H&M e o triste poder da ignorância
Tão chocante como ver uma marca poderosa e com uma visibilidade e responsabilidades imensuráveis cometer um erro destes é perceber que o quid pro quo se deveu, mais uma vez, à ignorância
A marca sueca H&M cometeu um daqueles erros que desvirtua, até aos ossos, a preocupação e responsabilidade ética e moral de qualquer instituição. Desenvolver um produto com a expressão “Coolest monkey in the jungle” e fotografar num modelo infantil negro é, de muitas formas, errado. Mas é-o, mais ainda, quando a visão e a estratégia da marca assentam numa premissa muito clara: “To make sure our customers wear our products with pride we have to be conscious in all our actions”.
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A marca sueca H&M cometeu um daqueles erros que desvirtua, até aos ossos, a preocupação e responsabilidade ética e moral de qualquer instituição. Desenvolver um produto com a expressão “Coolest monkey in the jungle” e fotografar num modelo infantil negro é, de muitas formas, errado. Mas é-o, mais ainda, quando a visão e a estratégia da marca assentam numa premissa muito clara: “To make sure our customers wear our products with pride we have to be conscious in all our actions”.
Várias etapas foram, flagrantemente, negligenciadas durante este processo e resultaram num erro deplorável e injustificado. A equipa de Buying & Design achou que era uma boa ideia criar este produto não tendo, claramente, a noção de que a sensibilidade ao criar conteúdos é a chave para o sucesso. A equipa de Visual achou insignificante o conteúdo escrito na camisola e decidiu fotografar a peça neste modelo infantil. A equipa de Marketing também não encontrou qualquer tipo de problema nesta imagem e decidiu publicitá-la. Tão chocante como ver uma marca poderosa e com uma visibilidade e responsabilidades imensuráveis cometer um erro destes é perceber que o quid pro quo se deveu, mais uma vez, à ignorância.
O sistema educativo está em falha para com a história. Os meios de comunicação social também. O nosso facilitado acesso à informação é, infelizmente, um argumento transparente no que diz respeito à relação íntima que deveríamos ter com o passado. A animalização como instrumento de desumanização e inferiorização é uma manifestação humilhante de opressão desde tempos onde a vergonha nos impede de chegar.
Acontecimentos de indescritível imoralidade como o de Penny Sparrow ou do jornal Belgian De Morgen, em que o casal Obama era caricaturado de forma a assemelhar-se a macacos, fazem ainda parte da realidade dos dias de hoje. A grande falha da H&M foram as pessoas que fazem parte da H&M. Para além de ignorarem um processo histórico e social com séculos de longevidade, desatenderam à questão do debate sobre a herança racial e, muito provavelmente, optaram por desconsiderar a sensibilidade e melindre sociais com os quais deveriam olhar para todas as questões.
A mãe do modelo não viu nenhum problema nesta imagem. O problema desta imagem, como de qualquer outra, é que transmite uma ideia. Esta ideia é errada. Menorizar esta questão ao ponto de não ser debatida é coadunar com a eternização da vergonhosa aceitação social do preconceito.
Pior do que perceber a frequência com a qual estes erros continuam a acontecer é perceber que não há ninguém durante o processo, numa máquina desta grandeza, que tenha levado as mãos à consciência. Infelizmente, como disse James Baldwin, “It is certain, in any case, that ignorance, allied with power, is the most ferocious enemy justice can have”.