Partidos à esquerda abrem a porta à solução fiscal do PS para a banca
Dedução em IRC das chamadas “imparidades” já reconhecidas pelos bancos vai a votos amanhã. Governo rejeita estar em causa uma “benesse” ao sector financeiro.
A solução encontrada pelo PS para resolver o tratamento fiscal a dar às imparidades (perdas) constituídas pelos bancos por causa de créditos incobráveis deverá contar com a viabilização do BE e do PCP na votação na especialidade, com o argumento de que vem minimizar um problema que dizem ter sido criado pelo anterior Governo.
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A solução encontrada pelo PS para resolver o tratamento fiscal a dar às imparidades (perdas) constituídas pelos bancos por causa de créditos incobráveis deverá contar com a viabilização do BE e do PCP na votação na especialidade, com o argumento de que vem minimizar um problema que dizem ter sido criado pelo anterior Governo.
Em causa está uma proposta de alteração ao Orçamento do Estado (OE) apresentada pela bancada socialista que, entre outras especificidades, altera o modelo que permite aos bancos aproveitar do ponto de vista fiscal, em sede de IRC, os chamados “activos por impostos diferidos” que foram sendo acumulados pelas instituições financeiras, ficando com uma espécie de crédito para poderem reconhecer como perdas fiscalmente aceites. Alguns deles foram constituídos ao abrigo do regime fiscal criado durante a crise financeira e podiam ser deduzidos ao IRC a qualquer momento.
A solução trazida ao Parlamento pelo PS define que as imparidades dedutíveis (para determinar o lucro tributável em IRC) podem ser abatidas ao longo de 19 anos, havendo assim prestações com limites definidos por cada período – abatendo 2% no primeiro ano de tributação, 3% no segundo, 5% do terceiro ao novo e 6% daí em diante.
Em entrevista ao PÚBLICO/Rádio Renascença a publicar amanhã, a deputada do BE Mariana Mortágua argumenta que o que está em causa é uma proposta que vem “minimizar” um problema que diz ter sido deixado pelo anterior executivo, a quem acusa de ter dado aos bancos um “benefício fiscal” que as instituições podiam vir reclamar de um momento para o outro mesmo sem lucro para o deduzir.
“Quem criou este direito e esta possibilidade foi o Governo PSD e CDS, na altura para combater os problemas de capital do banco. Uma das propostas que este Governo agora faz é tentar minimizar a possibilidade de os bancos virem todos ao mesmo tempo pedir 5000 milhões de euros e diferir no tempo, para que só possam vir pedir uma parcela de cada vez” ao longo dos 19 anos, explica-se Mariana Mortágua.
Embora sem uma “posição finalizada”, a deputada defende que “entre um descontrolo total sobre um benefício que já foi concedido ou controlar esse benefício”, há na solução do PS “uma tentativa de solucionar esse problema – ou pelo menos de o minimizar”.
Do lado do PCP, o deputado Miguel Tiago aponta também o dedo ao anterior Governo, acusando-o de ter criado um regime com o qual o PCP “jamais esteve de acordo que tivesse sido criado” e que, diz, é um problema porque deu aos bancos o direito de usarem os activos por impostos diferidos com a possibilidade de abater ao IRC. Ao longo de sucessivos governos do PSD, CDS e PS, acusa, a banca “foi gozando de regimes fiscais absurdos” que lhe permitiram “ir gerindo e manipulando os lucros para aproveitar a cada momento essas benesses”.
Agora, ressalvando que a norma do PS “não é uma proposta do PCP”, Miguel Tiago admite que o PCP “entende que a proposta é melhor do que o regime que existe actualmente”.
Na própria proposta, o PS justifica as alterações com o facto de as normas actuais remeterem “para um quadro conceptual contabilístico que deixou de existir, o que suscitava dificuldades de aplicação do regime e do seu controlo pela Autoridade Tributária e Aduaneira”.
Ao Negócios, o secretário de Estado Adjunto e das Finanças, Ricardo Mourinho Félix, rejeitava ontem a ideia de que o Governo esteja a dar uma “benesse à banca”. “Os bancos não ficaram 100% agradados com a ideia mas entendem que não é possível terem tudo”, afirmou o governante ao mesmo jornal, defendendo que, neste novo modelo, o Estado fica com “maior controlo sobre a receita que perde, e preserva o capital que injectou” na CGD.
O PS avança com uma segunda norma para tratar das imparidades futuras, aproximando-as do momento em que são gerados os impostos diferidos. E em relação a essa proposta, a deputada Mariana Mortágua diz que a norma, “essa sim, pode ter efeitos contrários aos desejáveis”, pelo que admite que será preciso “estudar e analisar” a solução.