Isabel II e Administração Trump atingidos por nova fuga de informação sobre offshores

Os Paradise Papers revelam investimentos da Rainha de Inglaterra em fundos nas ilhas Caimão e ligações do secretário do Comércio nos EUA à Rússia.

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LUSA/FACUNDO ARRIZABALAGA

Foi publicado neste domingo o mais recente capítulo da investigação às offshores por parte do ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação), do qual faz parte em Portugal o semanário Expresso, em que foram analisados mais de 13 milhões de ficheiros que expõem ligações entre a Rússia e o secretário do Comércio da Administração Trump, negócios do responsável de angariação de fundos do primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, e os investimentos da Rainha Isabel II de Inglaterra.

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Foi publicado neste domingo o mais recente capítulo da investigação às offshores por parte do ICIJ (Consórcio Internacional de Jornalistas de Investigação), do qual faz parte em Portugal o semanário Expresso, em que foram analisados mais de 13 milhões de ficheiros que expõem ligações entre a Rússia e o secretário do Comércio da Administração Trump, negócios do responsável de angariação de fundos do primeiro-ministro do Canadá, Justin Trudeau, e os investimentos da Rainha Isabel II de Inglaterra.

Uma das revelações tornadas públicas pelos chamados “Paradise Papers” implica a Rainha Isabel II, cujos gestores pessoais terão investido, a partir de 2007, milhões de euros através de um fundo no paraíso fiscal das ilhas Caimão. 

Grande parte da fuga de informação terá tido origem na Appleby, um escritório de advogados sediado nas Bermudas e com filiais em Hong Kong, Xangai, ilhas Virgens e nas ilhas Caimão, entre outros paraísos fiscais. São quase sete milhões os documentos referentes a este escritório ou a empresas associadas agora revelados.  

Secretário de Trump com ligações à Rússia

As implicações do novo escândalo chegam também à Administração Trump. Sabe-se agora que Wilbur Ross, o multimilionário que é o actual secretário do Comércio dos EUA, detém uma participação numa empresa de transporte marítimo com ligações a outra empresa que é detida, entre outros, pelo genro de Vladimir Putin e por um magnata russo próximo do Presidente russo, e que foi alvo de sanções por parte do Departamento do Tesouro norte-americano.

Ross tinha abdicado da maioria das suas participações em empresas antes de ser nomeado para o Governo norte-americano, mas sabe-se agora que manteve a participação nesta empresa de transporte – a Navigator Holdings Ltd.

A Navigator Holdings Ltd., que opera através das ilhas Marshall, tem uma parceria com a Sibur, uma empresa de gás com sede em Moscovo, cujo co-proprietário é Kirill Shamalov, marido de Katerina Tikhonova, filha de Putin, e também Guennady Timchenko, um oligarca com diversas actividades no sector energético que, segundo o Departamento do Tesouro, estão “directamente ligadas a Putin”.

Segundo a documentação analisada pelo consórcio, a Navigator iniciou esta relação com a Sibur a partir de 2014, altura em que os EUA e a União Europeia começaram a aplicar os pacotes de sanções contra a Rússia devido à intervenção militar na Crimeia. Desde então, a Navigator Holdings Ltd. recebeu 68 milhões de dólares da Sibur.

Rainha Isabel II com investimentos através das ilhas Caimão

Os documentos da Appleby demonstram também como cerca de dez milhões de libras (mais de 11 milhões de euros) dos activos pessoais de Isabel II, geridos e concentrados no ducado de Lancaster, foram utilizados para investimentos num conjunto de empresas através de um fundo nas ilhas Caimão. O ducado havia já tornado público os investimentos imobiliários da Rainha em Inglaterra, nunca tinha sido, porém, revelado a utilização de offshores para outros negócios por parte da monarca.

A partir deste fundo nas Caimão os montantes investidos eram direccionados para empresas, incluindo a cadeia Threshers e a BrightHouse, uma retalhista de capitais de investimento e de crédito, e que foi criticada por alegadamente explorar milhares de famílias pobres e pessoas vulneráveis. O ducado, em resposta ao consórcio, garantiu que a participação na BrightHouse é insignificante, mas não revela a dimensão dos investimentos feitos desde 2005. 

O The Guardian, parceiro do consórcio internacional de jornalistas, aponta também o dedo a lorde Ashcroft, um dos principais financiadores do Partido Conservador de Theresa May, revelando a existência, até hoje desconhecida, de um fundo no valor de 382 milhões de euros sediado nas Bermudas e mediado pela Appleby. O jornal sublinha que não estará em causa qualquer ilegalidade, mas que a revelação traz uma nova dor de cabeça para a primeira-ministra britânica.

Assessor próximo de Trudeau transferiu milhões para offshores

As revelações chegam ainda ao Canadá. Stephen Bronfman, conselheiro próximo do actual primeiro-ministro, Justin Trudeau, e o principal responsável pela angariação de fundos para o partido do governante, transferiu milhões de dólares para as ilhas Caimão juntamente com a família do antigo senador Leo Kolber, que faz parte do Partido Liberal de Trudeau. Esta operação permitiu a poupança em impostos no Canadá, Israel e EUA.

Além disso, os representantes de Bronfman e Kolber foram realizando algumas manobras de bastidores no seio do Parlamento canadiano para que as propostas de lei que visavam os rendimentos a partir de offshores fossem rejeitadas.

Bronfman foi fundamental para que Trudeau chegasse à liderança do Partido Liberal em 2013 e ao cargo de primeiro-ministro em 2015. 

Bono e Madonna também recorreram a paraísos fiscais

Um dos nomes que surgem de forma mais inesperada nos Paradise Papers é o do vocalista dos U2 – Paul Hewson, mais conhecido por Bono. O músico, aponta o The Guardian, utilizou em 2007 uma empresa sediada em Malta, a Nude Estates, em que os investidores estrangeiros pagam apenas 5% de impostos sobre os seus lucros, para adquirir um centro comercial na Lituânia por cerca de 5,8 milhões de euros. A grande superfície passaria depois, em 2012, para as mãos de outra empresa, a Nude Estates 1, na ilha de Guernsey, outro paraíso fiscal. Ao jornal britânico uma porta-voz do cantor defende que o músico irlandês não cometeu qualquer infracção enquanto “investidor minoritário” na empresa maltesa.

Em relação a Madonna, a cantora norte-americana a residir actualmente em Portugal, a investigação do consórcio internacional cita documentos da Appleby que referem um investimento feito em 1998 em acções da SafeGard Medical Limited, uma empresa com sede nas Bermudas, em nome de Shari Goldschmidt.

Paul Allen, co-fundador da Microsoft, e a rainha Rania da Jordânia são outros nomes visados na investigação do consórcio, que promete novas revelações e desenvolvimentos para os próximos dias.