Desemprego jovem cresce apesar da recuperação do mercado de trabalho

Formação desadequada às necessidades das empresas, retoma do emprego em sectores pouco qualificados ou as alterações às regras dos estágios ajudam a explicar que um quarto dos jovens portugueses continue desempregado.

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Profissões intermédias têm dificuldades em recrutar jovens ADRIANO MIRANDA

Portugal foi o país da União Europeia onde o desemprego jovem mais cresceu entre Setembro e Outubro do ano passado (de 24,6% para 25,6%), em contraciclo com a tendência de descida registada na maioria dos países. Ainda é cedo para dizer se esta tendência veio para ficar ou se estamos perante uma subida pontual — algo que o Instituto Nacional de Estatística (INE) ajudará a explicar com os dados mensais que serão divulgados nesta segunda-feira. Há, porém, um conjunto de factores que podem justificar que um terço dos jovens continue desempregado: a desadequação entre a formação e as necessidades das empresas, a retoma do emprego em sectores que não valorizam as qualificações mais elevadas ou a reformulação dos estágios apoiados pelo Estado.

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Portugal foi o país da União Europeia onde o desemprego jovem mais cresceu entre Setembro e Outubro do ano passado (de 24,6% para 25,6%), em contraciclo com a tendência de descida registada na maioria dos países. Ainda é cedo para dizer se esta tendência veio para ficar ou se estamos perante uma subida pontual — algo que o Instituto Nacional de Estatística (INE) ajudará a explicar com os dados mensais que serão divulgados nesta segunda-feira. Há, porém, um conjunto de factores que podem justificar que um terço dos jovens continue desempregado: a desadequação entre a formação e as necessidades das empresas, a retoma do emprego em sectores que não valorizam as qualificações mais elevadas ou a reformulação dos estágios apoiados pelo Estado.

Já no terceiro trimestre de 2017, contrastando com a redução da taxa de desemprego global e com a melhoria generalizada do mercado de trabalho, se tinha verificado um agravamento do desemprego na população jovem em comparação com o trimestre anterior, interrompendo a descida em cadeia verificada desde o arranque no ano.

O Governo não vê na evolução mais recente do desemprego jovem uma tendência consolidada, por considerar que na comparação homóloga este indicador continua a recuar. “Tenho alguma dificuldade em acompanhar a leitura de que o desemprego jovem esteja a evoluir em contraciclo com a evolução global do mercado de emprego”, diz ao PÚBLICO o secretário de Estado do Emprego, Miguel Cabrita. “Se olharmos para os últimos dois anos tínhamos uma taxa de desemprego jovem que estava acima dos 30% e no terceiro trimestre de 2017 tínhamos 24,2%, em linha com a evolução da taxa de desemprego global. Houve nalguns meses uma evolução em cadeia positiva, mas é normal que aconteça”, justifica.

Além disso, nota, com a redução do número de inactivos desencorajados, muitas pessoas poderão ter passado para o emprego e outras terão voltado a procurar trabalho, passando à categoria de desempregados no inquérito do INE, algo que poderá influenciar as estatísticas. Miguel Cabrita não nega, porém, que a taxa de desemprego jovem “ainda é elevada” e “uma preocupação”.

Já o economista João Cerejeira atribui alguma relevância à subida recente em contraciclo com a melhoria generalizada do mercado de trabalho. “Continuamos a ter uma taxa muito elevada de desemprego jovem e inverteu-se a tendência de descida deste agregado. Nesse sentido é preocupante”, alerta.

E adianta algumas hipóteses para o que está a acontecer: "Há que destrinçar se esta evolução tem mais a ver com a estrutura da economia, ou se decorre de outros factores como a alteração das regras dos estágios profissionais em meados de 2017".

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Formação desadequada

A adequação entre a formação que é dada aos jovens e as necessidades das empresas é, para João Cerejeira, outro aspecto relevante que pode explicar parte da “não descida do desemprego jovem”.

Esse problema é, segundo o economista, muito visível na indústria transformadora que, a par da restauração e do turismo, está entre os sectores que mais têm criado emprego. “Só não está a criar mais, porque não tem encontrado na oferta de trabalho jovem o perfil adequado para as funções de que precisa”, nota.

Vários factores contribuem para esta dificuldade – que não é exclusiva da indústria. Por um lado, frisa o investigador da Universidade do Minho, “é bastante difícil fazer a adequação entre a formação profissional e as necessidades das empresas porque há problemas de escala”, obrigando a abrir cursos para 20 cozinheiros, por exemplo, quando as empresas de determinada região só necessitariam de dez, mas depois precisam ainda de cinco torneiros mecânicos e de cinco electricistas.

Por outro lado, a formação profissional feita nas escolas de ensino regular não dá resposta à procura das empresas que está a crescer mais.

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Finalmente, a disponibilidade de mão-de-obra para determinadas actividades tem a ver com a própria escolha dos jovens. E, actualmente, “olhar para o trabalho na indústria é um pouco como as gerações anteriores olhavam para o trabalho na agricultura”, destaca o investigador.

O secretário de Estado do Emprego alerta que no sector industrial, “mais dependente de uma geração de trabalhadores formados nas antigas escolas industriais” é preciso garantir que a renovação geracional não leve a um esvaziamento de competências.  Enquanto noutros sectores, em particular quando se trata de empresas com práticas de trabalho inovadoras, há efectiva escassez.

Retoma pouco qualificada

José Reis, economista e investigador do Centro de Estudos Sociais, concorda que há alguma desadequação, mas alerta que é preciso olhar para outros factores, em particular a qualidade do emprego disponível e a crescente terciarização da economia.

“Ainda esta semana ouvimos a restauração e o alojamento queixar-se de que faltam 40 mil trabalhadores. A pergunta seguinte devia ser: que salários e que emprego se está a oferecer e, infelizmente, sabemos a resposta sem grande margem de erro. São sectores que oferecem salários baixos e precariedade”, destaca.

É certo que o mercado de trabalho tem registado melhorias assinaláveis, “mas temos um problema persistente relacionado com o sistema de emprego pouco qualificado e precário”. E essa questão está, para o economista da Universidade de Coimbra, relacionada com os sectores que mais têm criado emprego e “que não são os mais tranquilizadores” do ponto das qualificações. E isso, reforça, “tem um impacto específico nos jovens”.

O facto de o desemprego jovem continuar elevado não significa que os mais novos estejam a ficar à margem da recuperação do emprego. Pelo contrário, tanto em termos homólogos como em cadeia, o emprego da população dos 15 aos 24 anos aumentou. Só do segundo para o terceiro trimestre registou-se uma subida de 16 mil novos postos de trabalho. A questão a que se refere José Reis prende-se com o tipo de emprego que está a ser criado e que, de acordo com os registos nos fundos de compensação do trabalho (uma maneira fiável de avaliar o novo emprego) apontam para trabalhos precários.

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Estágios e confiança na escola

O economista João Cerejeira também não descarta que as mudanças no programa de estágios apoiados pelo Estado, em vigor desde meados de 2017, tornaram esta medida mais selectiva e reduziram o número de abrangidos.

“A diminuição dos estágios concedidos fez com que o preço relativo de contratar um jovem tenha aumentado mais do que o dos outros grupos. É natural que tenha havido uma recomposição no perfil das contratações”, destaca.

O secretário de Estado do Emprego descarta essa hipótese: “Terminámos 2016 com cerca de 46 mil estágios aprovados e vamos terminar 2017 com 43 mil estágios”. Este são os dados mais recentes que diferem de forma significativa dos disponíveis no site do Instituto do Emprego e Formação Profissional que dão conta de uma redução de 7600 estágios entre Outubro de 2016 e de 2017.

Além dos apoios públicos, há outra questão que João Cerejeira destaca como preocupante, que é o aumento do abandono escolar. Mas por que razão os jovens não concluem o secundário? Podia haver uma razão “positiva”, responde o economista, “como o mercado de trabalho está a recuperar e como há mais oportunidades de emprego as pessoas deixam de estudar e vão trabalhar”. Isso não parecer estar a acontecer e “há claramente uma dificuldade de o sistema de ensino mostrar que tem valor”.