Celtejo pode ter produção limitada durante 60 dias
Inspecção diz que concorrentes desta empresa de pasta de papel de Vila Velha de Rodão cumprem limites de descargas. Restrição mantém-se por mais 30 dias, que podem ser prolongados até que haja uma nova licença para despejar efluentes.
Durante mais 30 dias a empresa Celtejo vai continuar obrigada a reduzir o volume diário de efluentes que lança para o rio Tejo. Restrição que pode mesmo chegar aos dois meses, determinou ontem o Ministério do Ambiente, no dia em que terminava o primeiro prazo da mesma redução, imposta após ter sido detectada uma enorme mancha de espuma junto ao açude de Abrantes, há quase duas semanas. Os resultados das análises da Inspecção-Geral do Ambiente mostram que as concorrentes desta fábrica de pasta de papel de Vila Velha de Rodão cumprem os limites de descargas.
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Durante mais 30 dias a empresa Celtejo vai continuar obrigada a reduzir o volume diário de efluentes que lança para o rio Tejo. Restrição que pode mesmo chegar aos dois meses, determinou ontem o Ministério do Ambiente, no dia em que terminava o primeiro prazo da mesma redução, imposta após ter sido detectada uma enorme mancha de espuma junto ao açude de Abrantes, há quase duas semanas. Os resultados das análises da Inspecção-Geral do Ambiente mostram que as concorrentes desta fábrica de pasta de papel de Vila Velha de Rodão cumprem os limites de descargas.
O Ministério do Ambiente considerou que, apesar de se verificar “uma melhoria nos valores de oxigénio dissolvido na água – que, ainda assim, não atingem os valores normais para a época –, a precaução obriga a que sejam mantidas as restrições já decididas por um período de 30 dias”.
Mas estes novos 30 dias de restrição de emissão de efluentes – e consequente redução da produção da empresa - podem ainda aumentar para dois meses: “Após reavaliação, podem ainda vir a ser prolongadas por mais 30 dias, data em que se estima já poder ser passada uma nova licença para a rejeição de efluentes, com regras adaptadas à capacidade real do rio Tejo”, lê-se no comunicado.
O ministério de João Matos Fernandes adiantou ainda que os 12 mil metros cúbicos de sedimentos depositados no rio a jusante do local de descarga “já começaram a ser removidos” e que se aguardam os resultados de todas as análises necessárias.
De facto ainda não são conhecidas as conclusões das análises às amostras que a Inspecção-Geral da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT) recolheu junto à estação de tratamento de águas residuais industriais (ETARI) da Celtejo. A entrega e consequente divulgação dos resultados daquela que é a principal emissora de efluentes para o Tejo (com 90% da carga emitida para o rio) atrasou-se, devido a “constrangimentos inusitados” para os quais o inspector-geral do Ambiente, Nuno Banza, ainda não tem resposta. Foram precisos quatro dias para que os inspectores conseguissem recolher – manualmente – as amostras de água, depois destas terem desaparecido por três vezes do colector onde devem ser recolhidas de forma automática.
Porém, ao passo que os resultados das análises à Celtejo só serão conhecidos para a semana, a IGAMAOT deu ontem conta de que as suas concorrentes - a Navigator e a Paper Prime – cumprem com os valores de descarga de efluentes permitidos. As ETARI destas empresas foram analisadas pelos inspectores que não encontraram qualquer incumprimento, afirmou o inspector-geral Nuno Banza.
Descarga pontual ou continuada?
Aliás, nos seis pontos de tratamento de água no troço do rio Tejo entre Perais e Abrantes onde a IGAMAOT analisou amostras – que incluem ainda as ETAR urbanas de Vila Velha de Rodão, Abrantes e Mação - os inspectores concluíram que apenas o equipamento de Abrantes não cumpria com os valores de descarga permitidos pela tutela. Incumprimentos que o inspector-geral do Ambiente considerou que “não são significativos”.
“Apesar da ETAR de Abrantes não estar a cumprir, é tecnicamente muito improvável” que este incumprimento signifique o aumento da carga orgânica que no dia 24 de Janeiro produziu a mancha de espuma sobre o rio, disse. Nuno Banza nota ainda que, com base nos resultados divulgados pela Agência Portuguesa do Ambiente (APA) na semana passada, a carga poluente teve origem industrial, não urbana, com níveis de celulose cinco mil vezes acima do normal.
De notar que os resultados das análises da IGAMAOT são apenas “representativos da forma como as empresas operam em condições normais”. Nuno Banza não exclui, no entanto, a hipótese de ter sido uma descarga pontual a originar a mancha de espuma. E para perceber isso os inspectores terão que continuar as diligências, que já começaram a ser feitas no âmbito do inquérito que decorre no Ministério Público.
O que o inspector-geral do Ambiente não consegue ainda explicar é se a quantidade de efluentes emitidos para o rio está ou não dentro daquilo que é permitido. Nuno Banza admite que “podemos estar perante circunstâncias em que não só aquela como outras empresas possam estar a descarregar efluentes permitidos com licenças” que foram autorizadas “num contexto diferente do actual”, de seca e reduzido caudal do rio. O inspector-geral remete assim para revisão estas autorizações que tanto o primeiro-ministro como o presidente da APA admitiram vir a fazer.
O mistério das amostras desaparecidas
Tal como o PÚBLICO noticiou este domingo, uma série de “constrangimentos inusitados” impediram por três vezes que os inspectores recolhessem amostras junto à estação de tratamento da Celtejo, fazendo com que as amostras, que acabaram por ser recolhidas manualmente, fossem entregues no laboratório apenas na quarta-feira passada.
“O colector não recolheu líquido por razões que desconhecemos”, confessou o inspector-geral. Por três vezes foi colocado um colector junto à tubagem da Celtejo que, hora a hora, durante 24 horas, devia recolher de forma automática as amostras. Um procedimento que já tinha sido feito com “milhares de amostras”, inclusive naquela ETARI, por “inspectores experientes” e com aquele mesmo equipamento. Porém, por três vezes, nestes tubos pouco mais havia do que espuma, em vez de água, o que “nunca tinha acontecido em mais lado nenhum”, diz Nuno Banza.
À terceira vez, o colector chegou mesmo a ser protegido por militares do Serviço de Protecção da Natureza e do Ambiente da GNR. Sem que a vigilância tenha surtido efeito, os três inspectores acabaram por fazer as recolhas manualmente, durante 24 horas. O Ministério Público está a investigar o que se passou.
O Ministério do Ambiente também chegou à frente para lembrar que está “não apenas a intensificar as acções de monitorização e de fiscalização das massas de água e das principais descargas de efluentes, mas também a promover um estudo do perfil da massa de água, naquele troço específico [entre as freguesias Perais e Belver] que se encontra a ser realizado pela Universidade Nova de Lisboa”.
O PÚBLICO tentou, sem sucesso, contactar a Celtejo, que sempre recusou ser responsável pela poluição visível no rio nas últimas semanas e que assegura cumprir a lei. A empresa já disse mesmo que, a continuarem em curso as actuais reduções à produção, a fábrica de Vila Velha de Ródão “é inviável”.