se o que se pensar sobre eles, são pessoas intensamente patrióticas que na sua maioria passam 24 horas por dia a tentar manter-nos em segurança.

Alguma vez imagina o Presidente Trump a ver a série?
Algo me diz que ele não está a ver dramas de uma hora. Posso estar enganado – se ele estiver a ver a série, seria fantástico. Quando Obama via a série, ficámos todos muitíssimo honrados. Se [Trump] estiver a ver, adorava falar com ele sobre ela.  

O que é que pensa de alguém que não parece ver televisão para além dos noticiários?
Na verdade, também faço parte dessa categoria! Tenho literalmente demasiadas coisas para fazer para ver televisão. Anseio pelo tempo em que possa ver todas as séries fantásticas [que têm estado no ar], relaxando e apreciando-as. Não vi um único episódio de A Guerra dos Tronos. Não vi um único episódio de Downton Abbey.

Exclusivo PÚBLICO/The Washington Post