Open Budget Survey: abra-se o Orçamento aos cidadãos

Em Portugal, apesar dos progressos, o Orçamento continua dos menos transparentes quando comparado com os pares europeus.

O Open Budget Survey (OBS) é o único indicador que permite medir e comparar internacionalmente a transparência, a participação e a fiscalização do processo orçamental. Este estudo, liderado pela International Budget Partnership, um think-tank de Washington, é conduzido de forma descentralizada, havendo uma equipa responsável pela análise da situação nacional em cada um dos 115 países que participam nesta iniciativa.

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O Open Budget Survey (OBS) é o único indicador que permite medir e comparar internacionalmente a transparência, a participação e a fiscalização do processo orçamental. Este estudo, liderado pela International Budget Partnership, um think-tank de Washington, é conduzido de forma descentralizada, havendo uma equipa responsável pela análise da situação nacional em cada um dos 115 países que participam nesta iniciativa.

O OBS representa assim um verdadeiro exemplo de uma iniciativa da sociedade civil a nível global: primeiro, porque procura “nivelar por cima” os padrões globais de mais transparência, de participação e envolvimento dos cidadãos, e do escrutínio das decisões políticas no que diz respeito aos impostos e ao destino que lhes é dado; segundo, é um autêntico exercício de cidadania global, pela colaboração em rede de organizações ativistas, universidades e think tanks de todo o mundo com aquele mesmo objetivo em mente.

A sexta edição do OBS (4ª edição em que Portugal participa) destaca que, pela primeira vez desde a sua criação, o ranking médio mundial caiu de 45 em 2015 para 43 em 2017. Trata-se assim de uma evolução negativa da governação aberta e da accountability dos governos no mundo, o que não deixa de ser especialmente preocupante nestes tempos de receio quanto ao crescimento dos populismos. O relatório alerta que o nível médio continua assim bastante insatisfatório, sendo o problema agravado pelas poucas oportunidades de participação pública no processo orçamental, e pela existência de instituições de supervisão pouco eficazes.

Em Portugal, apesar dos progressos, o Orçamento continua dos menos transparentes quando comparado com os pares europeus, e as oportunidades concedidas aos cidadãos para participar no processo de decisão sobre os recursos públicos são mesmo muito escassas. Continuamos assim fora do grupo da frente no OBS, com uma pontuação de 66 pontos em 100 (nível “significativo”), considerada tangencialmente suficiente, apesar de bem acima da média mundial, de 42 pontos. À imagem das duas anteriores edições, a primeira avaliação na era da “geringonça” melhora face ao orçamento de 2015, ainda que muito ligeiramente: no OBS 2015 Portugal havia alcançado um resultado de 64 pontos.

A evolução não é melhor graças, em parte, à não publicação do Orçamento Cidadão, contrariamente ao que se havia verificado no orçamento de 2015. Houve alguns desenvolvimentos positivos, com a DGO a alargar o conjunto de ferramentas online “didáticas”, embora pouco divulgadas; as sínteses de execução orçamental são cada vez mais detalhadas, o que acaba por mitigar a falta de uma relatório intermédio no primeiro semestre. Nos OE 2017 e 2018, foram também lançados “micro-sites” pelo Governo que, sendo um passo na direção certa, acabam por não ser soluções para a necessidade de prestar informação oficial acessível e fidedigna ao comum dos cidadãos, já que elencam apenas medidas ou intenções de medidas, não fazendo e explicando a ligação com as metas e restrições do Orçamento.

O OBS não avalia apenas as responsabilidades dos Governos no processo orçamental. Igualmente importante é o papel de outros atores fundamentais numa arquitetura democrática das instituições orçamentais. Assim, avalia-se também a capacidade de fiscalização do desempenho do executivo em matéria orçamental. O Parlamento é avaliado como “adequado” apenas no que se refere à fase de formulação e aprovação do Orçamento (86 pontos em 100). No acompanhamento da execução orçamental e na “auditoria” das contas após o fecho do exercício, a capacidade de fiscalização é classificada como “limitada” (53 em 100), apesar dos esforços, reconhecidos, da UTAO em providenciar informação e análises detalhadas e atempadas. A fiscalização orçamental realizada pelo Tribunal de Contas é considerada “adequada”, embora se alerte para a possibilidade de o Tribunal de Contas não ter recursos suficientes para realizar um escrutínio mais abrangente (com maior volume de auditorias, por exemplo).

Olhando para os países do espaço lusófono, os desafios ainda são mais significativos. Dos países da CPLP, o Brasil é o que está melhor classificado, em 7.º lugar. Atrás de Portugal (que está em 22.º), estão os PALOP, em geral entre os piores do mundo em termos de opacidade orçamental: por ordem decrescente, Moçambique (67.º), com transparência “limitada”, Timor-Leste (69.º), São Tomé e Príncipe (78.º) e Angola (84.º), com transparência “mínima”, e a Guiné Equatorial (112.º), no grupo de pior desempenho, com “escassa ou nenhuma” transparência. Projetos como o Pro PALOP-TL SAI, do PNUD e União Europeia, para fortalecer as instituições orçamentais desses países, têm assim um longo caminho a percorrer ainda.

Regressando a Portugal, se há ainda muitos passos a dar para melhorar a transparência e a fiscalização do processo orçamental nas suas várias fases, desde a preparação da proposta do Orçamento até ao escrutínio da Conta Geral do Estado, se tivermos de destacar um aspecto do resultado português, será o mau desempenho no que respeita às oportunidades para participação pública. Melhorar o resultado mínimo na escala da participação pública – com 15 pontos em 100 possíveis – deve ser assumido como uma prioridade. Destaca-se positivamente a criação do Orçamento Participativo de Portugal, que sendo uma iniciativa com efeitos em 2017 ainda não foi “contabilizada” no Índice (que se reporta a elementos de 2016) – mas não chega.

O período de discussão do Orçamento é de grande intensidade mediática, mas de reduzidíssima intensidade cidadã. A população, na sua esmagadora maioria, não entende e não se envolve no Orçamento. Não por culpa própria, e sem dúvida também pelo distanciamento e desconfiança que sente em relação à política e aos políticos. Mas também porque o processo continua a ser hermético. O governo e o parlamento devem procurar envolver a sociedade civil em audiências públicas sobre o processo orçamental e criar mecanismos para os cidadãos e entidades do executivo partilharem as suas opiniões e preocupações sobre o Orçamento de uma forma institucionalizada. Talvez assim, algumas das prioridades trocadas que, por vezes, as decisões da despesa pública parecem evidenciar pudessem ser corrigidas.

Discutiremos como lá chegar em debate no ISEG, esta quinta-feira (dia 8) a partir das 17h, com Jorge Marrão, Joaquim Miranda Sarmento, Paulo Trigo Pereira e Susana Peralta, e encerramento pelo Secretário de Estado do Orçamento, João Leão.

 

Os autores escrevem segundo as normas do novo Acordo Ortográfico

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