Tribunal de Oeiras obrigou SIC a usar filtros para impedir identificação das crianças

Decisão foi tomada pelo Tribunal Cível de Oeiras na sequência da acção especial de tutela de personalidade interposta pelo Ministério Público.

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O Tribunal Cível de Oeiras ordenou à SIC a utilização de filtros de imagem e som nas crianças que participarem nos próximos episódios do programa Supernanny.

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O Tribunal Cível de Oeiras ordenou à SIC a utilização de filtros de imagem e som nas crianças que participarem nos próximos episódios do programa Supernanny.

A decisão, tomada esta sexta-feira, na sequência da acção especial de tutela da personalidade interposta pelo Ministério Público, em representação das crianças e jovens, é provisória e irrecorrível. Vai vigorar pelo menos até 15 de Fevereiro. Nesse dia, às 9h30, realiza-se naquele tribunal o julgamento que opõe o Ministério Público à SIC.

Na acção especial de tutela da personalidade, o Ministério Público pedia que a SIC fosse impedida de emitir novos episódios daquele polémico programa. Mas admitia que a exibição ficasse condicionada à utilização de filtros de imagem e voz que evitassem a identificação das crianças. 

O MP pede ainda que o tribunal decrete, a título provisório e imediato, que seja retirado ou bloqueado o acesso a qualquer conteúdo dos programas já exibidos e que continuam disponíveis, por exemplo, no site daquela estação televisiva. 

As três crianças que participaram nos primeiros dois episódios deste polémico programa viram entretanto instaurados processos de promoção e protecção por parte das Comissões de Protecção de Crianças e Jovens (CPCJ).

No que respeita ao primeiro programa, que tinha como protagonista a família de uma criança de sete anos apresentada como "Furação Margarida", o Departamento de Investigação e Acção Penal da Comarca Oeste do MP instaurou, a pedido da CPCJ de Loures, um inquérito para investigar factos susceptíveis de integrarem o crime de desobediência. Isto porque a SIC se recusou a acatar o pedido prévio de retirada das imagens alusivas àquele programa. Isto apesar de este ter sido apoiado pelos pais da criança que se mostraram arrependidos de terem autorizado a exposição da filha naqueles moldes e que alegaram, de resto, não a reconhecer no programa que viria a ser transmitido.  

A polémica em torno deste programa desencadeou-se logo após a transmissão do primeiro episódio, no dia 14 de Janeiro. O Supernanny corresponde a um formato internacional, que, segundo aquela estação, visa "auxiliar os pais e educadores a melhorarem a relação com os seus filhos, ajudando-os a controlar a rebeldia dos filhos e a estabelecer regras e limites".

A exposição da vida privada de menores, incluíndo rituais como a hora do banho e de ir domir - ainda que autorizada pelos pais -, levou, porém, vários organismos, nomeadamente a Comissão dos Direitos Humanos da Ordem dos Advogados, a considerarem que o mesmo  representa uma "violação desproporcionada dos direitos de personalidade dos menores, em especial do seu direito à reserva da intimidade da vida privada". 

A exposição dos menores no programa é ainda susceptível de os transformar "em vítimas de incompreensão e segregação social nos seus ambientes sociais de eleição", segundo a mesma comissão, que veio, de resto, secundar a indignação já anteriormente manifestada pela Unicef e pelo Instituto de Apoio à Criança, além de pela presidente da Comissão de Nacional de promoção dos Direitos e Protecção das Crianças e Jovens, Rosário Farmhouse.  

A interposição desta acção especial de tutela da personalidade reveste-se "de natureza urgente", conforme sublinha a PGR, no comunicado às redacções. Previstas nos artigos 878º do Código de Processo Civil, estas acções de tutela de personalidade visam "evitar a consumação de qualquer ameaça ilícita e directa à personalidade física ou moral de ser humano ou a atenuar, ou a fazer cessar, os efeitos de ofensa já cometida".

A respectiva audiência deve, nos termos da lei, decorrer nos 20 dias subsequentes à entrada do requerimento, podendo ser proferida uma decisão provisória, "irrecorrível e sujeita a posterior alteração ou confirmação no próprio processo, quando o exame das provas oferecidas pelo requerente permitir reconhecer a possibilidade de lesão iminente e irreversível da personalidade física ou moral", no caso dos menores retratados no programa televisivo. 

A SIC tem-se mostrado indisponível para comentar as críticas a um programa que, no segundo episódio, foi o mais visto pelos portugueses. Mas, apesar de manter disponível a possibilidade de revisionamento do primeiro Supernanny, continua sem identificar a família do terceiro episódio. No final do segundo, chegaram a ser mostradas imagens de uma família com três filhos, um dos quais bebé, que protagonizariam o terceiro episódio.