Aires Mateus desenharam para Toulouse a entrada de um museu que é a porta de um convento
Arquitectos portugueses ganham concurso para a extensão do Museu dos Agostinhos. E fizeram-no com um espaço “simples”, “sereno”, “reconhecível”. Obra deverá estar concluída no começo de 2020.
Os Aires Mateus não querem ser especialistas em coisa nenhuma, nem mesmo em museus e centros de criação (já os desenharam para Tours e Lausanne, por exemplo). Mas sempre que um dos seus projectos é escolhido por um organismo ligado à arte e à cultura, Francisco Aires Mateus fica “muito satisfeito”: “São espaços que se abrem à discussão e que geram sempre debates interessantes de ideias, sobretudo quando envolvem trabalhar com pré-existências, como é o caso.” Desta vez o caso é o do Museu dos Agostinhos, na cidade francesa de Toulouse, o último concurso internacional que os dois arquitectos portugueses – os irmãos Francisco e Manuel Aires Mateus (Prémio Pessoa 2017) – ganharam, em meados de Dezembro.
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Os Aires Mateus não querem ser especialistas em coisa nenhuma, nem mesmo em museus e centros de criação (já os desenharam para Tours e Lausanne, por exemplo). Mas sempre que um dos seus projectos é escolhido por um organismo ligado à arte e à cultura, Francisco Aires Mateus fica “muito satisfeito”: “São espaços que se abrem à discussão e que geram sempre debates interessantes de ideias, sobretudo quando envolvem trabalhar com pré-existências, como é o caso.” Desta vez o caso é o do Museu dos Agostinhos, na cidade francesa de Toulouse, o último concurso internacional que os dois arquitectos portugueses – os irmãos Francisco e Manuel Aires Mateus (Prémio Pessoa 2017) – ganharam, em meados de Dezembro.
Depois de concluída a obra, o que deverá acontecer até ao início de 2020, este museu francês de belas-artes, que reúne escultura e pintura desde a época medieval até ao século XIX, instalado num convento fundado no século XIV e que ao longo dos séculos foi sujeito a inúmeras intervenções, passará a ter uma nova entrada que na prática completa o claustro, peça central de todo o complexo.
“Este corpo que desenhámos, que é uma espécie de pedra de soleira que convida as pessoas a entrarem, é a peça que faltava para fechar o conjunto”, diz ao PÚBLICO Francisco Aires Mateus, garantindo que não havia, da parte do museu, qualquer pressão para que tal acontecesse. “Sabíamos que tínhamos de usar o espaço entalado entre os dois corpos do edifício, mas tínhamos alguma liberdade. Sabíamos também que o projecto devia criar um espaço de acolhimento para os visitantes, em que houvesse as valências habituais da entrada de um museu: a bilheteira, uma área para reunir grupos antes das visitas guiadas… E foi isso que fizemos.”
Nesta entrada, explica, cabe também uma pequena livraria, isto sem sacrificar um certo vazio que permite às pessoas deambularem, espreitando pelas aberturas que dão para o claustro e preparando-se para entrar num edifício que foi concebido para o silêncio e para a contemplação, mas que já não funciona como convento desde que foram extintas em França as ordens religiosas, no final do século XVIII.
“Outra coisa que tínhamos de resolver era o problema das acessibilidades”, diz o arquitecto, lembrando que o claustro desta antiga casa dos frades agostinhos está um metro e meio abaixo do nível da praça frente ao museu. Para compensar este desnível, os Aires Mateus criaram nesta entrada uma série de pendentes suaves, permitindo, mesmo a pessoas com problemas de mobilidade, aceder ao conjunto usando o percurso regular do visitante.
Uma cidade sem pedra
Este projecto de Toulouse, pequeno quando comparado com o que os Aires Mateus conceberam para outra cidade francesa, Tours — o Centro de Criação Contemporânea Olivier Debré, inaugurado em Março do ano passado —, não foi, apesar da óbvia diferença de escalas, menos desafiante. “Depositar esta pedra num conjunto que tem centenas de anos e que a história foi reconfigurando, com a responsabilidade de, através dela, criar uma outra relação entre a cidade e o museu foi muito estimulante.”
É precisamente da zona de Tours que vem a pedra escolhida — calcário branco de Tercé, o mesmo usado no Centro Olivier Debré — para criar este módulo de entrada, que acabou por ocupar, sem que isso fosse uma preocupação dos arquitectos, o espaço que antes pertenceu à Capela do Ecce Homo, destruída no contexto de uma reorganização urbana.
“A entrada é como uma pedra que pousámos ali e cujo interior esculpimos. O espaço que ali nascer será conquistado à pedra”, acrescenta Francisco Aires Mateus. E será de leitura simples: “Se hoje é construído como entrada, amanhã poderá ser outra coisa. Esta possibilidade é importante, porque estamos a trabalhar num edifício que tem uma leitura histórica longa. O que criámos não tem tempo. É simples, sereno. É uma forma arquetipal, reconhecível. As pessoas saberão que aquele é um espaço para usar, para viver.”
Na zona que conceberam para que se concentrem os que esperam uma visita guiada torna-se evidente o contraste entre a pedra de Tercé e o tijolo que cobre as paredes exteriores do antigo convento. A região de Toulouse, explica ainda o arquitecto português, não tem pedra e é por isso que, historicamente, os edifícios da cidade usam o tijolo: “Quando se passeia pela cidade, percebe-se logo que as paredes dos grandes edifícios são de tijolo, mas as entradas em pedra. Nós quisemos manter esse contraste.”