Deputados do PSD alertam para excessos no pacote da transparência
Trabalhos da comissão foram suspensos até depois do congresso dos sociais-democratas, prazo que permitirá uma procura de consensos entre as várias bancadas.
O PSD pediu, o PS aceitou e ao final da tarde houve unanimidade para aceitar a suspensão dos trabalhos da comissão eventual sobre reforço da transparência dos cargos públicos. O chamado pacote da transparência tinha sido discutido, durante a manhã desta quinta-feira, na reunião da bancada do PSD e alguns sociais-democratas alertaram para os riscos do caminho da exclusividade dos deputados.
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O PSD pediu, o PS aceitou e ao final da tarde houve unanimidade para aceitar a suspensão dos trabalhos da comissão eventual sobre reforço da transparência dos cargos públicos. O chamado pacote da transparência tinha sido discutido, durante a manhã desta quinta-feira, na reunião da bancada do PSD e alguns sociais-democratas alertaram para os riscos do caminho da exclusividade dos deputados.
A ex-ministra da Justiça Paula Teixeira da Cruz foi uma das vozes na bancada que deixaram avisos contra as propostas que estão em cima da mesa que reforçam a transparência, as incompatibilidades dos titulares dos cargos públicos e também propõem a exclusividade dos deputados (BE). “Isto não é o pacote da transparência, é o caminho para a exclusividade”, afirmou ao PÚBLICO a deputada, defendendo que o regime actual “é equilibrado” e que “é uma questão de fiscalização”. A ex-ministra da Justiça considera que o apertar das regras conduz à exclusividade e que isso “resulta no empobrecimento do Parlamento” e na “completa funcionalização” da Assembleia.
Outro social-democrata, Fernando Negrão, que preside à comissão eventual sobre esta matéria, também se mostrou contra o regime da exclusividade dos deputados – “é uma partidarização das funções” dos parlamentares – mas defende que se podem reforçar as regras da transparência.
Nem só os juristas e advogados se pronunciaram sobre os diplomas em questão. Como profissional de saúde, o deputado Ricardo Baptista Leite defendeu a necessidade de voltar a “credibilizar” a classe política, mas considerou mais “enriquecedor” um Parlamento em que não haja exclusividade. “Arriscamo-nos a ter parlamentares que vivem uma vida palaciana”, afirmou ao PÚBLICO depois da reunião da bancada, reiterando as suas posições sobre a matéria que vão no sentido de reforçar a transparência. O deputado deu um exemplo: como médico, se aceitar participar numa conferência promovida por uma entidade privada, isso tem de ficar registado no site do Infarmed. “Porque é que os deputados não têm a mesma obrigação?” questionou, colocando também reticências na imposição de um valor máximo de 100 euros para os políticos aceitarem ofertas. Seria preferível, na sua opinião, que houvesse mais transparência sobre as ofertas aceites. Ricardo Batista Leite considerou que questões da transparência também estão relacionadas com o desenho do nosso sistema político. “Um político pode prevaricar, mas o partido pode colocá-lo nas listas de deputados outra vez”, refere.
A votação dos 18 diplomas vai ser adiada até à realização do congresso do PSD por proposta do líder eleito do PSD, Rui Rio. O pedido foi anunciado logo no início da reunião da bancada social-democrata pelo líder parlamentar, depois de ter sido articulado com o próprio Hugo Soares, Fernando Negrão, e Luís Marques Guedes, o coordenador do PSD na comissão. Momentos depois, o líder da bancada do PS, Carlos César, veio dizer que compreendia as razões invocadas pelo PSD para adiar a votação até ao congresso do partido, mas desvalorizou as divisões internas na bancada sobre o assunto. Carlos César rejeitou qualquer alteração de fundo nas propostas apresentadas pelos socialistas e que geraram divergências na bancada que ficaram visíveis nas jornadas parlamentares da passada segunda e terça-feira. "Não se preocupem com as divisões internas do PS", disse Carlos César aos jornalistas. "As propostas são aquelas que foram entregues e que vamos defender", afirmou, lembrando que a regra da bancada é a liberdade de voto, e não a disciplina de voto. Carlos César sublinhou que as propostas apresentadas sobre a representação de interesses (lobbying), código de conduta e impedimentos e incompatibilidades dos deputados reflectem a linha oficial: "A posição oficial do presidente do grupo parlamentar do PS é a que está plasmada nas propostas."
O líder da bancada socialista considerou que este prazo deve ser aproveitado para melhorar a redacção das propostas que deve resultar na "clareza" dos textos, mas não num "amolecimento naquilo que é pretendido". Na última reunião da comissão ficou claro que os entendimentos sobre lobbying e incompatibilidades e impedimentos dos deputados têm terreno mais fértil à direita do que à esquerda. Este compasso de espera poderá permitir a discussão entre os vários grupos parlamentares com vista a uma aproximação de posições.
Tal como previsto, na reunião da comissão, realizada ao fim da tarde, houve unanimidade na aceitação da suspensão dos trabalhos pedida pelo PSD. O presidente da comissão disse que iria expor os motivos da suspensão ao presidente da Assembleia da República e pediria uma nova prorrogação do prazo de funcionamento desta comissão eventual, que deveria acabar em finais de Fevereiro. A serem prolongados os trabalhos por mais seis meses, os deputados terão oportunidade de debater os projectos até ao Verão. com Leonete Botelho