Assembleia Constituinte criminaliza toda e qualquer acção de oposição ao regime
A nova Lei Constitucional contra o Ódio, pela Convivência Pacífica e a Tolerância foi proposta pelo Presidente e designada como "prioritária". Maduro deixa a oposição numa camisa de forças antes da campanha para as presidenciais.
No mesmo dia em que Nicolás Maduro confirmou que o calendário eleitoral de 2018 inclui a votação para a presidência, a Assembleia Constituinte da Venezuela aprovou por unanimidade a nova Lei Constitucional contra o Ódio, pela Convivência Pacífica e a Tolerância proposta pelo Presidente – que dá o golpe de misericórdia na fragilizada oposição do país, eliminando toda a crítica do espaço público e assegurando que a campanha do próximo ano será um passeio para o chavismo.
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No mesmo dia em que Nicolás Maduro confirmou que o calendário eleitoral de 2018 inclui a votação para a presidência, a Assembleia Constituinte da Venezuela aprovou por unanimidade a nova Lei Constitucional contra o Ódio, pela Convivência Pacífica e a Tolerância proposta pelo Presidente – que dá o golpe de misericórdia na fragilizada oposição do país, eliminando toda a crítica do espaço público e assegurando que a campanha do próximo ano será um passeio para o chavismo.
A nova legislação, que abre a porta à detenção de adversários, à extinção de partidos políticos e à cassação de licenças para a comunicação social, foi apresentada como Maduro como uma “prioridade” logo na primeira sessão do órgão plenipotenciário que assumiu as funções legislativas do parlamento dominado pela oposição. Desde que tomou posse, há três meses, a Constituinte não só ainda não propôs nenhuma alteração ao texto da lei fundamental que foi encarregada de rever, como já violou a Magna Carta em algumas das suas deliberações.
Esse será o caso desta nova lei com 25 artigos, que segundo explicou a presidente da Constituinte, Delcy Rodríguez, visa promover a igualdade e servir de exemplo de “paz, amor, tolerância num mundo gravemente ameaçado pelos poderes imperiais”. Esse objectivo será alcançado através da punição, com penas que podem ir entre os dez e os vinte anos de prisão, de todos aqueles que “fomentem, promovam ou incitem o ódio, a discriminação ou a violência motivada pela pertença, real ou suposta, a determinado grupo social, étnico, religioso, político, de orientação sexual, de identidade de género ou qualquer outro motivo discriminatório” – uma formulação suficientemente vaga e que, concretiza o El País, resulta na criminalização de quase todos os comportamentos associados a acções de protesto, como a repetição de slogans em manifestações, a publicação de mensagens nas redes sociais ou a interrupção do trânsito.
Os partidos políticos cujas plataformas favoreçam ideias fascistas ou a “intolerância e a divisão nacional” serão desqualificados pelo Conselho Nacional Eleitoral. Estão ainda previstas multas pesadas, e até o corte do sinal e a perda de licença, para todos os media – imprensa, rádio, televisão e redes sociais – que difundam “discursos de ódio” e transmitam mensagens “a favor da guerra”. Pelo contrário, a lei obriga a comunicação social, pública e privada, a distribuir conteúdos que contribuam para a “paz, tolerância, igualdade e respeito”, que nas palavras de Delcy Rodríguez fazem parte da “natureza e espírito da revolução bolivariana” que Maduro e os seus aliados na Constituinte prometeram aprofundar.
Como denunciou a organização Acesso à Justiça, na forma como foi regulamentada, a lei colide com os princípios consagrados na Constituição redigida por Hugo Chávez, nomeadamente os que garantem o direito à liberdade de expressão e de assembleia ou a independência dos media e a inexistência da censura. “As normas são absolutamente inconstitucionais. A lei foi feita para proteger o Governo e perseguir e incitar a violência política, a discriminação e a intolerância”, afirmou a directora daquela ONG venezuelana, Laura Loza, ao jornal El Universal.
A imprensa nacional e internacional foi lesta a sinalizar os principais candidatos a serem penalizados ao abrigo da nova legislação: os dirigentes dos principais partidos da cada vez mais fragmentada coligação de oposição Mesa de Unidade Democrática (a quem de resto o regime já tratara de retirar a imunidade parlamentar) que possam perfilar-se como candidatos presidenciais; jornalistas e proprietários de meios de comunicação opositores e comentadores e analistas influentes nas redes sociais. O director da Human Rights Watch, Jose Miguel Vivanco, não tem dúvida de que a aprovação da lei consagra em definitivo a tirania do regime venezuelano. “Ninguém pode ficar surpreendido que o circo autocrático de Maduro tenha chegado tão longe: a mafia que governa o país já tinha demonstrado vezes sem conta que estava disposta a fazer tudo para reprimir a oposição”, observou.