Esta série de super-heróis não é igual às outras

Black Lightning, a série centrada no super-herói Raio Negro, chegou a Portugal através do Netflix. Centrada num protagonista negro, de meia-idade, que sai da reforma para voltar a combater o crime na sua cidade, é diferente do que costuma acontecer em ficção do género.

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Black Lightning não é uma série de super-heróis como as outras. Muitos menos como as suas colegas da DC Comics e do canal CW, como ArrowFlash, Supergirl ou Legends of Tomorrow, às quais, por enquanto, ainda não vai estar ligada. Tem acção e aventura e combate ao crime, mas, para começar, centra-se num herói de meia-idade e não só não mostra a história da sua origem, como, no momento em que arranca, o protagonista está há nove anos arredado da prática da actividade super-heróica. E depois, Black Lightning, ou Raio Negro, em português, é um homem negro. A série, estreada nos Estados Unidos na semana passada, chegou esta semana a Portugal via Netflix, com cada novo episódio a vir com seis dias de atraso em relação à exibição original.

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Black Lightning não é uma série de super-heróis como as outras. Muitos menos como as suas colegas da DC Comics e do canal CW, como ArrowFlash, Supergirl ou Legends of Tomorrow, às quais, por enquanto, ainda não vai estar ligada. Tem acção e aventura e combate ao crime, mas, para começar, centra-se num herói de meia-idade e não só não mostra a história da sua origem, como, no momento em que arranca, o protagonista está há nove anos arredado da prática da actividade super-heróica. E depois, Black Lightning, ou Raio Negro, em português, é um homem negro. A série, estreada nos Estados Unidos na semana passada, chegou esta semana a Portugal via Netflix, com cada novo episódio a vir com seis dias de atraso em relação à exibição original.

É algo que não acontece todos os dias nas adaptações televisivas ou cinematográficas de super-heróis. Felizmente, há cada vez mais. Na Marvel, Luke Cage é o protagonista da sua própria série do Netflix, estreada em 2016 – Cress Williams, que faz agora de Black Lightning, chegou a fazer audições para esse papel –, além de aparecer em Jessica Jones e ter um dos papéis principais em Os Defensores, e Black Panther, o Pantera Negra da banda desenhada, vai ter direito ao seu próprio filme, com estreia marcada para Portugal a 15 de Fevereiro, depois de se ter estreado em Capitão América: Guerra Civil. Mas ainda não tinha acontecido no universo da DC.

Tal como a série de Luke Cage é da responsabilidade de Cheo Hodari Coker e Black Panther é realizado por Ryan Coogler, também Black Lightning é uma história de pessoas afro-americanas contada por pessoas parecidas com aquelas que estão a ser representadas – todas elas foram personagens criadas originalmente por homens brancos, com muitos lugares comuns à mistura, apesar de a primeira vez que o Raio Negro apareceu na banda desenhada, em 1977, ter sido Trevor von Eeden, o primeiro artista negro da DC, a desenhá-lo com Tony Isabella a escrever. Neste caso, o casal Salim e Mara Brock Akil – Salim é creditado como o criador, Mara é produtora executiva. Mara foi a criadora de Girlfriends, uma sitcom do início dos anos 2000 que passou na RTP2 e revelou Tracee Ellis Ross, a filha de Diana Ross hoje a ganhar Globos de Ouro pelo papel em Black-ish, ao mundo.

Os criadores não se coíbem de comentar a actualidade e enveredar por um caminho político. E é logo ao início. O Raio Negro é Jefferson Pierce, que se retirou de usar os seus superpoderes para combater o crime e a injustiça em Freeland – uma cidade fictícia que substitui a Metropolis da banda desenhada, provavelmente para se distanciar do universo das colegas da DC. É agora o reitor do liceu local e sente que assim salva mais pessoas, além de ter mais tempo para cuidar das duas filhas adolescentes. Quando a série começa, Pierce, a guiar, é parado pela polícia por se parecer com o suspeito de um assalto, apesar de não ter feito nada. Isso enfurece-o. Quase que solta os seus poderes – gera descargas de electricidade e solta raios –, mas a polícia apercebe-se do engano e deixa-o ir.

Esse sentimento é algo que Salim Akil conhece bem. O criador disse ao The New York Times que foi parado inúmeras vezes e baseou esta cena específica numa vez em que foi parado à porta do seu escritório em Santa Mónica, na Califórnia, e esteve quase a passar dos limites. Pensou em não agir como é suposto alguém na sua posição agir, mas não o fez. Jefferson Pierce fá-lo e decide nesse momento voltar a ser o Raio Negro.

Essa dicotomia, entre a violência e a não-violência, é comparada por Akil, na mesma entrevista, à dualidade entre Malcolm X e Martin Luther King, Jr., sendo o Raio Negro Malcolm e Pierce King. Não é a primeira vez que isso é usado em banda desenhada: ao longo dos anos, tanto leitores quanto criadores fizeram o mesmo paralelo com Magneto e o Professor Xavier dos X-Men.

A voltar à acção, o Raio Negro vai ver-se a braços com um gangue chamado 100, liderado por Tobias Whale (o rapper Krondon, parte do grupo Strong Arm Steady) e terá a ajuda do seu alfaiate e mentor, Gambi (James Remar, um dos poucos actores brancos aqui), que lhe faz um fato novo, mais feio e espalhafatoso do que a maioria dos fatos de super-heróis em imagem real, uma categoria em que a beleza não reina. China Anne McClain, que é cantora e membro do grupo de r&b McCain, faz da filha mais nova de Pierce – há outras pessoas do mundo da música por aqui: Jill Scott vai ser uma das vilãs), enquanto Nafessa Williams, da última época de Twin Peaks, é a filha mais velha, que estuda medicina e dá aulas no liceu do qual o herói é reitor, enquanto a britânica Christine Adams, de Batman – O Início e Agents of S.H.I.E.L.D., é a ex-mulher de Pierce.