O negócio Altice/TVI não pode ser uma história mal contada
O negócio não pode depender do voluntarismo displicente do ex-presidente de uma ERC em estado avançado de decomposição
A relativa indiferença com que o país tem seguido o negócio entre a Altice e a TVI diz muito sobre a importância que entre nós tem a qualidade da democracia. Para lá dos protestos contundentes da Nos ou, como acontece nesta edição do PÚBLICO, do patrão da SIC e do Expresso, um silêncio meio envergonhado, meio cúmplice vai deixando instalar-se a ideia de que, em curso, está apenas mais um negócio do domínio dos privados. Não está. Mesmo que se relativize o receio de Paulo Azevedo, da Sonae (e da Nos) sobre o risco de, no futuro, se descobrir “uma Operação Marquês 10 vezes maior”, não se pode tapar os olhos perante um relatório da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) que alerta para os perigos da “concentração da titularidade de quatro dos cinco segmentos de órgãos de comunicação social” e sublinha que a “presente operação” não trará “benefícios em prol do pluralismo no sistema mediático português.”
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A relativa indiferença com que o país tem seguido o negócio entre a Altice e a TVI diz muito sobre a importância que entre nós tem a qualidade da democracia. Para lá dos protestos contundentes da Nos ou, como acontece nesta edição do PÚBLICO, do patrão da SIC e do Expresso, um silêncio meio envergonhado, meio cúmplice vai deixando instalar-se a ideia de que, em curso, está apenas mais um negócio do domínio dos privados. Não está. Mesmo que se relativize o receio de Paulo Azevedo, da Sonae (e da Nos) sobre o risco de, no futuro, se descobrir “uma Operação Marquês 10 vezes maior”, não se pode tapar os olhos perante um relatório da Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC) que alerta para os perigos da “concentração da titularidade de quatro dos cinco segmentos de órgãos de comunicação social” e sublinha que a “presente operação” não trará “benefícios em prol do pluralismo no sistema mediático português.”
Não está em causa uma liminar rejeição do negócio, nem a sua apologia inspirada em supostas teses segundo as quais o panorama dos media em Portugal tem de ganhar escala para enfrentar gigantes como a Google ou o Facebook. O que é inaceitável neste processo é a sensação de que o negócio pode depender do voluntarismo displicente de um ex-presidente de uma ERC em estado avançado de decomposição — o Parlamento gastou tempo de mais a entender-se para nomear uma nova equipa directiva. Com apenas três dos seus cinco membros em exercício, foi fácil ao ex-presidente da ERC impedir um consenso em torno da recomendação dos serviços da entidade, que propunham o chumbo do negócio pelos perigos que coloca ao pluralismo.
O Bloco de Esquerda já conseguiu apoio do PCP e do PS para uma audição dos três ex-membros da ERC. Dois dirão as razões que os levaram a rejeitar o negócio. O ex-presidente repetirá certamente as explicações estapafúrdias que justificaram o seu voto, desde o chumbo nos tempos de Sócrates a uma lei da concentração dos media à “experiência que eu próprio tive com o sr. Drahi [líder mundial da Altice] quando, perante os técnicos da casa, lhe perguntei se podia dar garantias de que não teria comportamentos nos limites ou mesmo à margem da lei”. A repetição do que se sabe não basta. Como sugere Francisco Pedro Balsemão, o caso deve voltar a ser analisado e discutido com uma ERC recomposta na sua forma e na sua legitimidade.