As redes sociais e o discurso público
Que a degradação do discurso público ocorra precisamente no momento em que temos mais ferramentas para comunicar é uma ironia histórica apreciável.
Transferir para o Facebook os desabafos que se têm no café tornam esses mesmos desabafos em poderosas ferramentas de acção social que muitas vezes regressam para nos assombrar. A audiência é potencialmente global e perene, porque o que se coloca na Internet fica lá para sempre e disponível para qualquer um. E esperar que o que dizemos não tenha consequências é de uma irresponsabilidade própria de crianças mimadas.
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Transferir para o Facebook os desabafos que se têm no café tornam esses mesmos desabafos em poderosas ferramentas de acção social que muitas vezes regressam para nos assombrar. A audiência é potencialmente global e perene, porque o que se coloca na Internet fica lá para sempre e disponível para qualquer um. E esperar que o que dizemos não tenha consequências é de uma irresponsabilidade própria de crianças mimadas.
O mesmo não é dizer que não se tenha direito à liberdade de expressão. Essa está bastante bem consagrada na lei, com os limites que lhe são reconhecidos, aplicando-se da mesma forma quer se trate de um depoimento na televisão, de um grito na via pública ou de um post nas redes sociais.
Vem isto a propósito na notícia que publicamos hoje sobre as consequências profissionais da utilização das redes sociais. Sim, parece óbvio que contratos de trabalho a limitar a actuação na Internet são atentados à liberdade de expressão. Mas também é lógico que um funcionário deva ser impedido de difamar nas redes sociais a empresa onde trabalha.
No plano mais lato, saber se são estas plataformas que pioram o nosso comportamento ou se elas apenas se limitam a amplificar a nossa mesquinhez comum é uma questão filosófica interessante, que não desvia do essencial: dispensamos maior estupidificação da discussão política. Ler uns posts no Facebook não pode substituir um bom livro, atirar umas larachas no Twitter ou numa caixa de comentários não substitui um debate de ideias. Que a degradação do discurso público ocorra precisamente no momento em que temos mais ferramentas para comunicar é uma ironia histórica apreciável — e reveladora da nossa qualidade enquanto povo e das nossas prioridades enquanto indivíduos.
Esta cultura em que todos temos opinião sobre tudo, em que dispensamos os especialistas porque a opinião de cada um vale exactamente o mesmo, é perfeita para degradar o nível geral da discussão pública. A partilha é o Santo Graal dos tempos modernos, estimulada pelas plataformas da época. E fazemo-lo simplesmente porque isso permite a estas plataformas recolher mais dados sobre nós, de forma a que possam vender esses mesmos dados a anunciantes. A nossa irritação comum é a engrenagem feliz de uma máquina de fazer dinheiro para os gigantes de Silicon Valley, que de vez em quando lá se lembram de espalhar centros de excelência e call-centers um pouco por todo o mundo.