Há uma certeza que os alunos podem ter: a maioria vai chumbar
São poucas as escolas que conseguem garantir, em simultâneo, o sucesso dos seus alunos do 3.º ciclo e do secundário quando este é medido pela ausência de retenções. A nível nacional, mais de metade dos alunos não consegue este feito.
Quando entram no 3.º ciclo do ensino básico ou secundário, os alunos portugueses têm uma garantia à partida: neste percurso a maioria vai chumbar pelo menos uma vez. Esta realidade, que na Europa e não só nos empurra para os piores lugares neste domínio, salta de novo à vista nos últimos dados divulgados pelo Ministério da Educação (ME) que dão conta do que aconteceu a três gerações de estudantes: os que entraram (no 7.º e no 10.º) em 2012/13 e deviam ter terminado em 2014/15; os que entraram (no 7.º e no 10.º) em 2013/14 e deviam ter saído em 2015/2016; e os que entraram (no 7.º e no 10.º) em 2014/15 e se esperava que tivessem terminado no ano lectivo passado.
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Quando entram no 3.º ciclo do ensino básico ou secundário, os alunos portugueses têm uma garantia à partida: neste percurso a maioria vai chumbar pelo menos uma vez. Esta realidade, que na Europa e não só nos empurra para os piores lugares neste domínio, salta de novo à vista nos últimos dados divulgados pelo Ministério da Educação (ME) que dão conta do que aconteceu a três gerações de estudantes: os que entraram (no 7.º e no 10.º) em 2012/13 e deviam ter terminado em 2014/15; os que entraram (no 7.º e no 10.º) em 2013/14 e deviam ter saído em 2015/2016; e os que entraram (no 7.º e no 10.º) em 2014/15 e se esperava que tivessem terminado no ano lectivo passado.
E o que aconteceu então no percurso destes três grupos de finalistas? No conjunto, no 3.º ciclo, apenas 41,9% conseguiram ter aquilo a que o ME chama “percursos directos de sucesso”. No secundário ainda foi pior: só 38,4%. Para chegar a estes dados, foram analisados os percursos individuais de 175.246 estudantes do secundário e de 270.511 do 3.º ciclo.
O ministério considera que, no 3.º ciclo, um aluno tem um percurso de sucesso quando não reprova nem no 7.º nem no 8.º ano e consegue nota positiva nos dois exames do 9.º. No secundário os critérios são os mesmos: não chumbar nem no 10.º nem no 11.º e ter positiva nos dois exames das disciplinas trienais do 12.º ano. Como se constata pelos dados anteriores, mais de metade dos alunos destes dois níveis de escolaridade não alcançaram este patamar.
A informação relativa aos percursos individuais dos alunos começou a ser disponibilizada em 2015. Olhando para as escolas que estes alunos frequentavam, o ministério foi compará-las de seguida com os outros estabelecimentos escolares que tinham estudantes com um desempenho escolar semelhante à entrada do 3.º ciclo ou do secundário. Neste indicador global de percursos directos de sucesso, o nome que lhe foi dado pelo ME, quanto maior for aquela diferença pela positiva, melhor a escola se sai nesta forma de as avaliar.
É com base nos valores desta diferença que o PÚBLICO ordena as escolas no que chamou “ranking do sucesso”, feito este ano pela segunda vez, acrescentando assim esta leitura à da listagem que é feita tendo apenas em conta as médias dos exames.
O Colégio de S. Miguel, em Ourém, ocupa a primeira posição neste novo ranking no ensino secundário. No 3.º ciclo, onde são tidas em conta 1042 escolas, este lugar é também ocupado por um privado, o Colégio do Vale, em Almada, que o PÚBLICO visitou (ver reportagem neste suplemento).
Melhores no secundário
Todos os 767 alunos do Colégio de S. Miguel, do básico e do secundário, estão abrangidos pelos contratos de associação que esta instituição tem vindo a celebrar com o Estado para suprir carências da rede pública e assegurar ensino gratuito aos seus alunos, informa o director, Manuel Lourenço. No ensino secundário, o colégio conseguiu que 63,9% dos seus alunos tivessem percursos de sucesso, quando a média de escolas semelhantes foi de 44,1%.
Para o responsável do colégio, o sucesso obtido tem na sua base o facto de o aluno ser visto “na sua individualidade específica” e de a escola apostar em desenvolver as “múltiplas dimensões” que devem compor o processo de formação. Tal concretiza-se, por exemplo, através de uma série de actividades de enriquecimento curricular e a colaboração, “de forma permanente, do Serviço de Psicologia e Orientação e do Núcleo de Apoio Educativo Especializado que, em articulação com o corpo docente, estão atentos a situações mais complexas que exijam uma intervenção necessariamente atempada”, refere. “Penso que os nossos alunos podem encarar o futuro com liberdade e confiança.”
No colégio, acrescenta Manuel Lourenço, “10% dos alunos têm Necessidades Educativas Especiais ou são crianças institucionalizadas”. Apesar de continuar a distanciar-se pela positiva da média, o lugar do colégio no ranking do sucesso do 3.º ciclo desce para 254.º. O director explica esta diferença pela maior maturidade dos alunos do secundário, já que “o perfil dos alunos não é diferente no ensino básico e no secundário”. Também as “metodologias e processos pedagógicos são semelhantes” nos dois níveis, frisa.
Manuel Gomes, o director da Escola Básica e Secundária de Arga e Lima, em Póvoa dos Lanheses, aponta igualmente para a maior maturidade dos alunos do secundário para explicar a grande diferença que ali se regista quando estão em causa os percursos dos alunos do 3.º ciclo ou os do secundário. No primeiro caso, esta escola ocupa, tal como no ano passado, o segundo lugar no ranking do sucesso com 49,1% de percursos sem chumbos, enquanto no 3.º ciclo desce para a posição 909, com apenas 36,8% de trajectos sem retenções.
“A escola é a mesma, porque a maior parte dos alunos do secundário frequentaram aqui no 3.º ciclo, os professores também são os mesmos e o mesmo acontece com as famílias”, descreve este director. A única diferença que sobressai é a que tem que ver com a maturidade dos alunos: “Temos feito mil e uma análises a esta situação e é a razão que vemos. Os alunos do 3.º ciclo não levam o estudo tão a sério como os do secundário, estão mais despegados.”
A escola de Arga e Lima fica numa zona rural do distrito de Viana do Castelo, situando-se no contexto socioeconómico mais desfavorecido dos três que o PÚBLICO estabelece, tendo em conta as habilitações dos pais e a percentagem de alunos com apoios sociais. Neste contexto é a escola que mais se supera a nível nacional no que diz respeito a conseguir percursos de sucessos para os seus alunos. “Não valorizamos em excesso os exames, mas sim a formação integral do indivíduo. Tentamos ser uma escola onde os alunos se sintam bem, com a qual desenvolvam um sentimento de pertença e até de orgulho. E é também uma escola 100% inclusiva e os alunos estão conscientes disso”, explica Manuel Gomes.
Disparidades internas
Também a Escola Secundária de Vila Verde, no distrito de Braga, está inserida no contexto socioeconómico mais desfavorecido. Com apenas 15,9% dos alunos do 3.º ciclo a conseguirem fazer um percurso sem chumbos, quando a média de escolas semelhantes foi de 42,3%, ficou em último lugar no ranking do sucesso deste nível de escolaridade em que estão ordenadas 1042 escolas. No ensino secundário sobe para a posição 115, com 41,5% dos alunos a garantirem percursos de sucesso.
“Recebemos os alunos que as outras escolas não querem”, refere o seu director, João Graça, a propósito do 3.º ciclo. “São alunos mais velhos, porque já tiveram retenções anteriores, com baixo nível de motivação e que na região não têm outras opções senão prosseguir no ensino regular”, prossegue, para frisar que os professores do 3.ºciclo são os mesmos do secundário no qual, no entanto, o panorama muda. Razões apontadas por João Graça: “No secundário os alunos já fizeram as suas opções. Os que têm menos propensão para os estudos e ambicionam entrar cedo na vida activa optam pelos cursos profissionais. E os que ficam nos cursos científico-humanísticos escolhem as áreas tendo em conta o seu desempenho escolar anterior nas disciplinas.”
Na situação inversa encontra-se a Escola Básica e Secundária de Fornos de Algodres, no distrito da Guarda, também ela num contexto desfavorecido. É a última no ranking do sucesso no secundário, mas no 3.º ciclo está em 11.º lugar. O seu director, Artur Silva, atribui esta diferença ao facto de, nos últimos dois anos, terem saído “uma série de bons alunos” que foram frequentar o secundário noutras escolas, por estas terem mais ofertas de cursos.
Estas quatro escolas não constituem excepção a outra realidade que salta também à vista dos dados divulgados pelo ME: são muito poucas as que conseguem destacar-se em simultâneo nos rankings de sucesso do 3.º ciclo e do secundário. Apenas 17 têm lugar entre as 100 melhores posicionadas nestas duas listas e destas apenas cinco são públicas.
A Escola Secundária de Campo Maior, no Alentejo, é uma delas. Situa-se num contexto socioeconómico intermédio, com uma “economia activa, muitas respostas sociais e as várias instituições do concelho a funcionarem em rede, em vez de cada uma ficar no seu cantinho, o que tem ajudado muito”, diz o seu director, José Pernas. No 3.º ciclo, encontra-se em 7.º lugar no ranking do sucesso, com 48,2% de percursos livres de chumbos face a uma média de 30,9% de escolas semelhantes. No secundário, desce para 68.º lugar, com 39,5% destes percursos.
O alargamento da escolaridade obrigatória até aos 18 anos é uma das razões apontadas por José Pernas para estes resultados. “É mais difícil ter bons resultados no secundário com mais alunos a frequentá-lo”, resume, frisando que o objectivo da escola é agora o de baixar a percentagem de chumbos.
Portugal é na Europa o país onde a associação entre chumbos e pobreza é maior. Mas uma terceira realidade que volta a saltar à vista dos dados divulgados pelo ME é a que mostra o esforço que as escolas do contexto mais desfavorecido estão a fazer para puxar pelos seus alunos do secundário. Nos 50 primeiros lugares do ranking do sucesso encontram-se 23 escolas públicas, e a maioria destas (15) são de meios carenciados. Já no básico, há 19 escolas públicas nesta posição, mas só seis são de meios desfavorecidos.