No Tinder somos “reservados” e de poucas palavras, diz estudo
Investigação de Rita Sepúlveda debruçou-se sobre os padrões visuais e textuais dos perfis dos portugueses no Tinder. Diferenças entre homens e mulheres não são muitas, mas existem. Eles completam mais o perfil com texto
Não é que seja cultura geral, mas o Tinder — a aplicação de online dating lançada em 2012 — já não é um vocábulo estranho para quem se deixa apanhar pela cola que parece existir nos ecrãs dos smartphones. A dinâmica da aplicação é simples: há um catálogo de caras a deslizar, literalmente, pelo ecrã. O dedo foge para a esquerda caso não exista interesse; caso contrário, segue para a direita. Caso a outra parte também esteja interessada, aí sim, começa a conversa. Há quem se empenhe na construção do melhor perfil possível e os portugueses também têm as suas técnicas: preferem publicar fotos "em que estejam sozinhos", especialmente ao pé de monumentos conhecidos. Mas se alguns portugueses escolhem mostrar a Torre Eiffel como pano de fundo, também há outros que encontram nas memórias colectivas de saídas nocturnas um bom cartão de visita fotográfico. Esta é uma das conclusões do artigo A auto-apresentação dos portugueses na plataforma de online dating Tinder, da investigadora Rita Sepúlveda.
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Não é que seja cultura geral, mas o Tinder — a aplicação de online dating lançada em 2012 — já não é um vocábulo estranho para quem se deixa apanhar pela cola que parece existir nos ecrãs dos smartphones. A dinâmica da aplicação é simples: há um catálogo de caras a deslizar, literalmente, pelo ecrã. O dedo foge para a esquerda caso não exista interesse; caso contrário, segue para a direita. Caso a outra parte também esteja interessada, aí sim, começa a conversa. Há quem se empenhe na construção do melhor perfil possível e os portugueses também têm as suas técnicas: preferem publicar fotos "em que estejam sozinhos", especialmente ao pé de monumentos conhecidos. Mas se alguns portugueses escolhem mostrar a Torre Eiffel como pano de fundo, também há outros que encontram nas memórias colectivas de saídas nocturnas um bom cartão de visita fotográfico. Esta é uma das conclusões do artigo A auto-apresentação dos portugueses na plataforma de online dating Tinder, da investigadora Rita Sepúlveda.
Se a primeira parte do trabalho já está disponível no Obercom, as outras duas estão em fase de preparação: falta ainda estudar "as motivações" e "as práticas de consumo" dos portugueses no Tinder. A investigação trabalha a "análise dos online daters portugueses" e pretende criar informação relativa ao tema no seio das Ciências da Comunicação. Se, por cá, a investigação é "quase inexistente", nos Estados Unidos e na Inglaterra a realidade é bem diferente. "É nesses países que se tem feito a maior parte da investigação sobre online dating", aponta a autora do artigo, escrito em colaboração com o orientador do ISCTE Jorge Vieira.
O estudo apresenta as informações recolhidas dos 200 perfis analisados e de dez entrevistas — ambas as técnicas com igual representatividade dos sexos masculino e feminino. Para tal, foi criado um “perfil do investigador” na aplicação de dating, localizado em Lisboa e com 34 anos. Vamos a mais conclusões?
Há diferenças entre géneros, mas “muito ténues”
A aplicação permite que cada perfil exiba o máximo de seis fotografias, mas a análise mostra que os portugueses carregam, em média, quatro. Não é que sejam mais tímidos do que os restantes utilizadores do Tinder espalhados pelo mundo, já que o mais comum é verem-se as caras em primeiro plano. Para além disso, encontram-se sozinhos em 68% das fotografias. Há, claro, quem carregue imagens onde se encontre acompanhado, principalmente em grupo ou com indivíduos do sexo oposto, muitas vezes em “práticas hedonistas”. E se o Tinder é para conhecer pessoas e para se dar a conhecer, também há utilizadores que mostram partes importantes da sua vida nas fotografias partilhadas, como os animais — ou até mesmo crianças.
A investigadora refere que existem “cinco grandes temas” em que podemos agrupar as diferentes fotografias desta investigação: “viagem de turismo, práticas culturais, universo desportivo, consumos latos e esfera material”. Numa procura pela “legitimação da importância das suas vivências”, grande parte da amostra exibe fotografias de viagens. Por isso, Rita considera não existirem “diferenças significativas” entre o sexo feminino e o sexo masculino. “Havendo, são muito ténues”, complementa.
No entanto, dentro das mesmas, encontram-se padrões: os homens partilham “mais fotos do universo desportivo, a jogar ou a assistir, e da esfera material”, que engloba, por exemplo, carros. Já as mulheres preferem partilhar imagens de “consumos latos ou de bem-estar, como spas ou outros cuidados com o corpo”. No Tinder, é possível partilhar o perfil do Instagram, mas apenas 9% da amostra estudada mostrou mais fotografias para lá das presentes na aplicação. Noutros meandros, a partilha dos artistas mais ouvidos no Spotify só se observou em 3,5% dos perfis.
Reservados nas fotos e no texto
E fotos atrevidas, há? “Nem por isso, os portugueses são mais reservados”, diz a investigadora do ISCTE, acrescentando que “as fotos comedidas” estão em maior número porque o log in no Tinder só é possível se associarmos a conta do Facebook à aplicação. A exposição do corpo acontece em quase 10% dos perfis analisados. Como se pode ler no artigo publicado no Obercom, “o ‘peito’ é a zona corporal que mais apareceu, com 31,3%, seguindo-se fotografias em bikini, 18,8%, e em calções de banho, 14,1%”. Contudo, Rita salienta que essas fotografias se “justificam pela sazonalidade e pelo contexto”. A maior parte dos perfis tem fotos identificáveis (86%), sendo que, dentro da restante percentagem, 8% dos perfis — valor percentual comum aos dois géneros — não tem qualquer fotografia do utilizador, que prefere o anonimato.
Dos 200 perfis analisados, apenas 87 complementavam as imagens com texto. Num bloco que tem o limite de 500 caracteres, os utilizadores portugueses preferem escrever sobre “o seu estilo de vida, a sua personalidade e os gostos pessoais”, para além da “postura na aplicação e o que se espera do outro”. Neste parâmetro, as conclusões apontam que 64,5% dos perfis com texto são de homens. Para além disso, “muitos dos textos estavam escritos em português e em inglês por causa da zona onde reside a amostra”, já que a investigação se deu em Lisboa, e porque o perímetro máximo estabelecido ficou nos dez quilómetros. O Tinder funciona por geolocalização, determinando-se uma distância, que também filtra os resultados.
Quanto à idade, a investigadora refere o facto de a aplicação estabelecer um algoritmo que condiciona a filtragem; ou seja, ainda que se tenha estabelecido o intervalo de idades entre os 18 e “os mais de 50 anos” para o perfil criado para o efeito, “a maior parte dos utilizadores que apareciam tinham 34 ou 35 anos”. “Por isso”, explica, “não seria correcto tirar ilações relativamente à idade”.
Não é que esta investigação desvende segredos, mas há mais para desfiar dos comportamentos lusitanos no mundo do online dating: a tese de doutoramento de Rita Sepúlveda abordará ainda “a motivação para a utilização do Tinder” e “as práticas e consumos dos portugueses na aplicação, numa vertente quantitativa”. Aí saberemos qual o horário mais propício para a utilização do Tinder em Portugal: se logo pela manhã, num swipe left/right de olhos semi-cerrados, ou se pela noite, no deslizar dos copos. À tarde também vale — e as pausas no trabalho são para alguma coisa, não é?