O que é preciso para jantar no Panteão
Se uma entidade privada quiser organizar um jantar no Panteão Nacional (PN), o que deve fazer?
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Se uma entidade privada quiser organizar um jantar no Panteão Nacional (PN), o que deve fazer?
Enviar um pedido por escrito à direcção do PN, precisando antes de mais o espaço que pretende alugar, entre os vários que o monumento disponibiliza para jantares, cocktails, filmagens e actividades comerciais. Deve indicar também a natureza do evento, designar a entidade promotora, especificar o número de comensais e a duração e horário previstos, e ainda acrescentar informação relevante: se vai usar catering, se precisará de movimentar cargas, ou, por exemplo, se tenciona montar alguma estrutura no interior do PN.
Com que antecedência deve enviar o pedido?
A lei ainda em vigor, que o actual ministro da Cultura, Luís Filipe Castro Mendes, já anunciou ir revogar, estipula uma antecedência mínima de 15 dias, mas admite excepções se o pedido “for susceptível de (…) análise e decisão em prazo mais curto”.
O que acontece após a entrada do requerimento?
A direcção do PN analisa o pedido e toma uma de três decisões: recusa, pede mais informações ao requerente, se entender que a informação prestada é lacunar, ou autoriza e envia o pedido à Direcção-Geral do Património Cultural (DGPC), com um parecer a sustentar a sua decisão favorável. A DGPC, a quem cabe a última palavra, analisa então o pedido, e só excepcionalmente não confirma o deferimento, quer se trate do PN ou de qualquer outro monumento sob a sua tutela. Resta então estabelecer um contrato com o requerente, que se baseará nos preços de aluguer tabelados por lei, mas que poderá envolver vários custos suplementares, como seguros ou despesas de vigilância. É ainda obrigatória a assinatura de um termo de responsabilidade civil através do qual a entidade que organiza o jantar assume quaisquer danos que este possa causar.
Que espaços é que a lei prevê que o PN possa alugar, e para que efeitos?
O despacho de 2014 assinado pelo então secretário de Estado da Cultura, Jorge Barreto Xavier, e pelo secretário de Estado do Orçamento, Hélder Reis, discrimina cinco locais: o Corpo Central, com capacidade para 400 lugares sentados e 800 em pé, o Coro Alto, a Sala Sul, o Terraço e o Adro. De todos eles, só na Sala Sul não são permitidos jantares, embora sejam autorizadas “actividades comerciais”. O preço de aluguer para jantares varia entre 2500 euros, no Coro Alto, e 4000 no Adro. Para o Corpo Central, onde decorreu o jantar da Web Summit, a tabela estipula 3000 euros.
Já houve outros jantares do PN?
Sim, de acordo com a DGPC, o da Web Summit foi o 10.º, contando apenas os que tiveram lugar no Corpo Central. O primeiro ocorreu em 2002 e a prática intensificou-se após a regulamentação legal de 2014. Só este ano já houve três.
A lei prevê condições em que o aluguer não deve ser permitido?
Sim. Iniciativas de carácter político ou sindical devem ser recusadas, bem como os pedidos que “colidam com a dignidade dos monumentos” ou “perturbem o acesso e circuito de visitantes”.
O PN já recusou algum pedido, não o enviando sequer à DGPC, por entender que feria obviamente a dignidade do monumento?
Já este ano, soube o PÚBLICO, a directora do PN, Isabel Melo, indeferiu sumariamente um pedido para a realização de uma festa de fim de ano no Panteão.
A responsável do PN tem fundamento legal para recusar qualquer jantar, seja qual for a entidade que o promova, por entender que ofende a dignidade do local?
No quadro da lei actual não parece ter, uma vez que o despacho de 2014, ao tabelar os preços dos jantares em vários locais do PN, incluindo o Corpo Central, está a assumir implicitamente que estes são aceitáveis e devem ser autorizados, ainda que com as excepções que decorram do bom senso, como a necessidade de evitar riscos patrimoniais ou impedir actividades que, no contexto do Panteão, pareçam de gosto tão duvidoso que justifiquem a recusa. A festa de réveillon rejeitada sumariamente parece ser um bom exemplo, mas convém lembrar que uma editora já foi autorizada, em 2003, a recriar no PN a escola de feitiçaria imaginada por J. K. Rowling para a festa de lançamento de um livro de Harry Potter.
Depois da polémica provocada pelo jantar da Web Summit e consequente indignação do primeiro-ministro, o que é que vai mudar?
Precisando ao PÚBLICO uma informação que já divulgara numa nota à imprensa, Luís Filipe Castro Mendes afirma que o Ministério da Cultura vai “rever as regras sobre a utilização do património” e que passarão a ser “proibidos quaisquer eventos de natureza festiva no Panteão Nacional”. E garante que, no que respeita a outros locais patrimoniais tutelados pela DGPC, “será elaborado a curtíssimo prazo um regulamento mais estrito e exigente para o uso desses monumentos”.