As madalenas de Mariazinha

Um documentário curioso mas desequilibrado sobre uma infância colonial nos tempos do regime.

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As rosas timorenses de Ermera são, neste curioso documentário de Luís Filipe Rocha (Cinzento e Negro), uma espécie de “madalena” de Proust, um aroma ou uma recordação que invocam memórias do “mundo quase perfeito” em que três irmãos viveram à beira da Segunda Guerra. Para a família do juiz José Nepomuceno Afonso dos Santos, houve um antes de Timor e um depois de Timor, marcado pelos perfumes exóticos que, aos 83 anos, ainda persistem na memória de Mariazinha, a mais nova das três crianças do juiz. E, no fundo, é essa memória que Rocha escava para contar a história, alheia a questões sociais ou políticas ou fracturantes, de uma infância colonial: primeiro a três, em Lourenço Marques, depois em Dili e Coimbra, cruzando de maneira elegante os depoimentos de Mariazinha, que foi com os pais de Moçambique para Timor, e de João, o irmão mais velho, enviado para Coimbra com o irmão José (que, anos mais tarde, seria para todos “o Zeca”, José Afonso) para viver com uma tia beata numa casa fechada sobre si própria. Desenha-se assim, através dessas memórias cruzadas, um retrato sentido de um Portugal colonial contraditório, entre os espaços abertos do “ultramar” e a austeridade conservadora da “metrópole”.

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As rosas timorenses de Ermera são, neste curioso documentário de Luís Filipe Rocha (Cinzento e Negro), uma espécie de “madalena” de Proust, um aroma ou uma recordação que invocam memórias do “mundo quase perfeito” em que três irmãos viveram à beira da Segunda Guerra. Para a família do juiz José Nepomuceno Afonso dos Santos, houve um antes de Timor e um depois de Timor, marcado pelos perfumes exóticos que, aos 83 anos, ainda persistem na memória de Mariazinha, a mais nova das três crianças do juiz. E, no fundo, é essa memória que Rocha escava para contar a história, alheia a questões sociais ou políticas ou fracturantes, de uma infância colonial: primeiro a três, em Lourenço Marques, depois em Dili e Coimbra, cruzando de maneira elegante os depoimentos de Mariazinha, que foi com os pais de Moçambique para Timor, e de João, o irmão mais velho, enviado para Coimbra com o irmão José (que, anos mais tarde, seria para todos “o Zeca”, José Afonso) para viver com uma tia beata numa casa fechada sobre si própria. Desenha-se assim, através dessas memórias cruzadas, um retrato sentido de um Portugal colonial contraditório, entre os espaços abertos do “ultramar” e a austeridade conservadora da “metrópole”.

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Mas se, na primeira metade, desenhando a intimidade de uma família a partir das recordações que restaram, Rosas de Ermera é um fascinante trabalho de memória, na segunda parte, que se centra na experiência da família em Timor depois da invasão japonesa, o filme desequilibra-se e dispersa-se. Ao levar Mariazinha de regresso a Timor para se confrontar com o presente das suas memórias, é como se a magia se perdesse — como se de repente ela não passasse de uma turista nas suas próprias recordações, e tudo aquilo que até aí era nítido e cristalino na vida da família se tornasse turvo e ausente.

Nesse processo, Rosas de Ermera perde a sua capacidade de invocar o tal “mundo quase perfeito” para se resumir apenas à reportagem do que ficou depois de ele se perder. Como quem prova o velho adágio que diz que nunca devemos voltar aos locais onde fomos felizes, o documentário de Luís Filipe Rocha parece apenas ganhar-se na distância do passado, mais do que na sua proximidade.