Unionistas irlandeses dinamitam acordo entre Londres e Bruxelas

Solução para o problema da fronteira entre as duas Irlandas considerado inaceitável pelo DUP. May regressa esta semana a Bruxelas, mas o tempo é cada vez mais escasso para conseguir "luz verde" na cimeira europeia.

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O Partido Democrático Unionista (DUP) mostrou nesta segunda-feira o poder que dez deputados têm sobre um governo minoritário e confrontado com uma das mais complexas negociações de que há memória. Quando todos em Bruxelas esperavam que a primeira-ministra britânica e o presidente da Comissão Europeia anunciassem que havia já entendimento suficiente para permitir o início da próxima fase das negociações do “Brexit”, os unionistas da Irlanda do Norte accionaram o travão que impediu Theresa May de fazer uma última cedência, obrigando as duas partes a uma corrida contra o tempo para garantir que a cimeira europeia da próxima semana não termina num novo impasse.

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O Partido Democrático Unionista (DUP) mostrou nesta segunda-feira o poder que dez deputados têm sobre um governo minoritário e confrontado com uma das mais complexas negociações de que há memória. Quando todos em Bruxelas esperavam que a primeira-ministra britânica e o presidente da Comissão Europeia anunciassem que havia já entendimento suficiente para permitir o início da próxima fase das negociações do “Brexit”, os unionistas da Irlanda do Norte accionaram o travão que impediu Theresa May de fazer uma última cedência, obrigando as duas partes a uma corrida contra o tempo para garantir que a cimeira europeia da próxima semana não termina num novo impasse.

“Começa a ser muito apertado, mas um acordo na cimeira de Dezembro ainda é possível”, escreveu na sua conta de Twitter o presidente do Conselho Europeu, Donald Tusk, o mesmo que tinha dado a May até esta segunda-feira para apresentar propostas capazes de convencer os restantes 27 Estados-membros de que nos últimos seis meses foram feitos “progressos suficientes” nos três dossiers essenciais das negociações sobre os termos da saída britânica da União Europeia.

E depois de, na semana passada, o Governo britânico ter indicado que está disposto a liquidar uma fatia maior dos compromissos financeiros que assumiu enquanto Estado-membro, as atenções estavam totalmente concentradas na questão da fronteira entre as duas Irlandas – uma linha quase invisível desde os acordos de paz de 1998 na Irlanda do Norte, mas que após Março de 2019 se tornará a única fronteira terrestre entre o Reino Unido e a UE.

O regresso dos controlos alfandegários e policiais àquela divisória ameaça desestabilizar a paz na Irlanda do Norte (onde republicanos e unionistas tentam há meses, sem sucesso, entender-se sobre um novo governo de partilha de poder), mas também ter um profundo impacto económico, já que as duas metades da ilha mantêm laços muito apertados e o Reino Unido é historicamente o principal parceiro comercial de Dublin. Perante isto, já em cima da meta das negociações, o Governo irlandês avisou que não daria o seu aval ao avanço das negociações se não obtivesse garantias escritas de que a fronteira permanecerá tal como está.

“Alinhamento regulatório”

Após um fim-de-semana de intensas negociações, Bruxelas e Londres pareciam ter encontrado a fórmula mágica para o complexo problema, o que levou as duas partes a mostrar-se optimistas no momento em que May chegava a Bruxelas para um almoço decisivo com Jean-Claude Juncker. O Reino Unido assumia que, no caso de não conseguir negociar um acordo comercial de grande proximidade com a UE, a Irlanda do Norte manteria normas suficientemente próximas dos actuais parceiros para tornar dispensáveis controlos nas alfândegas – o chamado “alinhamento regulatório”. Na prática, tratava-se de um estatuto de excepção que permitiria à região manter-se de alguma forma ligada ao mercado único europeu e à união aduaneira, ao contrário do que Londres assegura que acontecerá com o resto do país.

A proposta satisfazia Dublin – ainda que não fosse tão longe como  inicialmente pedira – e o primeiro-ministro irlandês, Leo Varadkar, chegou a convocar a imprensa para anunciar que conseguira o que pretendia, mal May e Juncker terminassem em Bruxelas o almoço. “Chegámos a um acordo abrangente sobre as questões irlandesas”, disse à Reuters um fonte do executivo em Dublin. Também os negociadores britânicos pareciam satisfeitos com o termo encontrado, entendendo que era suficientemente ambíguo para lhe dar margem de manobra nos meses de negociações que têm pela frente. Mas para o DUP, que tem a sua razão de ser na defesa da Irlanda do Norte como parte indissociável do Reino Unido, a sugestão de um estatuto de excepção era simplesmente inaceitável.

“Deixámos muito claro que a Irlanda do Norte deve deixar a UE nos mesmos termos do resto do Reino Unido. Não aceitaremos qualquer forma de divergência regulatória que nos separe económica ou politicamente do restante Reino Unido”, afirmou ao início da tarde Arlene Foster, a líder do maior partido unionista, de quem os conservadores de May dependem para manter a maioria no Parlamento que perderam nas legislativas de Junho. O aviso era claro: ou May recuava naquilo que anunciou em Janeiro e aceitava que todo o país permanecesse no mercado único (o que seria inaceitável para a ala eurocéptica do seu partido) ou retirava de cima da mesa a cedência que se preparava para fazer em Bruxelas. Se nada disso acontecesse era a sua sobrevivência e do seu governo que ficariam em causa.

“Não é um fracasso”

Laura Kuenssberg, editora de Política da BBC, escreveu que 20 minutos depois da conferência de imprensa de Foster, a primeira-ministra britânica interrompeu as conversações com Juncker para falar ao telefone com a líder do DUP. “Quando regressou à sala o acordo tinha caído por terra”. Pouco depois, a primeira-ministra britânica e o presidente da Comissão punham o seu melhor sorriso para confirmar que não tinha sido possível superar as últimas divergências em dois dossiers – além da Irlanda, também a questão dos direitos dos cidadãos europeus e britânicos afectados pelo “Brexit” continua a não estar totalmente resolvida, ainda que várias fontes assumam que um acordo esteja à vista.

“Isto não é um fracasso”, disse Juncker que, ciente das dificuldades que May enfrenta internamente, fez questão de elogiar as capacidades da primeira-ministra britânica. “Devo dizer que ela é uma negociadora dura e nada fácil.” May, por seu lado, anunciou que regressará já na quarta-feira a Bruxelas para continuar as discussões e ultrapassar “algumas diferenças que ainda permanecem”. “Estou confiante que vamos concluir isto de forma positiva.”

Mas se Bruxelas parece agora disposta a dar mais algum tempo a May, o calendário é muito apertado – as conclusões da cimeira de 14 e 15 de Dezembro começam a ser negociadas entre os restantes 27 Estados-membros ainda esta semana – e as opções de Londres são escassas.

Varadkar, que se declarou “desapontado e surpreendido” por May não ter conseguido impor aos seus aliados o acordo que já tinha negociado, disse aceitar uma alternativa à expressão “alinhamento regulatório”, mas apenas por outra que tenha um significado idêntico. Um exercício semântico que dificilmente será aceite pelo DUP ou sequer para a ala mais dura do partido de May, como fez questão de lhe recordar o muito eurocéptico deputado Jacob Rees-Mogg. “Não vamos permitir distinções entre a Grã-Bretanha [Escócia, País de Gales e Inglaterra] e a Irlanda do Norte. Seria completamente inaceitável. Afinal de contas o nosso nome oficial é Partido Conservador e Unionista”.