Dois terços dos lesados do Banif arriscam perder direitos de indemnização
Prazo para apresentar reclamações termina a 19 de Dezembro, dois anos após a resolução do banco. Após essa data, os processos prescrevem.
Perto de dois terços dos lesados não qualificados do Banif poderão ficar de fora de qualquer solução que venha a ser encontrada para os antigos clientes do banco, caso não formalizem a respectiva queixa nas próximas semanas.
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Perto de dois terços dos lesados não qualificados do Banif poderão ficar de fora de qualquer solução que venha a ser encontrada para os antigos clientes do banco, caso não formalizem a respectiva queixa nas próximas semanas.
Quase dois anos após a resolução, a Associação de Defesa dos Lesados do Banif (Alboa) estima que dos 3500 obrigacionistas subordinados do banco, que tinha sede no Funchal, apenas 1500 formalizaram junto das autoridades judiciais a respectiva reclamação. Os restantes têm até ao dia 19 de Dezembro para fazê-lo, data em que se completam dois anos sobre o início do processo de resolução do Banif.
De acordo com a legislação, a responsabilidade do intermediário financeiro, neste caso o Banif, prescreve, dois anos após o lesado ter tido conhecimento da conclusão do negócio e dos respectivos termos. “Admitindo que os lesados se aperceberam das características das obrigações apenas no dia em que a resolução teve início, a 19 de Dezembro de 2015, então, à cautela, no dia 19 de Dezembro de 2017 prescrevem os direitos dos lesados do Banif de exigirem as responsabilidades às entidades que intermediaram essas obrigações”, explica ao PÚBLICO Ricardo Marques Candeias, da Candeias Advogados, que disponibiliza uma plataforma online de apoio aos lesados.
Na prática, ressalva o responsável pela Alboa, Jacinto Silva, o prazo de reclamação extingue-se a 14 de Dezembro, pois a lei prevê um atraso de cinco dias para que as notificações ou citações sejam efectuadas. “Ainda há muitas pessoas que não apresentaram queixa, e que correm o risco de ficar de fora de uma solução”, acrescenta Jacinto Silva ao PÚBLICO, dizendo que continua a persistir muita falta de informação sobre este processo.
Dá um exemplo. “Quando a Associação esteve na África do Sul, muitas pessoas só perceberam o que nós realmente estamos a fazer depois de termos vindo embora, e só aí quiserem reunir connosco. Já não conseguimos atendê-las.”
É aí, na África do Sul, como também na Venezuela e nos Estados Unidos, que Jacinto Silva pensa estar o grosso dos lesados que ainda não reclamaram. Ou por desconhecimento, ou por estarem na expectativa para ver se existe ou não uma solução. Mas, avisa Ricardo Marques Candeias, já poderá ser tarde. “Os prazos de prescrição não são suspensos pela existência de negociações com o Governo, com o Banco de Portugal ou com a CMVM [Comissão do Mercado de Valores Mobiliários”, alerta o advogado.
A Alboa, contabiliza Jacinto Silva, tem perto de 1300 associados. Outros 200, estima, não estão ligados à associação de lesados mas encontraram-se identificados. “Mesmo admitindo a existência de alguns clientes qualificados [bancos, empresas e grandes investidores] entre os 3500 obrigacionistas subordinados, ficam de fora quase duas mil pessoas.”
Jacinto Silva insiste que serão na maioria emigrantes madeirenses e açorianos. Os primeiros na Venezuela e África do Sul. Os segundos, nos Estados Unidos. “Muitas pessoas não têm ainda a noção do que aconteceu e dos direitos que têm”, diz, explicando que por isso dos 263 milhões de euros investidos em obrigações subordinadas, à data da resolução do banco, apenas 150 milhões de euros terão sido já reclamados.
Muito pouco, na óptica da Alboa que na próxima semana regressa à estrada para novos encontros de sensibilização e informação. A primeira paragem é no Funchal, onde tudo começou a 15 de Janeiro de 1988, dia em que o Banif foi fundado para absorver a falida Caixa Económica do Funchal, uma instituição financeira com grande peso no arquipélago.
O banco, que teve sempre uma fatia residual do mercado bancário nacional, apresentava quotas de implantação elevadas nas duas regiões autónomas: 34% nos Açores e 26% na Madeira. O Banif tinha, por via disso, uma fatia importante dos depósitos dos emigrantes dos dois arquipélagos.
“Vamos aproveitar o regresso dos emigrantes nesta época do ano, para ver se identificamos mais pessoas lesadas”, diz Jacinto Silva, acrescentando que nos Açores surgiram nos últimos dias mais meia centena de queixas.