Dança: o melhor do ano

Escolhas de Alexandra Balona e Luísa Roubaud.

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A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

10

Captado pela Intuição

De Tânia Carvalho

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Centro Cultural Vila Flor, Guimarães / GUIdance (4/02); Teatro Aveirense, Aveiro (10/02)

Tânia Carvalho delimita, com uma luminosidade de contornos cinematográficos, o seu território de desenho coreográfico a rosto, torso e membros superiores. Um figurino negro enraíza-a, imóvel no centro do palco, onde se faz acompanhar por uma sonoplastia minimal hipnótica, compondo um solo de uma beleza tão subtil quanto grandiosa. A.B.

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Brother

De Marco da Silva Ferreira

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Teatro Municipal Rivoli, Porto (21/01); São Luiz Teatro Municipal, Lisboa (24 e 25/03); Escola Secundária de Montemor-o-Novo / Plataforma Portuguesa de Artes Performativas (9/06)

Numa altura em que a presença do hip-hop na cena contemporânea já deixou de ser novidade, Marco da Silva Ferreira reuniu intérpretes com formação heterogénea e desenvolveu uma peculiaríssima estética de difícil classificação para voltar a falar-nos do ideário fraterno na raiz daquele movimento. Um percurso muito bem-sucedido, cá e lá fora, a seguir com atenção.  L.R.

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O Poço

De Jonathan Uliel Saldanha

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Teatro Municipal Rivoli, Porto / Festival DDD (12 e 13/05)

Uma performance assinalável pela sua singularidade: um fosso arquitectónico-acústico que induz o espectador perante o abismo económico-político e geo-territorial do presente, propondo uma auscultação do inconsciente sonoro da Terra. O resultado é um evento com momentos tão extáticos como sombrios. A.B.

7

Celui qui Tombe

De Yoann Bourgeois

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Coliseu do Porto / Festival DDD (13/05); São Luiz Teatro Municipal, Lisboa / FIMFA (21/05)

O frisson da acrobacia e da superação do espectáculo circense, recriados enquanto fábula de uma humanidade desamparada que, apesar de condenada, se obstina no gesto solidário e na luta pela sobrevivência. Num empolgante sincretismo entre circo tradicional, dança e teatro físico, a peça de Yoann Bourgeois constrói patamares de fruição acessíveis a gerações e públicos distintos. L.R.

6

The Concept of Dust: Continuous Project — Altered Annually

De Yvonne Rainer

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Fundação de Serralves, Porto (17/12)

Figura incontornável da história da arte do século XX, Yvonne Rainer permanece como o gesto vivo de independência e ousadia que lhe associamos. The Concept of Dust, a sua estreia como performer em Portugal, é uma dança tão democrática pelos seus processos de participação coreográfica quanto inflamada no seu discurso incisivo sobre a situação política, social e ecológica contemporânea. Um marco na timeline da dança em Portugal! A.B.

5

Dido e Eneias

A partir de Henry Purcell; Companhia Nacional de Bailado; António Cabrita e São Castro (coreografia)

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Teatro Camões, Lisboa (12 a 22/10)

Esta revisitação da icónica obra barroca de Henry Purcell teve a sabedoria de inventar uma dança que pulsa com ela sem se lhe sobrepor, e de a catapultar para a contemporaneidade. E soube recolocar o intimismo que marca o trabalho da dupla de criadores à escala do numeroso elenco da CNB. L.R.

4

Bacantes — Prelúdio para uma purga

A partir de Eurípides; Marlene Monteiro Freitas (coreografia)

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Teatro D. Maria II, Lisboa (20 a 30/04); Teatro Municipal Rivoli, Porto / FITEI (17/06)

Marlene Monteiro Freitas voltou a marcar a paisagem performativa com esta leitura coreográfica da tragédia homónima de Eurípides cuja força reside no rasto de inquietação deixado à sua passagem. Intensa e excessiva, a peça reitera-se como uma montagem heterogénea que escapa à linearidade da tragédia e da razão. A.B.

3

Pão Rico

De Vera Mantero

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Cineteatro Louletano, Loulé (29/04); Culturgest, Lisboa (26 e 27/05)

Sensibilidade, bom humor e uma dramaturgia certeira são a âncora desta divagação sobre a febre do dinheiro e da areia que assolou o litoral algarvio. Vera Mantero leva-nos num périplo por uma região a viver a vários tempos, onde ecoa todo este Portugal que assiste, atónito, a uma explosão turística sem precedentes. L.R.

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Antropocenas

De João dos Santos Martins e Rita Natálio

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Centro Cultural do Cartaxo / Festival Materiais Diversos (22/09); Centro Cultural Vila Flor, Guimarães (20/10); São Luiz Teatro Municipal, Lisboa / Temps d’Images (27 a 29/10)

Cenas humanas ma non troppo numa coreografia expandida que articula dança, performance, conferência, artes visuais, antropologia, música, plantas, pedras, plásticos, microalgas... Corrompem-se discursos antropocêntricos exauridos, e convoca-se não só a crise climática como cosmologias ameríndias, etnologias multi-espécie, racismo e o capitalismo que persiste na sua espiral melancólica e mórbida... Uma palestra dançada e especulativa das fronteiras entre humano e não humano, animado e inanimado, uma ode à natureza, mãe, amante, violada, doente. A.B.

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Terça-feira: tudo o que é sólido dissolve-se no ar

De Cláudia Dias

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Teatro Maria Matos, Lisboa (1/04); Cine-Teatro Constantino Nery, Matosinhos / Festival DDD (29/04); Armazém 5, Montemor-o-Novo / Plataforma Portuguesa de Artes Performativas (7/06); Teatro Virgínia, Torres Novas (5/11); Teatro Municipal Joaquim Benite, Almada (8/11)

Entre a performance e o filme de animação, o registo documental e a ficção, a peça de Cláudia Dias e do clown italiano Luca Bellezze, segundo capítulo do projecto Sete Anos, Sete Peças (iniciado em 2016 com Segunda-feira, atenção à direita), é um soberbo gesto de denúncia do êxodo dos refugiados, rigorosamente enquadrado na história dos conflitos no Médio Oriente. Um sóbrio underacting e uma dramaturgia minuciosa sustentam este depoimento político veemente, humanizado pela visão de Omar, criança síria efabulada, cujo olhar perplexo sobre o mundo carrega o peso de toda uma trajectória colectiva. Longe do planfletarismo ou de generalizações vulgarizadoras, são a alusão subtil e as poéticas do corpo a conduzir-nos até questões que as palavras não conseguem formular. Numa época de incerteza ideológica e de pragmatismo materialista, Cláudia Dias insiste numa dança de causas e na crítica ao capitalismo; e em processos de criação dilatados, também eles acto de resistência à vertigem trituradora dos circuitos de produção dos tempos que correm. L.R.