Tabelas de retenção deixam para 2019 maiores reembolsos de IRS
Simulações da consultora PwC mostram que há casos em que as novas tabelas de retenção a aplicar ao longo de 2018 só reflectem uma parte da descida do imposto. Outra parte só chega no momento do acerto do IRS.
Quando os contribuintes portugueses entregarem a declaração do IRS de 2018 na Primavera de 2019 e o fisco fizer os acertos do imposto, haverá cidadãos que vão receber uma nota de cobrança, haverá quem tenha direito a um reembolso e quem não tenha nada a receber nem a pagar. É assim todos os anos e assim será, em função do imposto efectivamente a pagar.
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Quando os contribuintes portugueses entregarem a declaração do IRS de 2018 na Primavera de 2019 e o fisco fizer os acertos do imposto, haverá cidadãos que vão receber uma nota de cobrança, haverá quem tenha direito a um reembolso e quem não tenha nada a receber nem a pagar. É assim todos os anos e assim será, em função do imposto efectivamente a pagar.
Há, porém, uma tendência que se antecipa tendo em conta as tabelas de retenção publicadas em Diário da República: para 2019 esperam-se reembolsos de IRS mais altos do que os valores a pagar este ano, antecipa a consultora PwC a partir de simulações elaboradas para o PÚBLICO. Uma conclusão projectada tendo em conta que nem toda a redução anual do imposto aparece reflectida nas taxas de retenção na fonte aprovadas pelo Governo.
O desajustamento entre as tabelas de retenção – um instrumento com que os sucessivos governos procuram prever o imposto anual a pagar e traduzir essa projecção nos valores a descontar mensalmente nos salários e nas pensões – tem-se colocado ao longo de vários anos.
A publicação das tabelas aconteceu mais cedo do que o habitual e deverá permitir fazer o processamento dos rendimentos em Janeiro já com base nas taxas actualizadas, que reflectem um desagravamento fiscal para a generalidade dos contribuintes. Nas situações em que o salário já foi processado, as empresas e as outras entidades pagadoras têm de fazer o acerto até ao final de Fevereiro.
As novas tabelas confirmam que o valor dos salários e pensões a partir do qual começa a retenção do IRS será mais alto – reflectindo a subida do mínimo de isenção –, deixando de fora dos descontos mais contribuintes. No entanto, ainda continuará a haver trabalhadores dependentes que, sendo abrangidos por esta regra, ainda vão estar sujeitos à retenção na fonte, fazendo um acerto em 2019.
Se em 2017 o IRS começava a ser retido para quem ganhava a partir de 615 euros brutos por mês, agora, o imposto começa a ser descontado para quem tem um vencimento mensal igual ou superior a 632 euros (se for solteiro ou casado, numa situação familiar em que os dois membros do casal auferem rendimentos; se a pessoa for casada mas só um dos cônjuges tiver rendimentos esse limiar começa nos 641 euros).
O Governo já fizera saber, quando em Outubro apresentou o Orçamento do Estado, que o alívio no IRS – de 385 milhões de euros – iria ter um impacto orçamental a dois tempos: em 2018 espera-se uma perda de receita de 230 milhões nos cofres do Estado, em 2019, um impacto de 155 milhões, ou seja, 40% do total.
Agora, as tabelas de retenção permitem mensurar alguns desses impactos. E o que se conclui a partir das várias simulações realizadas? Ana Duarte, fiscalista da consultora PwC, adianta que só “parte da redução do imposto anual se encontra reflectida na redução das taxas de retenção na fonte mensal”, porque a previsão do valor do reembolso anual do imposto de 2018 (a receber em 2019) “aumenta face ao ano de 2017” (a receber neste ano de 2018). O que quer isso dizer, afinal? Se a totalidade da redução de imposto anual estivesse reflectida na descida das taxas de retenção “o valor do reembolso a emitir via nota de liquidação de IRS deveria manter-se face a 2017”, porque essa poupança fazia sentir-se logo na retenção, o que não acontece nos exemplos da PwC.
Variáveis
Olhemos para três casos, para se perceber como se prevê que os reembolsos de IRS serão mais altos em 2019. Veja-se o exemplo de um contribuinte solteiro e sem filhos que recebe por mês mil euros brutos (14 mil euros anuais). Este ano, vai reter menos IRS do que acontecia até aqui. A taxa mensal será mais baixa, de 11,9%, contra os 12,5% do ano passado. Assim, se em 2017 chegava ao fim do ano com as retenções na fonte a totalizarem 1750 euros, em 2018 descontará 1666 euros, ou seja, menos 84 euros. Assumindo que apresenta em cada um dos anos o mesmo valor das deduções (250 euros nas despesas gerais familiares, sem quaisquer outras despesas adicionais), o IRS relativo a 2017 depois de calculadas as deduções era de 1577 euros e o deste ano passa a ser de 1423 euros, o que significa que o rendimento líquido anual será mais alto em cerca de 155 euros. O valor retido em 2018 baixa porque há um alívio do imposto, mas não tanto quanto seria esperado, já que se prevê que, mais à frente, o valor dos reembolsos a pagar em 2019 seja de 242,65 euros, quando no ano anterior e na mesma situação seriam devolvidos 172,38 euros.
Se se aplicar a mesma situação para quem ganha 1500 euros por mês constata-se igualmente que o valor das retenções na fonte desce e que o valor do reembolso também cresce (passa de 312,38 euros para 405,87). No caso de contribuinte com um salário mensal de 2000 euros, repete-se o mesmo cenário: faz um desconto mensal mais baixo e deverá ter um reembolso maior (passa de 703,4 euros para 806,6).
Questionado se as novas tabelas reflectem na totalidade as alterações no IRS, o secretário de Estado dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, respondeu ao PÚBLICO que as tabelas “reflectem o impacto que se encontra previsto no Orçamento do Estado para 2018”. Foram construídas, diz, “tendo em conta um conjunto diverso de variáveis, tendo em consideração as alterações ao mínimo de existência da categoria A [trabalhadores dependente] e H [pensionistas] e aos escalões”, que passam de cinco para sete.
Há uma parte dos impactos que teriam de acontecer sempre em 2019, desde logo o impacto do alargamento das regras do mínimo de existência aos trabalhadores a recibos verdes. Mas é preciso ter presente que a esmagadora maioria dos rendimentos brutos em Portugal vêm de salários de trabalhadores dependentes e de pensões – as duas categorias representam cerca de 90% dos rendimentos brutos no país.
O alívio fiscal de 385 milhões de euros, sustenta Mendonça Mendes, “respeita a todas as categorias de rendimentos do IRS, correspondendo as tabelas de retenção na fonte apenas às categorias A e H (que, sendo as mais expressivas, não são as únicas)”.
As tabelas são um mecanismo que define quanto é que os contribuintes devem descontar de IRS mensalmente quando recebem o salário ou a pensão, antecipando ao fisco o pagamento do imposto. As taxas variam em função da situação familiar e do nível de rendimento, tendo em conta se a pessoa é casada ou solteira, tendo em conta o número de filhos, se o cidadão é um trabalhador dependente ou pensionista, se sendo casado só um ou os dois dos elementos do auferem rendimentos, por exemplo. O que conta verdadeiramente é o imposto a aplicar sobre o rendimento colectável de todo o ano, sobre o qual incidem as taxas das tabelas do IRS.