Banca “instantânea” ainda vai demorar meses a chegar a Portugal
Directiva comunitária que pretende acelerar os pagamentos e reduzir o seu custo ainda não foi transposta para o direito português.
Pagar compras ou serviços e realizar transferências pela Internet vai ser mais rápido, mais cómodo, mais seguro e mais barato. Tudo Isto será possível através de novas aplicações tecnológicas para telemóveis, tablets ou computadores.
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Pagar compras ou serviços e realizar transferências pela Internet vai ser mais rápido, mais cómodo, mais seguro e mais barato. Tudo Isto será possível através de novas aplicações tecnológicas para telemóveis, tablets ou computadores.
É uma espécie de revolução nos pagamentos, até agora exclusivos dos bancos, envolvendo empresas que, através de tecnológias financeiras, as chamadas fintech, passam a ter acesso directo aos seus dados bancários, sempre que estes o permitirem. Essas empresas podem prestar serviços directos aos clientes particulares ou a grandes empresas, como a Worten ou a Fnac, tecnológicas internacionais, como a Apple e Google - que estão prestes a lançar essas funcionalidades nos iPhones, iPads e Android - ou mesmo a uma gigante como a Amazon.
Os bancos tradicionais podem e deverão juntar-se a este novo mundo, nomeadamente através de acordos com fintech, de forma a acautelar uma parte do negócio. É que, com a directiva, os particulares e empresas passam a dispor dos seus dados bancários e a poderem autorizar entidades terceiras a aceder directamente às suas contas, a fazer um conjunto de operações, ou a propor-lhes serviços, sem que os bancos onde está depositado o seu dinheiro possam travar esse acesso.
As novas possibilidades, que também são úteis para os bancos que apanhem o comboio da inovação, até porque continuam a ser os únicos a poder conceder crédito, estão reguladas na directiva dos pagamentos, a Payment Services Directive 2 (PSD 2), que deveria ter entrado em vigor no passado sábado, 13 de Janeiro. Mas tal como a directiva dos produtos financeiros, que deveria ter entrado em vigor a 3 de Janeiro, também a PSD 2 vai demorar alguns meses a chegar ao terreno.
O Ministério das Finanças não se compromete com datas, referindo apenas que as duas iniciativas, que deverão ir juntas para o Parlamento, estão a ser “ultimadas”. Depois da sua aprovação em Conselho de Ministros, os projectos de lei serão enviados para o Parlamento, onde descerão para discussão na especialidade. O prazo habitual para a discussão na Comissão de Orçamento e Finanças e Modernização Administrativa (COFMA) é de 60 dias, podendo, no entanto, ser fixado um período mais curto. Mas na COFMA estão cerca de duas dezenas de projectos de lei dos partidos, que cruzam, em particular, a directiva dos produtos financeiros, pelo que fará sentido que a sua discussão seja feita em articulação com as directivas, o que pode obrigar à audição de um conjunto de entidades, atrasando adicionalmente a transposição das novas normas.
Para além da transposição da directiva, a operacionalização das novas regras no mercado nacional implica a criação uma espécie de “via verde” de acessos às contas bancárias, que os maiores bancos confiaram à SIBS, a empresa que assegura soluções de pagamento aos bancos nacionais. Esta entidade admite ter a API (Aplication Programming Interfaces - aplicação tecnológica que permite o acesso dos novos prestadores de serviços de pagamento às contas bancárias do cliente) disponível até ao final do primeiro trimestre. Por outro lado, também no que diz respeito aos mecanismos de segurança ainda há algum trabalho a fazer.
As virtudes da PSD 2
Entre outras características, a PSD 2 pretende acelerar os pagamentos, tornando-os imediatos, ou seja, em poucos segundos, ao contrário do que acontece actualmente, em que podem demorar um dia ou mais. É inovadora porque permite, por exemplo, fazer pagamentos sem sair do site onde está a fazer compras, que até agora implicavam sempre a realização de uma transferência, o uso de um cartão de crédito ou débito, produtos que a prazo tenderão a desaparecer. Mesmo envolvendo outros prestadores de pagamentos, qualquer compra implicava sempre o envolvimento do banco, por transferência ou cartões, no acesso à conta. A partir de agora, abrem-se novas possibilidades, como pagamentos através da simples aproximação do telemóvel ou de um comando de um carro a um dispositivo de pagamento, ou através da voz ou do olhar.
A par da rapidez, a directiva pretende aumentar a concorrência entre diferentes operadores e com isso reduzir os custos para os clientes. Mas as novas funcionalidades terão um custo, pelo menos na maioria dos casos, até porque, em Portugal a experiência dos multibancos nem sempre é vista como positiva, dado que garantiram acesso a um conjunto de serviços sem custos, situação que até hoje foi impossível alterar apesar das ameaças por parte da banca. A vantagem da redução do custo será para os clientes particulares, mas também para empresas que aceitem os novos meios de pagamento, a troco da disponibilização imediata do dinheiro.
Com a directiva, e para além dos novos prestadores de serviços de pagamentos (TPP, na sigla em inglês), a informação de clientes, particulares ou empresas, passa a poder ser agregada numa única aplicação (AIS, na sigla em inglês). Com esta informação agregada e desde que permita o seu acesso a outras entidades, o cliente pode, com maior facilidade, conseguir um empréstimo. Também os bancos que acompanharem as novas funcionalidades, se o cliente o permitir, ficam a conhecer a exposição do cliente noutros bancos, podendo com isso tentar acelerar empréstimos ou oferecer produtos mais competitivos do que a concorrência.
Desta forma, amplia-se o big brother sobre as contas do cliente, ainda que sempre com autorização deste e através de mecanismos de segurança que se pretendem reforçados face aos actuais, nomeadamente em relação ao IBAN (número de identificação bancária), que levanta riscos de utilização por outras pessoas, ou aos cartões de crédito, que podem ser alvo de clonagem.