Universidade Fernando Pessoa investigada por crimes fiscais
Autoridade Tributária exigiu à fundação que detém a universidade, ao seu reitor e a uma empresa deste mais de 1,4 milhões de euros. Correcções contestadas em seis processos a correr nos tribunais.
O Ministério Público está a investigar crimes fiscais na Universidade Fernando Pessoa. O inquérito, que teve formalmente início em 2015, está a correr no Departamento de Investigação e Acção Penal do Porto, que delegou a investigação na Divisão de Processos de Crimes Fiscais das Finanças. O processo já tem vários arguidos constituídos. A informação foi confirmada ao PÚBLICO pela Procuradoria-Geral da República. “Nas investigações, o Ministério Público é coadjuvado pela Autoridade Tributária”, adianta a procuradoria.
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O Ministério Público está a investigar crimes fiscais na Universidade Fernando Pessoa. O inquérito, que teve formalmente início em 2015, está a correr no Departamento de Investigação e Acção Penal do Porto, que delegou a investigação na Divisão de Processos de Crimes Fiscais das Finanças. O processo já tem vários arguidos constituídos. A informação foi confirmada ao PÚBLICO pela Procuradoria-Geral da República. “Nas investigações, o Ministério Público é coadjuvado pela Autoridade Tributária”, adianta a procuradoria.
Esta investigação surge na sequência de uma outra que o PÚBLICO noticiou esta segunda-feira e que culminou com a acusação do reitor da universidade, Salvato Trigo, por alegado desvio de três milhões de euros da Fundação Ensino e Cultura Fernando Pessoa, que detém a instituição privada de ensino. Salvato Trigo está a ser julgado desde Outubro passado no Juízo Local Criminal do Porto, mas o julgamento está a decorrer à porta fechada por determinação do juiz José Guilhermino Freitas, que a pedido do arguido decidiu que o julgamento se fizesse com exclusão de publicidade. O reitor da Fernando Pessoa responde pelo crime de infidelidade, um ilícito punido “com pena de prisão até três anos ou com pena de multa”. Salvato Trigo garante que a “acusação é completamente falsa” e insiste na presunção de inocência.
Em causa, segundo a acusação a que o PÚBLICO teve acesso, estão diversos esquemas que o reitor da Fernando Pessoa terá montado para fazer sair avultadas quantias das contas da fundação. O dinheiro seria canalizado para uma empresa, a Erasmo, cujos sócios são o próprio Salvato Trigo, a mulher e os dois filhos. Acabaria nos bolsos da família Trigo através da distribuição de lucros, uma operação que está vedada à fundação, devido ao seu estatuto.
Queixa da Ordem dos Contabilistas
Na sequência da queixa feita ao Ministério Público pela Ordem dos Contabilistas Certificados, em 2011, a Autoridade Tributária decidiu realizar várias inspecções às contas das entidades envolvidas naquele caso. O Fisco passou a pente fino as contas da fundação, do reitor e da sua mulher, também vice-presidente da fundação, e da tal Erasmo.
O resultado foram várias correcções aos impostos já pagos pelas diferentes pessoas, colectivas e individuais. No total, o Fisco exigiu mais de 1,4 milhões de euros à fundação, a Salvato Trigo e à mulher e à Erasmo. Os visados não encararam de ânimo leve as novas cobranças da Autoridade Tributária e impugnaram-nas nos tribunais.
O PÚBLICO encontrou no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto seis processos a correr, todos relativos a impugnações de cobranças da Fazenda Pública interpostos entre 2015 e o ano passado. O de valor mais elevado diz respeito a uma impugnação feita pela Fundação Ensino e Cultura Fernando Pessoa que contesta o pagamento de 844 mil euros exigidos pelas finanças relativamente ao IRC de 2010. Em 2016, a Fernando Pessoa interpôs um outro processo a impugnar uma nova cobrança de mais de 362 mil euros igualmente em sede de IRC, mas desta vez referentes ao ano de 2011.
Já os dois processos intentados por Salvato Trigo e pela mulher deram entrada nos tribunais só no ano passado. Um contesta 41 mil euros exigidos pelo Fisco na sequência de uma correcção do IRS do casal relativo a 2012 e outro impugna uma cobrança de perto de 54 mil euros feita após as finanças alterarem de forma coerciva o rendimento tributado em sede de IRS relativo a 2013.
Também a Erasmo foi visada por novas cobranças do Fisco, que reviu em alta o imposto a pagar pela empresa da família Trigo. A sociedade contestou os quase 58.500 euros exigidos em sede de IRC relativo aos anos de 2010 e 2011 e mais 67 mil euros reivindicados pelas finanças relativamente ao mesmo imposto, mas no ano seguinte.
Contactada pelo PÚBLICO, a advogada da fundação e da Erasmo nestes processos, Paulina Casimiro, recusou prestar declarações. Já o reitor da Fernando Pessoa não atendeu o telefone nem respondeu a mensagens.
No processo que está em julgamento, o Ministério Público pede que a vantagem patrimonial que Salvato Trigo obteve com o crime, estimada em pelo menos 3.033.056 euros, seja declarada perdida a favor do Estado, já que foi obtida “através da prática de um facto ilícito”. O julgamento já se encontra na recta final, estando, neste momento, agendada apenas mais uma sessão para o final de Fevereiro.
Como ganhar 21 mil euros em três meses?
Não é fácil ganhar 21 mil euros em três meses sem fazer praticamente nada. Mas Salvato Trigo e a família parecem ter esse mérito. Pelo menos é isso que descreve a acusação do Ministério Público que imputa um crime de infidelidade ao reitor da Fernando Pessoa. A vantagem, explica-se, está associada à compra, em Dezembro de 2006, de uma casa, contígua à reitoria da universidade, que alberga actualmente a Escola de Pós-Graduações da instituição.
O imóvel foi comprado formalmente por uma empresa da família Trigo, a Erasmo, que, no entanto, como não tinha dinheiro disponível para pagar os 1,4 milhões de euros que os vendedores pediam acabou por pedir um empréstimo de 1,2 milhões à própria universidade. Como fazer empréstimos não se enquadra nos fins da fundação que detém a universidade, a Erasmo acabou por pedir um empréstimo bancário. O dinheiro ficou disponível em Abril de 2007, mas em vez de pagar à fundação o devido, diz o MP, a empresa fez uma aplicação financeira por três meses, que rendeu mais de 21 mil euros em juros. Nessa altura, já a universidade pagava à Erasmo pela renda do imóvel 40 mil euros mensais.