A ópera também é para os jovens — o “sortudo” Tiago Cabrita prova-o

A relação de Tiago com a música surgiu (quase) à nascença. A ópera veio a seguir. Apesar da falta de financiamento, o jovem já apresentou três óperas. No Dia Mundial do Compositor, o P3 falou com o músico de 33 anos sobre o seu percurso e o estado da ópera em Portugal

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Tiago Cabrita tem 33 anos e já apresentou três óperas em Portugal Marta Cavaco

"Ópera? Isso é para os mais velhos!" A ideia de que este género é só para gente mais madura ou de classes sociais mais altas será mesmo verdade? No Dia Mundial do Compositor, que se assinala esta segunda-feira, 15 de Janeiro, o P3 foi conhecer Tiago Cabrita, um jovem músico português que personifica o oposto desta concepção — e atira outras respostas.

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"Ópera? Isso é para os mais velhos!" A ideia de que este género é só para gente mais madura ou de classes sociais mais altas será mesmo verdade? No Dia Mundial do Compositor, que se assinala esta segunda-feira, 15 de Janeiro, o P3 foi conhecer Tiago Cabrita, um jovem músico português que personifica o oposto desta concepção — e atira outras respostas.

Com 11 anos pegava no violino. Aos 14 entrava no Conservatório. Ainda nem tinha atingido a maioridade e já apresentava a sua primeira obra, aos 17 anos. Agora, com 33, já criou e apresentou três óperas, tendo conquistado dezenas de distinções, entre elas o primeiro prémio no Concurso Internacional de Jovens Compositores da cidade de Portimão. O seu último trabalho, O Jardim, estreou-se em Novembro na Escola Superior de Música de Lisboa e conta a história de um homem bonito que seduz mulheres para se aproveitar delas e as matar. Trata-se de uma narrativa em torno de um serial killer, um protagonista pouco comum na ópera. “O perfil psicológico das personagens alimenta o que faço do ponto de vista musical”, atesta o músico, em entrevista ao P3. Realizada em contexto académico, esta ópera de 30 minutos terá uma segunda apresentação a 17 de Fevereiro, no Palácio da Ajuda.

As obras de Tiago são constantemente pautadas pela originalidade e pela novidade. Na sua segunda ópera, O Deus do Vulcão, tornou-se no primeiro compositor a incorporar o gamelão, originário da Indonésia, numa peça de ópera. As partes faladas e cantadas tiveram de ser adaptadas a estas particularidades, mas foi com esta peça que se deu o clique na mente do jovem. “Foi com esta obra que percebi que queria ser compositor”, refere o músico, que salienta ainda que o facto de a ópera ter sido ao ar livre impôs uma série de desafios que a tornou bastante “aliciante”.   

Ópera, mas também rock e pop

Afinal, o que o atraiu para a ópera? A música acompanha-o (quase) desde nascença. “As minhas primeiras memórias de infância estão ligadas à música”, diz o compositor. Nascido em 1985 na cidade de Lisboa, foi influenciado pelo irmão mais velho que ouvia as bandas populares da época. “Para além das músicas infantis, ouvia os Xutos e Pontapés ou os The Cure”, acrescentando que, por ser compositor de ópera e apreciador de música clássica, não deixa de apreciar um bom rock ou um pop. "São géneros que, se não puderem ser misturados, estão sempre lado a lado", sustenta.

A ópera veio mais tarde, quando ingressou no Conservatório de Música D. Dinis. Interpretava as músicas mas estava ainda longe de imaginar que iria, um dia mais tarde, compor as suas próprias obras. Aos 17, por curiosidade, decide tentar. A Noite em Si Menor surgiu de forma “instintiva e amadora”, mas terá para sempre “um lugar no coração” do músico, por ter sido a primeira.

Apesar do gosto pela música e do talento que demonstrava, a vida de Tiago passou pelas mesmas indefinições da de qualquer adolescente. Chegou a inscrever-se no curso de Sociologia no ISCTE – Instituto Universitário de Lisboa. No entanto, a paixão falou mais alto e, a meio do curso e “contra a vontade dos pais”, desistiu. A sua nova vida começou quando, em 2006, se inscreveu na licenciatura em Composição na Escola Superior de Música de Lisboa. Ao longo do curso foi produzindo peças que ia utilizando para as várias unidades curriculares. 

Na sua fase de vida mais recente, tem ensinado no Colégio Moderno e na Escola de Música do Colégio Moderno. É para ele “um enorme orgulho” quando vê os seus estudantes a assistir às suas obras. Tenta transmitir os ensinamentos que os seus professores lhe transmitiram, mas admite que lhe deu “muito prazer ser aluno” e que há aulas que irá “guardar para sempre”.

 

Falta financiamento 

As óperas em Portugal são, na maior parte dos casos, de curta duração. O que quer isto dizer? Uma obra cuja duração não ultrapassa os 15 minutos. Nas três obras que Tiago produziu, duas foram óperas curtas. As razões prendem-se com os custos: “Há muitas pessoas envolvidas numa ópera e os custos vão-se acumulando”. Em jeito de exemplo, e depois de listar perto de duas dezenas de diferentes profissionais envolvidos na produção de um espectáculo, diz que uma peça modesta pode custar mais de 30 mil euros.

Arranjar financiamento é o “grande desafio" que os compositores enfrentam. A título de exemplo, Tiago refere que já tem um novo projecto em mente e que todos os contactos foram estabelecidos, faltando “apenas” o financiamento. Muitos dos projectos tornam-se inviáveis e vão parar à gaveta devido à falta de apoios. O jovem compositor considera-se, por isso, um “sortudo” por já ter conseguido estrear três projectos, numa conjuntura tão difícil. 

Na opinião do músico, os jovens “não se têm distanciado da ópera”. A dificuldade que os compositores sentem em obter financiamento para a produção de peças mais apelativas contribui para que os jovens não se interessem tanto pelo género musical, mas garante que ainda há “muitos jovens” interessados em ver e fazer ópera no nosso país.