Não é a epidemia de gripe que está a encher as urgências
Cerca de 100 mil pessoas foram às urgências num mês, diz a directora-geral da Saúde. Em duas semanas, morreram mais 600 pessoas do que o expectável, mas poucas directamente por causa da gripe.
Não é apenas a epidemia de gripe que explica a saturação dos serviços de urgência. A actividade gripal é agora de intensidade moderada e está estável. A directora-geral da Saúde, Graça Freitas, congratula-se até com o lhe parece ser uma “mudança cultural”: muita gente está a ligar para a linha Saúde 24 e a ir aos centros de saúde em vez de correr para as urgências hospitalares.
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Não é apenas a epidemia de gripe que explica a saturação dos serviços de urgência. A actividade gripal é agora de intensidade moderada e está estável. A directora-geral da Saúde, Graça Freitas, congratula-se até com o lhe parece ser uma “mudança cultural”: muita gente está a ligar para a linha Saúde 24 e a ir aos centros de saúde em vez de correr para as urgências hospitalares.
Graça Freitas avançou esta informação na conferência de imprensa em que, nesta quinta-feira, se fez o balanço da situação a nível nacional: cerca de 100 mil pessoas foram aos serviços de urgência nas últimas quatro semanas mas apenas 3% o fizeram “directamente por causa da gripe”.
A directora-geral da Saúde deu o exemplo do dia 7 de Janeiro, o último domingo, para sublinhar, com agrado, a tal “mudança cultural”: das 24 mil pessoas que procuraram apoio médico, 12 mil foram às urgências hospitalares, oito mil recorreram às consultas não programadas dos centros de saúde e quatro mil à linha Saúde 24. “Há uma redistribuição pelos diferentes níveis de resposta."
Isto foi possível porque, para fazer frente à epidemia de gripe e às baixas temperaturas, cerca de metade (215) dos centros de saúde passaram a funcionar em horário alargado. Houve também um reforço de camas nos hospitais (1250 camas extra), adiantou Ricardo Mestre, da Administração Central do Sistema de Saúde.
50,4 casos por 100 mil habitantes
Os últimos dados, divulgados nesta quinta-feira pelo Instituto Nacional de Saúde Doutor Ricardo Jorge (Insa), indicam que a situação está estável. A incidência de gripe situava-se na primeira semana de Janeiro nos 50,4 casos por cada 100 mil habitantes. Confirmou-se a tendência decrescente anunciada na semana anterior, com 69,6 casos por cada 100 mil habitantes.
A actividade gripal é moderada, à excepção da região do Alentejo, onde se mantém baixa. E Graça Freitas arrisca dizer que, se tudo continuar como até agora, a epidemia deste Inverno será menos intensa do que a do Inverno passado. O facto de ter estabilizado poderá indicar que o país já atingiu o pico, embora só se possa afirmar isso a partir do momento em que se observar uma descida consistente de casos. "Não sabemos como poderá evoluir [a epidemia] nas próximas duas a três semanas", disse ao PÚBLICO. O vírus do tipo B tem sido o predominante, por enquanto, foi detectado em 83% dos casos.
Apesar da intensidade moderada da epidemia de gripe, o número de mortes por todas as causas ficou acima do esperado na última semana de 2017 e na primeira deste ano. Graça Freitas especificou que morreram nestas duas semanas mais 600 pessoas do que o expectável, mas isto, sublinhou, acontece em linha com o que sucedeu noutros anos e até abaixo de igual período do ano passado. Em relação directa com a gripe terá havido "muito poucos casos de morte", afiançou.
Como se explica então este excesso de mortalidade? Nesta altura do ano, diz Graça Freitas, há mais vírus respiratórios a circular que provocam a descompensação de doenças crónicas, como diabetes e asma, entre muitas outras. "O frio obriga o nosso corpo a um esforço suplementar para manter a temperatura. E há dezenas de vírus a circular no Inverno que abrem a porta a infecções bacterianas. Os vírus não nos matam mas fragilizam-nos e basta ver que são pessoas com mais idade e muitas patologias que estão a morrer", explica.
O fenómeno do excesso de mortalidade não se está, aliás, a verificar apenas em Portugal, mas também em Itália e em Espanha, adiantou ao PÚBLICO o director do Insa, Fernando Almeida, referindo-se a dados do projecto europeu "EuroMOMO" (monitorização da mortalidade em geral).
De resto, este ano, o impacto na mortalidade em Portugal do frio, da gripe e de outros vírus em circulação até está a ser inferior, por enquanto, ao que aconteceu noutros Invernos. Na última época gripal (2016/2017), morreram 4467 pessoas acima do esperado, de acordo com o relatório anual do Programa Nacional de Vigilância da Gripe. Na anterior (2015/2016), tinham morrido 5591. Essa foi a época mais intensa dos últimos anos.
Graça Freitas admite que nalguns dias, especialmente a seguir ao Natal e ao fim-de-ano, se tenham verificado situações complicadas nalguns serviços de urgência. "Agora, o que não se pode é extrapolar e generalizar a todo o país e falar de caos", adverte.
Nas 23 unidades de cuidados intensivos que enviaram dados para o Insa havia 17 pessoas internadas, quase o dobro da semana anterior, em que foram admitidos nove doentes. Foi possível obter informação detalhada sobre 12 doentes: sete eram mulheres, nove contavam mais 65 ou mais anos de idade e oito tinham um diagnóstico de doença crónica subjacente. Ainda segundo o boletim, desde o início da época foram notificados 32 casos de gripe pelas Unidades de Cuidados Intensivos.