Ana Luísa aguarda há nove meses por uma casa do IHRU
Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana diz que pedido será tido em conta quando houver T0 ou T1 disponível na sua zona
Ana Luísa marcou encontro numa pastelaria próxima da pensão que lhe serve da morada, na Rua Coelho Neto, conhecida no Porto pelo comércio de sexo. Aparece com um pijama por baixo do casacão, os cabelos desalinhados, os olhos encovados. Pede desculpa. “Tenho pouca roupa. Tem chovido...”
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Ana Luísa marcou encontro numa pastelaria próxima da pensão que lhe serve da morada, na Rua Coelho Neto, conhecida no Porto pelo comércio de sexo. Aparece com um pijama por baixo do casacão, os cabelos desalinhados, os olhos encovados. Pede desculpa. “Tenho pouca roupa. Tem chovido...”
No dia 3 de Maio, escreveu uma carta ao ministro do Ambiente, Matos Fernandes, a dizer que fizera um pedido ao Instituto da Habitação e da Reabilitação Urbana (IHRU) e nem sabia se fora aceite. O ministério reencaminhou a carta para o IHRU, que lhe respondeu, no dia 2 de Junho, que o pedido seria tido em conta quando houvesse um T0 ou um T1 reabilitado no Porto ou em Gaia. O ano chegou ao fim e nada.
Casou-se em 2015. Traz a data tatuada num braço. Juntou-se ao marido num anexo da avó dele, numa “ilha”, uma fileira de casas minúsculas. Num instante, “ele ficou avariado da cabeça”. E Ana Luísa nem se podia queixar à mãe. Ela nunca gostou dele. O homem tinha um historial de crime e drogas e os pais dele viviam numa bebedeira permanente. Volta e meia, batia na mãe.
Fugiu em 2016. Esteve na resposta de emergência da Santa Casa da Misericórdia de Santo Tirso. Não conseguia deixar de pensar na cadela. “Ele ameaçava matá-la.” Tornou a casa. “Consegui tirar o bicho de lá e mandá-lo para a minha mãe.” Tornou a fugir. Desta vez, foi para o acolhimento de emergência gerido pelo Núcleo de Matosinhos da Cruz Vermelha Portuguesa.
Sentia-se um farrapo. “Levar porrada dia e noite não é fácil. O nosso psicológico não fica muito bem, não é?” Além de lhe prestar apoio psicológico e emocional, a equipa tratou de lhe requerer o rendimento social de inserção (RSI). Em Janeiro de 2017 foi transferida para a casa-abrigo gerida pela Santa Casa da Misericórdia do Porto. E foi de lá que saiu, a 30 de Março, para aquela pensão.
Os 183 euros que recebe de RSI nem chegam para a mulher, de 36 anos, pagar o quarto. Faz umas limpezas numa casa particular. “Às vezes, a senhora da pensão dá-me comer. Se ela tiver roupa, eu estendo, dobro. Também passo a ferro, se ela precisar.”
Com o 6.º ano de escolaridade e uma saúde frágil, não tem expectativa de bom rendimento. Já se meteu em apuros. Acha que se tivesse um sítio para morar, com uma renda compatível com o que ganha, podia organizar-se.
Quando se lhe pergunta porque saiu da casa-abrigo se ainda não tinha casa nem trabalho, responde: “Eles deram-me um tempo limite, porque ele tinha sido preso em Dezembro [de 2016] e eu já não corria perigo.”
A equipa da Santa Casa garante que ela é que quis sair: “Rapidamente iniciou um trabalho, a 03/02/2017, e procurou um alojamento para viver, pois, segundo a própria, facilitaria, dada a proximidade do trabalho encontrado. Mesmo assim, a 17/03/2017 apresentámos candidatura ao IHRU, procurando agilizar o processo de arrendamento de uma habitação.” Está desorientada.