Altice reconhece "problema de crescimento" e muda estratégia
A dona da Meo pôs a redução da dívida no topo das prioridades. Acabaram-se as aquisições e a venda de activos não estratégicos passou a estar na agenda.
“Quando alguém se foca na redução da dívida, é porque tem um problema de crescimento”. As palavras são de Patrick Drahi e foram ditas no decurso de uma longa audição do fundador da Altice na comissão de assuntos económicos da Assembleia Nacional Francesa, há dois anos e meio, pouco depois da aquisição da francesa SFR, da PT e da norte-americana Suddenlink. Vista à luz dos últimos acontecimentos, a declaração do gestor pode indicar que o projecto Altice, alavancado em cerca de 50 mil milhões de euros de dívida, já conheceu dias mais optimistas.
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“Quando alguém se foca na redução da dívida, é porque tem um problema de crescimento”. As palavras são de Patrick Drahi e foram ditas no decurso de uma longa audição do fundador da Altice na comissão de assuntos económicos da Assembleia Nacional Francesa, há dois anos e meio, pouco depois da aquisição da francesa SFR, da PT e da norte-americana Suddenlink. Vista à luz dos últimos acontecimentos, a declaração do gestor pode indicar que o projecto Altice, alavancado em cerca de 50 mil milhões de euros de dívida, já conheceu dias mais optimistas.
Esta quarta-feira, numa conferência da Morgan Stanley, em Barcelona, Patrick Drahi e os seus dois principais executivos, Dexter Goei e Dennis Okhuijsen, presidente executivo e administrador financeiro da Altice, respectivamente, vieram tentar pôr água numa fervura que se levantou há cerca de duas semanas, quando o grupo apresentou resultados trimestrais inferiores ao esperado e limitou as expectativas para o conjunto do ano. As notícias foram mal recebidas pelos investidores e fizeram encolher em quase metade o valor de mercado da Altice.
Agora, a nova prioridade é a redução do endividamento, explicou o Estado-maior da Altice aos participantes do evento destinado a investidores do sector das telecomunicações e media, naquela que foi a primeira intervenção pública desde a sangria em bolsa. A empresa “entrou em modo de redução de dívida”, acabaram-se as fusões e aquisições e a venda de alguns "activos não estratégicos e pequenos negócios" pode vir a ser equacionada, explicaram. Segundo informações recolhidas pelo PÚBLICO, as declarações dos gestores da Altice sobre o travão à compra de activos referem-se a operações futuras e não abrangem a operação de compra da Media Capital que aguarda o OK da Autoridade da Concorrência.
“O objectivo um, dois e três” é reduzir o endividamento nas operações europeias, onde a França continua a ser uma dor de cabeça e a SFR continua a perder clientes, sublinhou Dennis Okhuijsen, aos investidores reunidos em Barcelona.
Em Paris, e regressando a 2015, o discurso de Drahi era bem diferente: “Se alguém parou de crescer, o seu principal problema é a dívida; se está a crescer, então a questão é saber qual será a próxima via de crescimento e não como reembolsar a dívida”, disse o gestor aos deputados franceses que o questionaram sobre um nível de endividamento (perto dos 30 mil milhões de euros) que já então causava reticências.
“Se eu acabasse com aquilo a que chamam o meu ‘crescimento bulímico’, em cinco anos teria deixado de ter dívida (…) e depois o quê? Isso seria estúpido, porque em cinco anos teria deixado de crescer”, acrescentou.
Olhando para o panorama actual (e seguindo o raciocínio do gestor franco-israelita na audição de há dois anos), a Altice tem em mãos dois problemas: o primeiro é que continua a ter dívida, mas o crescimento está aquém do esperado, e o segundo é que, tendo em conta o comportamento das acções nos últimos dias, a percepção dos investidores em relação à empresa alterou-se radicalmente.
O “problema de gestão” de Combes
Em Barcelona, os líderes da Altice quiseram deixar claro que encaram o futuro com optimismo, mesmo tendo perspectivas menos animadoras para 2017: “O ano de 2018 vai ser um ano transformacional” para a operação francesa, com a aposta em novas linhas de geração de receita, disse Goei. “Os nossos planos mantêm-se”, assegurou Drahi (depois da intervenção dos gestores, as acções inverteram as quedas dos últimos dias e fecharam a subir 8%)
França representa mais de metade do volume de negócios do grupo e, no terceiro trimestre, as receitas caíram 1,3% para 2757 milhões. “O principal problema em França não foi um problema de concorrência, foi um problema de gestão”, disse Patrick Drahi à audiência e remetendo para a liderança de Michel Combes, o homem que no Verão de 2015 veio da Alcatel Lucent para assumir a gestão executiva da Altice, e foi afastado na semana passada.
Este ano, a empresa “esperava uma estabilização das receitas” da SFR, “num ano em que o mercado está a crescer” e isso não aconteceu, reconheceu o fundador da Altice, acrescentando que os problemas operacionais da SFR foram bem identificados, mas que a implementação da estratégia para lidar com eles “não foi completa”, nem feita “com a devida atenção”, acrescentou. Tratou-se, no fundo, de uma “questão de gestão”, afirmou Patrick Drahi, salientando que a venda de conteúdos (em que a empresa tem feito pesados investimentos, sendo um dos mais sonantes os 350 milhões para garantir os direitos exclusivos da Liga dos Campeões e da Liga Europa) “foi mal gerida”.
O gestor, que em consequência da reorganização da Altice voltou a assumir as rédeas do grupo, sublinhou que o foco da SFR tem de estar nos clientes: “Temos uma boa rede, mas se não soubermos resolver os problemas do dia-a-dia dos clientes, não os conseguimos manter felizes”. E essa será uma missão que aparentemente ficará nas mãos de Armando Pereira, o co-fundador português do grupo, que nesta nova Altice remodelada vai assumir a gestão operacional dos negócios de telecomunicações em todos os mercados.