Quem deve pedir desculpa?
As elites africanas só poderão liderar a mudança do destino do seu povo se assumirem a responsabilidade que lhes cabe.
"O discurso do arrependimento do Ocidente é esclerosante. É preciso libertar-se dele e pensar para além da vitimização. [...] A pergunta que devemos colocar a nós próprios não é: porque sou mal acolhido; mas é: porque parto, porque deixo a minha terra."
Kamel Daoud, argelino, combatente por um islão iluminista, condenado a uma sentença de morte por um imã
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"O discurso do arrependimento do Ocidente é esclerosante. É preciso libertar-se dele e pensar para além da vitimização. [...] A pergunta que devemos colocar a nós próprios não é: porque sou mal acolhido; mas é: porque parto, porque deixo a minha terra."
Kamel Daoud, argelino, combatente por um islão iluminista, condenado a uma sentença de morte por um imã
O discurso de vitimização de africanos e islâmicos já não se pode ouvir. É hoje um contra-senso que funciona como desculpa para elites e governantes não assumirem a responsabilidade que há muito lhes cabe na situação endémica dramática em que vivem a maioria das sociedades e povos da Africa e do Médio Oriente.
Elísio Macamo, professor moçambicano numa universidade suíça, brindou-nos recentemente com um rebuscamento "académico" desse queixume absurdo (PÚBLICO, 11/10/17). É a si próprio que Portugal deve pedir desculpas "por ter violado os seus próprios valores" no período dos Descobrimentos e da colonização, escreveu. "Tantas vezes quanto for necessário"!
Ou seja, quer que eu inclua nas minhas orações um pedido de perdão a mim próprio pelas atrocidades que, por exemplo, Vasco da Gama praticou no Índico, com as quais não tive nada a ver e me repugnam! Eu e Portugal estaríamos assim condenados a uma espécie de inferno católico, absurdo histórico há muito abandonado pela própria Igreja.
Convém lembrar com o historiador João Pedro Marques que esses "nossos" [1] valores [concretamente o anti-esclavagismo] não eram, então, reconhecidos universalmente e que desde há muito "o Estado português os oficializou e os portugueses os interiorizaram" (com alguma excepção aberrante e punível pela lei, como em todo o lado houve sempre).
Pelo contrário, a maioria dos africanos e islâmicos não os interiorizou. E vários Estados africanos e islâmicos não os oficializaram. E nenhum pediu desculpa por os terem violado no passado, pela colonização durante séculos de muitos territórios na Europa e na Ásia. Nem se ouvem pedidos de desculpa das elites por muitos deles os continuarem a violar, pela escravatura continuar a verificar-se na África e no Médio Oriente, sobretudo sobre a mulher.
Se o professor Macamo considera esses valores tão elevados que Portugal deveria continuar a pedir desculpa por os ter violado há séculos, então cumpre-lhe fazer tudo para os transportar para África, para os ver consagrados em todas as suas regiões, interiorizados e defendidos pelas suas gentes. Devo devolver-lhe a exigência que nos fazem, passando a ser nós a exigir que denunciem claramente o crime de africanos e islâmicos que agora, por todo o mundo, violam esses valores até ao paroxismo da crueldade. Devemos exigir a todos esses intelectuais e políticos que pretendem dar-nos lições de consciência que assumam essa realidade, ou culpa se assim o preferirem. Sigam Mandela. Combatam por essa causa humaníssima, como muito boa gente se sacrificou por ela na Europa durante séculos.
As elites africanas só poderão liderar a mudança do destino do seu povo se reconhecerem a realidade e assumirem a responsabilidade que hoje realmente lhes cabe. E prepare-se, professor Macamo, para enfrentar a barbárie do islamismo que começa a manifestar-se na sua terra, erva daninha que quando pega nalgum lugar conduz inelutavelmente à ignorância, obscurantismo, destruição, terror, à última expressão da miséria.
Não continuem a abandonar a imensa maioria do islão silencioso, submisso pelo medo e a pobreza, sem instrução, incapaz de discernir e se situar no labirinto de contradições dessa religião primitiva. Maioria silenciosa onde o islão assassino recruta.
Quanto a nós, portugueses e Portugal, o melhor que podemos fazer por africanos e islâmicos é não continuar a alimentar masoquistamente a desculpa que é a vossa vitimização, é afirmar frontalmente a responsabilidade que vos cabe.
Por mim dispenso, portanto, o desvelo com que continuam a preocupar-se com o meu país por causa dessa suposta culpa que deveríamos carregar. Por mim liberto-os desse cuidado. Guardem o vosso tempo para se preocuparem com o vosso país, o vosso martirizado continente, as suas gentes que tanto precisam que se preocupem com elas. Não venham distrair-nos com essa vitimização sem sentido, distrair os nossos governantes daquilo que é importante fazer-se para melhorar Portugal e a vida dos portugueses.
Corrigirem, nomeadamente, as condições para a discriminação que subsistam na nossa sociedade. Erguer uma escola que ensine e eduque pelo conhecimento, pela História contada nas suas grandezas e misérias, para que sejam cada vez mais residuais as manifestações racistas conscientes ou inadvertidas. Manifestações reais, não as imaginadas, que se dispensam.
[1] A sua formulação moderna surgiu de facto na Europa, mas emergiram há mais de dois milénios noutras latitudes, na China, por exemplo, onde Confúcio afirmou a unicidade da espécie humana