Ministério Público investiga avarias na Celtejo e ligação a mar de espuma no Tejo

Empresa nega avarias que o Ministério Público está a investigar com base numa denúncia detalhada que foi considerada credível pelas autoridades.

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O Ministério Público está a investigar alegadas avarias em diversos equipamentos na Celtejo, fabricante de papel sediada em Vila Velha de Ródão, que podem estar na origem de um dos mais graves crimes ambientais no rio Tejo português dos últimos anos. A empresa desmente informações sobre avarias e descargas ilegais para o rio que constam de uma denúncia considerada credível pelas autoridades.

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O Ministério Público está a investigar alegadas avarias em diversos equipamentos na Celtejo, fabricante de papel sediada em Vila Velha de Ródão, que podem estar na origem de um dos mais graves crimes ambientais no rio Tejo português dos últimos anos. A empresa desmente informações sobre avarias e descargas ilegais para o rio que constam de uma denúncia considerada credível pelas autoridades.

O alerta foi dado na quarta-feira (dia 24) da semana passada por ambientalistas. Um enorme manto de espuma cobria quase por completo as águas do Tejo, junto ao açude insuflável de Abrantes. Na zona é frequente acumularem-se resíduos de poluição devido à barragem da água, mas nada como o que foi avistado nesse dia: a água corria negra e a espuma, que chegou a ter mais de um metro de altura, ia de margem a margem, que distam entre si em cerca de 240 metros.

Na quinta-feira o Ministério do Ambiente ordenou que a Inspecção-geral do Ambiente, da Agricultura, do Mar, do Ambiente e do Ordenamento do Território (IGAMAOT) realizasse acções inspectivas extraordinárias, com a recolha de água para análises ao longo do rio, com especial incidência junto ao açude de Abrantes e junto a Vila Velha de Ródão, onde estão instaladas três papeleiras, entre outras empresas que fazem descargas para o rio.

Por essa altura, segundo apurou o PÚBLICO, na IGAMAOT já havia fortes suspeitas e indícios de que a fonte poluidora deveria ser uma das três empresas papeleiras existentes em Vila Velha de Ródão, mas na sexta-feira chegou a esta entidade uma denúncia considerada credível e que detalhava um conjunto de avarias em equipamentos da Celtejo que tinham levado a empresa a fazer várias descargas poluidoras sem qualquer tratamento. Estas descargas nunca foram comunicadas às autoridades e na quinta-feira a empresa negava mesmo ter qualquer responsabilidade na enorme mancha poluidora visível em Abrantes.

A denúncia não só confirmava algumas das suspeitas já existentes na IGAMAOT como detalhava as alegadas avarias em diversos equipamentos e as situava no tempo, revelando que estas tinham começado no dia 17 deste mês e se tinham prolongado pelo menos até dia 25, um dia depois de ter sido detectado o enorme manto de espuma junto ao açude de Abrantes.

Na sexta-feira, o ministro do Ambiente, João Pedro Matos Fernandes, face aos indícios existentes na IGAMAOT e ainda antes de ter conhecimento da denúncia, tomou duas medidas pouco habituais. Primeiro revelou ter notificado a Celtejo para reduzir em 50% o volume de afluente rejeitado, o que obrigava a uma redução de actividade durante dez dias. Mais tarde, após uma reunião de urgência com diversas entidades em Abrantes, anunciou ter feito à Procuradoria-Geral da República (PGR) uma participação crime por poluição no Tejo a três papeleiras sediadas em Vila Velha de Rodão. Não revelou os nomes, mas notícias não desmentidas apontavam a Navigator, a Celtejo e a Paper Prime.

A PGR confirmou ter iniciado uma investigação, em que o Ministério Público (MP) é coadjuvado pela Polícia Judiciária (PJ) de Coimbra e com a colaboração da IGAMAOT.

Agentes destas três entidades foram de imediato para o terreno no sábado e, numa operação que ainda decorria na segunda-feira, fizeram visitas a várias empresas. Entre elas a Celtejo, com os investigadores a terem na sua posse a informação que tinha sido revelada na denúncia. Os documentos recolhidos ao longo do fim-de-semana na Celtejo terão confirmado alguns dos factos denunciados.

O PÚBLICO confontou ontem a Celtejo com alguns destes factos, tendo fonte oficial da empresa negado qualquer problema: “A Celtejo não teve qualquer avaria na sua laboração, nem na sua ETAR, esteve sempre a funcionar dentro da normalidade.”

Já o gabinete do ministro do Ambiente recusou fazer qualquer declaração sobre os factos apurados pelo PÚBLICO.

Esta informação recolhida até agora pelos agentes do MP, PJ e IGAMAOT não permite dizer que a Celtejo é a culpada pela forte mancha poluidora detectada no rio na semana passada, até porque a investigação ainda decorre e as análises feitas à água só vão chegar às mãos das autoridades na próxima semana.

O secretário de Estado do Ambiente visitou na segunda-feira o açude de Abrantes, afirmando que ainda são desconhecidos os responsáveis pelo surgimento do manto de espuma branco no Tejo, na zona de Abrantes.

"Ainda não sabemos quais foram as causas deste evento. Estamos a estudá-las e a tomar medidas de precaução para chegar à fonte", explicou o governante aos jornalistas, referindo que as análises estarão concluídas na quarta-feira e a avaliação causa/efeito será feita na próxima semana.

Carlos Martins ressalvou que a imposição do Governo à Celtejo (sem nunca referir o nome da empresa de papel) para que reduzisse as suas emissões para o rio Tejo "nada têm a ver com qualquer desconfiança". "Foram cumpridas as recomendações que foram dadas. São medidas de precaução e não estão para já ligadas a nenhuma particular situação de desconfiança aos caudais descarregados. As análises dirão se sim ou não a qualquer associação entre as duas situações", salientou em declarações citadas pela agência Lusa.

Por outro lado, o secretário de Estado do Ambiente referiu que foram criados mais dois postos de monitorização à qualidade da água do Tejo e reduzido o intervalo de tempo entre cada medição. "Eram cinco postos que faziam uma monitorização a cada 48 horas e agora fazem um controlo diário", adiantou.

A remoção da espuma que cobre o Tejo em Abrantes ainda decorria na segunda-feira e, segundo uma nota do Ministério do Ambiente, foram realizados 13 transportes, o que corresponde a um volume aspirado de espuma de, aproximadamente, de 158 m3. A espuma aspirada foi encaminhada para a Estação de Tratamento de Águas Residuais (ETAR) de Vila Nova da Barquinha, que procederá ao seu tratamento. Em função da capacidade de tratamento das ETAR poderá verificar-se, nos próximos dias, a necessidade de encaminhar espuma também para a ETAR do Gavião.

Também na segunda-feira, o BE requereu um conjunto de audições no Parlamento sobre a poluição no Rio Tejo, em Abrantes, entre as quais do ministro do Ambiente, do presidente da Agência Portuguesa do Ambiente e dos autarcas de Abrantes e Mação.