Conselho Superior da Magistratura não viu motivo para queixa

Mulher que se queixa de violência doméstica diz que testemunhar em tribunal, por si só, é difícil. E sentiu-se humilhada pelo juiz

O Conselho Superior da Magistratura já recebeu uma participação por “falta de isenção e imparcialidade” referente ao processo de violência doméstica julgado pelo Tribunal Judicial de Viseu. Aquela estrutura não encontrou motivo para instaurar um processo disciplinar ao juiz Carlos de Oliveira.

A verdade faz-nos mais fortes

Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.

O Conselho Superior da Magistratura já recebeu uma participação por “falta de isenção e imparcialidade” referente ao processo de violência doméstica julgado pelo Tribunal Judicial de Viseu. Aquela estrutura não encontrou motivo para instaurar um processo disciplinar ao juiz Carlos de Oliveira.

Susana, a mulher de 38 anos que acusa o homem com quem foi casada de a ter maltratado ao longo de seis anos, não se conforma com a sentença proferida a 3 de Outubro de 2017 a absolvê-lo do crime de violência doméstica. “Não acho que o julgamento tenha sido imparcial”, diz. “Parecia que o juiz era a defesa do meu ex-marido”, refere.

O juiz pegou no facto de ser autónoma, ter um salário, não ter filhos para questionar a veracidade da sua acusação. “Ele perguntou-me por que nunca tirei fotografias às lesões. Eu expliquei-lhe que não podia. O meu ex-marido controlava o meu telemóvel”, diz. “Ele perguntou-me porque nunca saí de casa, porque nunca contei. E eu expliquei-lhe que o amava, que queria salvar o meu casamento, que tinha vergonha, que tinha medo.”

Ficou provado que o ex-marido tinha uma caçadeira e uma arma de pressão de ar, embora não tivesse licença. “Eu dormia com uma caçadeira debaixo do colchão”, diz. “Uma vez tentei fugir e ele apontou-me a caçadeira, dizendo: “Só sais num caixão ou em quatro tábuas.” 

Afirma que viveu o julgamento como segunda vitimação. “Já é tão difícil estar ali a falar de coisas tão íntimas, a reviver aquilo tudo…”, comenta, numa alusão a injúrias, ameaças, empurrões, puxadelas de cabelo, pontapés que diz ter sofrido. “E sou humilhada ao ponto do juiz dizer que tenho jogo de cintura.” 

Não foi possível ainda ouvir o magistrado. Contactado pelo PÚBLICO, lembrou que está sujeito ao dever de reserva e informou que iria questionar o Conselho Superior da Magistratura sobre como proceder.

O Conselho Superior da Magistratura só se pronuncia sobre gestão e disciplina de magistrados, não sobre o sentido das decisões judiciais. Isso cabe aos tribunais superiores. Susana recorreu da decisão ao Tribunal da Relação de Coimbra – o Ministério Público também. “Decidi recorrer para que haja dignidade, respeito”, explicou. “Vou continuar a lutar pela verdade”, enfatiza. “Se for preciso, vou ao Tribunal Europeu dos Direitos Humanos.”

Diz que não se sente segura. Nem sabe quando se sentirá segura. “Ainda tenho pesadelos à noite. E de dia tenho medo. Estou a dois mil e tal quilómetros, mas se vir uma pessoa parecida com ele tenho medo.”