Inspectores do fisco atentos aos portugueses dos Paradise Papers
Unidade Antifraude deverá analisar as informações publicadas online pelo consórcio de jornalistas, mas sem chegar à posse dos ficheiros. Investigações dos Panama Papers continuam, com 13 acções de inspecção ainda de pé.
A Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) está atenta às revelações internacionais dos Paradise Papers e fará o seu próprio caminho para averiguar os nomes relacionados com Portugal, não contando pedir informações directamente ao Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (CIJI) para prosseguir as suas inspecções tributárias.
A verdade faz-nos mais fortes
Das guerras aos desastres ambientais, da economia às ameaças epidémicas, quando os dias são de incerteza, o jornalismo do Público torna-se o porto de abrigo para os portugueses que querem pensar melhor. Juntos vemos melhor. Dê força à informação responsável que o ajuda entender o mundo, a pensar e decidir.
A Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) está atenta às revelações internacionais dos Paradise Papers e fará o seu próprio caminho para averiguar os nomes relacionados com Portugal, não contando pedir informações directamente ao Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação (CIJI) para prosseguir as suas inspecções tributárias.
A estratégia adoptada pela administração fiscal portuguesa é semelhante à seguida no início de 2016 quando surgiram as revelações dos Panama Papers, uma mega fuga de informação que começou por levar a AT a analisar 165 residentes fiscais no país e a instaurar 13 acções de inspecção, algumas ainda a aguardar resposta a pedidos de informação internacional.
O primeiro passo do fisco consiste numa análise aos elementos divulgados pelo consórcio, cruzando-os com as suas próprias fontes de informação, para os serviços internos verificarem se os indícios de evasão e planeamento fiscal agressivo têm fundamento e devem ser investigados. Só numa segunda fase a Unidade Antifraude Tributária poderá determinar que se avancem com pedidos de troca de informação com entidades externas.
A questão volta agora a estar na ordem do dia com os ficheiros dos Paradise Papers, onde o semanário Expresso já encontrou referenciados mais de 70 cidadãos portugueses, entre os quais antigos administradores do GES e do BPN. Alguma informação entretanto publicada online pelo consórcio confirma 73 nomes ligados a Portugal e lista apenas três sociedades offshores, duas localizadas nas Bermudas e uma nas ilhas Caimão.
Comprar os ficheiros secretos a fontes anónimas – à semelhança do que fizeram a Dinamarca e a Alemanha, pagando alguns milhões de euros por documentos da firma de advogados Mossack Fonseca que chegaram às mãos do CIJI e deram origem aos Panama Papers – não é um cenário que o Ministério das Finanças refira como estando em cima da mesa relativamente aos Paradise Papers.
Questionado pelo PÚBLICO se pretende pedir informação ao CIJI sobre os clientes portugueses (ou cidadãos relacionados com Portugal), o gabinete do secretário de Estados dos Assuntos Fiscais, António Mendonça Mendes, afirma que o consórcio “tem adoptado uma política de não se relacionar directamente com as administrações fiscais, remetendo exclusivamente para as informações tornadas públicas”.
A política do consórcio é a de não dar a qualquer autoridade os documentos que obtiveram através de uma fonte anónima, o que abre uma de duas opções às administrações fiscais: investigar a partir do site do CIJI ou procurar interesse na compra dos ficheiros através de uma fonte anónima, como fizeram a Dinamarca e a Alemanha.
As histórias são publicadas nos órgãos de comunicação parceiros e alguma da informação agregada pode ser consultada numa plataforma aberta do site do CIJI, que vai crescendo à medida que surge uma nova vaga de revelações, como a de há 15 dias. A decisão de não fornecer os ficheiros é justificada com uma política de autoprotecção dos jornalistas.
No caso português, António Mendonça Mendes refere que a actuação do fisco perante “notícias indiciadoras da participação em esquemas de fuga e evasão fiscal” por parte de cidadãos residentes em Portugal, verifica o fundamento dessas informações “com base nos elementos e instrumentos de que dispõe, e caso subsistam dúvidas, [fá-lo] através do recurso aos instrumentos de troca de informação com entidades externas”.
Toda a informação cabe à Unidade Antifraude Tributária, em cooperação com outros serviços de inspecção do fisco, como a área das Relações Internacionais e a dos Sistemas de Informação.
Dos 13,4 milhões de ficheiros que chegaram ao Süddeutsche Zeitung e, através deste jornal alemão aos restantes media parceiros do consórcio, o CIJI está a publicar uma parte importante, os dados que pertencem ao escritório de advogados Appleby, uma sociedade fundada nas Bermudas e com presença noutras praças offshore.
Além das investigações por conta própria, a AT faz parte de uma plataforma de discussão na OCDE que junta 37 administrações fiscais, o Joint International Task Force on Shared Intelligence and Collaboration (JITSIC), onde são criados grupos de trabalho para discutir determinados temas. Aconteceu com os Panama Papers – e agora, diz o Governo, a “dimensão internacional deste tipo de casos” justifica o envolvimento da autoridade tributária, porque o fórum “permite o desenvolvimento de um trabalho de pesquisa e análise conjuntos, de discussão de estratégias e de partilha de resultados”.
No caso dos Panama Papers, o fisco português começou por analisar os 165 sujeitos passivos, depois averiguou “detalhadamente” 58 e instaurou 13 acções de inspecção. Das que já foram iniciadas, o fisco solicitou dez pedidos de cooperação internacional, ainda à espera de resposta.