O elefante no meio da estrada
Uma história simples sobre uma crise de meia-idade com elefante à mistura, contada com simplicidade e graça por uma estreante de Singapura.
Depois de ver Pop Aye, primeira longa-metragem da singapurana Kirsten Tan, lembrámo-nos do road movie a passo de caracol que é a História Simples de David Lynch (1999). Em parte porque o caminho que vai de Bangkok a uma aldeiazinha rural tailandesa chamada Loei também é percorrido em câmara lenta, não porque é feito de tractor mas porque é feito com um elefante ao lado; em parte porque, tal como nesse filme (só aparentemente atípico do percurso) de Lynch, o que interessa é menos o destino e muito mais a viagem, e os encontros mais ou menos casuais a que ela leva.
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Depois de ver Pop Aye, primeira longa-metragem da singapurana Kirsten Tan, lembrámo-nos do road movie a passo de caracol que é a História Simples de David Lynch (1999). Em parte porque o caminho que vai de Bangkok a uma aldeiazinha rural tailandesa chamada Loei também é percorrido em câmara lenta, não porque é feito de tractor mas porque é feito com um elefante ao lado; em parte porque, tal como nesse filme (só aparentemente atípico do percurso) de Lynch, o que interessa é menos o destino e muito mais a viagem, e os encontros mais ou menos casuais a que ela leva.
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VIDEO_CENTRAL
Neste caso, a viagem é encetada por Thana, um arquitecto em crise da meia-idade que o acaso leva a encontrar nas ruas da metrópole Pop Aye, o elefante que, anos atrás, acompanhara a sua infância rural. O primeiro grande projecto que Thana construiu está à beira de ser demolido para dar lugar a novas construções mais modernas; os responsáveis mais jovens do seu gabinete de arquitectura querem atirá-lo para a prateleira; a sua própria esposa parece já não estar interessada nele. O reencontro com Pop Aye, que Thana prontamente compra ao seu actual proprietário, é um pretexto para o arquitecto reavaliar a sua vida on the road a caminho da terra natal, onde quer devolver o elefante que de lá saíra exactamente há tantos anos quanto ele.
Esta ideia de fazer o ponto da situação de uma vida, metaforizada através da coabitação com um dos mais majestosos animais selvagens, não é, certo, significativamente original. O que a ganha é a maneira delicada, tranquila, como Kirsten Tan a desenvolve, com toques de humor muito seco e um fino sentido da ironia cósmica a embalar gentilmente as peripécias de Thana e Pop Aye. É por aqui que nos lembrámos de Lynch, embora pudesse também não ser descabido irmos buscar Apichatpong Weerasethakul, o mais notado dos cineastas tailandeses da actualidade (até porque por aqui encontramos o seu montador habitual, Lee Chatametikool). Mas, mesmo que as referências sejam inevitáveis, será bom entrar em Pop Aye de cabeça mais aberta: é filme formalmente menos aventureiro, bem mais próximo do espectador médio, do que as comparações podem sugerir. E uma estreia que deixa vontade de ver o que Kirsten Tan fará a seguir.