Uniram-se em defesa das aves do Mindelo e agora querem voltar à luta

A Associação dos Amigos do Mindelo esteve parada durante oito anos. A Reserva Ornitológica continua a ser uma das bandeiras do colectivo.

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Passaram oito anos desde que a Associação dos Amigos do Mindelo para a Defesa do Ambiente (AAMDA) entrou numa espécie de hibernação prolongada. Com novo fôlego, regressa no ano em que celebra duas décadas e meia desde a data de fundação com a eleição de nova direcção, em Dezembro de 2017, para retomar a actividade iniciada em 1992. 

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Passaram oito anos desde que a Associação dos Amigos do Mindelo para a Defesa do Ambiente (AAMDA) entrou numa espécie de hibernação prolongada. Com novo fôlego, regressa no ano em que celebra duas décadas e meia desde a data de fundação com a eleição de nova direcção, em Dezembro de 2017, para retomar a actividade iniciada em 1992. 

Do conjunto de prioridades para a segunda vida da associação está continuar a zelar pela aplicação da Agenda 21 Local - com vista a melhorar a qualidade de vida com implementação de medidas de sustentabilidade e cidadania activa - e revitalizar a Reserva Ornitológica do Mindelo (ROM), a reserva natural mais antiga do país, a partir de 2009 designada por Paisagem Protegida Regional do Litoral de Vila do Conde e Reserva Ornitológica de Mindelo (PPRLVROM), que desde a morte do professor Santos Júnior (1990), peça chave para a criação da reserva natural, terá sido entregue ao abandono. 

Três meses antes da reorganização da AAMDA, em Setembro, a ROM completou 60 anos. Na altura, ainda em campanha eleitoral, a presidente da Câmara Municipal de Vila do Conde, Elisa Ferraz, actualmente a cumprir segundo mandato, desta vez como independente, após ter-se afastado do PS, disse ao PÚBLICO que essa questão do abandono “é um problema antigo” que está a ser resolvido progressivamente desde que assumiu a liderança do executivo em 2013, ainda pelos socialistas. 

Com vista a mitigar esse “problema” anunciou em Setembro de 2017 estar já aprovado um financiamento para o melhoramento dos caminhos dentro da zona florestal, para despoluir a ribeira de Silvares, que atravessa a reserva, e para melhorar a sinalização. Sucedem-se estas melhorias anunciadas ao já construído passadiço na linha de praia e à inauguração do observatório de aves na data de celebração dos 60 anos.
Constituir Conselhos Directivo e Consultivo é prioridade

É junto desse observatório de aves que falamos com o actual vice-presidente da associação e sócio fundador, Joaquim Cardoso, o primeiro presidente da assembleia geral da AAMDA, actualmente sem sede fixa. Aponta como necessidades prioritárias para a revitalização da ROM essas mesmas questões para as quais servirá o financiamento. Mas fundamental e “prioridade das prioridades” afirma ser a constituição dos Conselhos Directivo e Consultivo que a publicação de Outubro de 2009 que delimita as novas fronteiras da ROM e lhe dá nova designação estipula como necessários para funcionarem como órgãos de gestão da reserva com cerca de 400 hectares entre o rio Onda, Labruge, e o rio Ave.  

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Joaquim Cardoso é um dos fundadores da Associação dos Amigos do Mindelo para a Defesa do Ambiente Joana Gonçalves

Pois os órgãos nunca foram empossados e Elisa Ferraz justificou na altura não ter sido feito por estar a gestão da reserva consignada à Área Metropolitana do Porto, com quem terá sido estabelecido um acordo para que todas as matérias relativas à ROM pudessem ser resolvidas pela autarquia.

Joaquim Cardoso, que entre 1989 e 1997 e entre 2001 e 2008 também foi presidente da Junta do Mindelo, pela lista do PS, apesar de se considerar “um independente”, afirma ser a constituição desses conselhos fundamentais para que se possa criar um plano de gestão. “Só a partir daí podem ser tomadas decisões”, afirma categoricamente. Essa é uma das prioridades da associação: “Fazer pressão para que finalmente se cumpra a lei”. 

Sublinha, contudo, que a direcção da associação pretende ter “a melhor relação possível” com a câmara. “A melhor prenda que nos podia ser dada pela senhora presidente seria a nomeação imediata dos órgãos de gestão da Paisagem Protegida para que estes, no prazo de 6 meses, apresentassem o Plano de Desenvolvimento Estratégico da Paisagem”, afirma.

“Não se deve construir um observatório ou outra coisa qualquer sem um estudo prévio à escala global para se perceber se está enquadrado nas necessidades que existem”, conclui o raciocínio.

Mudar mentalidades

A associação nasce ainda no pico da construção, que teve o seu auge nos anos 80 e 90, altura em que a ROM “foi esventrada”, com “camiões todos os dias a levarem areia das dunas e a depositarem o lixo das obras” no local.

Surge com a reserva como pano de fundo mas não só. Conta que esta freguesia de Vila do Conde, na linha de praia, era uma zona com vários problemas ao nível da falta de consciência ambiental. Uma das impulsionadoras para a fundação da AAMDA terá sido Felícia Cruz, alemã radicada no Mindelo, sócia número 1 e actualmente presidente do conselho fiscal. “Na Alemanha e noutros países europeus já existia outra consciência”, recorda. 

Em 1995 avançam para a Agenda 21 Local. “Foi a primeira Agenda Local do país”, afirma. Recorda nunca ter visto tanta mobilização popular. “As pessoas queriam participar na construção do futuro”, diz. A junta de freguesia do Mindelo tinha assinado a carta de Aalborg - Carta das Cidades Europeias para a Sustentabilidade. A população participava nas várias acções de limpeza promovidas pela associação e na prática mudaram-se mentalidades.

Estes trabalhos de campo deram origem a um relatório de sustentabilidade para “se definir o caminho dali para a frente”. Diz o relatório de progresso lançado em 2007 que foram denotadas melhorias no que toca a descargas de águas pluviais no mar, reduziram-se os focos de poluição dos recursos hídricos, “embora hoje ainda continue muito por fazer” e controlou-se a expansão urbana. Este último ponto estará “directamente relacionado com a crise”, diz. Nos últimos anos terá também melhorado a circulação pedonal e ciclável. 

Por fazer está a aposta numa agricultura sustentável e a consolidação da ROM, que acredita ter um “enorme potencial de crescimento” sobretudo no que toca à divulgação deste destino “no meio cientifico e ambiental”. Ainda existem focos de poluição na reserva, como pudemos constatar, mas “nada que se assemelhe ao passado”.
A associação regressa ao activo por considerar a actual direcção haver ainda muito por fazer na área do ambiente e para retomar o percurso iniciado há 25 anos. A AAMDA nunca deixou de existir, mas “estava parada e sem actividades”. Foi esse facto que motivou Joaquim Cardoso a juntar um núcleo capaz de trazer um novo fôlego. Encabeça esse núcleo, na presidência, Ana Vieira, que de acordo com o vice-presidente está empenhada em levar a cabo um “programa de sensibilização para a cidadania responsável na área do ambiente com destaque para a Agenda Local 21, para a Paisagem Protegida, para o Ordenamento e para a Sustentabilidade”.     

Ainda não há um plano de actividades, mas há linhas orientadores para o triénio. A associação convidou um leque de pessoas de áreas multidisciplinares, desde o Ambiente, à Biologia ou especialistas na matéria das Alterações Climáticas, para integrar um conselho consultivo de forma a ser preconizado um plano de actividades. 
A associação está a passar por um processo de renumeração de sócios – a única fonte de rendimento. Já foram 700, hoje serão duas centenas. Outra meta é conseguir financiamento para alguns programas que estão a ser delineados.  

Entre actividades já definidas e por definir há uma certeza: “Vamos zelar pelo compromisso assumido pela freguesia em respeitar a carta de Aalborg”.