Portugal defende criação de filtros para proteger direitos de autor na Internet
Solução polémica avançada pela Comissão Europeia recebeu o apoio dos governos português, francês e espanhol. YouTube e Facebook já têm mecanismos deste género.
O Governo defende o uso obrigatório de sistemas capazes de detectar quando conteúdo protegido por direitos de autor é publicado sem autorização em plataformas como rede sociais ou sites de partilha de vídeo. A posição vai ao encontro da Comissão Europeia, cuja proposta para a criação destes filtros tem suscitado dúvidas e críticas por parte de alguns políticos, especialistas e grupos de defesa dos consumidores.
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O Governo defende o uso obrigatório de sistemas capazes de detectar quando conteúdo protegido por direitos de autor é publicado sem autorização em plataformas como rede sociais ou sites de partilha de vídeo. A posição vai ao encontro da Comissão Europeia, cuja proposta para a criação destes filtros tem suscitado dúvidas e críticas por parte de alguns políticos, especialistas e grupos de defesa dos consumidores.
Portugal juntou-se a França e Espanha para sugerir alterações à proposta de directiva avançada no ano passado pela Comissão e que está actualmente a seguir o processo legislativo. Este processo implica tipicamente várias emendas por parte do Conselho (que reúne os governos dos Estados-membros e onde as sugestões portuguesas foram apresentadas) e do Parlamento Europeu.
A proposta de emendas foi revelada pela Stateswatch, uma organização sem fins lucrativos que se dedica a monitorizar “as liberdades civis na Europa”. Questionado pelo PÚBLICO, o Ministério da Cultura esclareceu que o documento “reflecte a visão destes países” e que será “objecto de negociação com os restantes países e depois com o Parlamento Europeu, pelo que a sua inclusão não está garantida”. O ministério frisou ainda que a posição portuguesa “foi estabelecida depois de uma consulta pública, aberta a todos os indivíduos e organizações que se quisessem pronunciar”. De acordo com o Governo, participaram nesta consulta mais de 60 entidades públicas e privadas.
As modificações propostas alargam o âmbito do polémico artigo 13.º, que pretende definir que os prestadores de serviços online que disponibilizem conteúdos ao público devem ter mecanismos tecnológicos que analisem esses conteúdos e identifiquem os que estão cobertos por direitos de autor. Os titulares de direitos (como músicos e cineastas) poderão estabelecer acordos com as plataformas para impedir a divulgação ou para serem pagos.
Embora não sejam obrigatórios, estes filtros já existem. O YouTube (que é propriedade do Google, uma empresa que se tem esforçado por melhorar as suas relações com as entidades europeias) tem um sistema que analisa cada vídeo colocado na plataforma em busca de infracções. Caso detecte conteúdo protegido por direitos de autor, o detentor desses direitos tem várias opções: remover o conteúdo, deixá-lo publicado ou colocar anúncios no vídeo e, eventualmente, fazer dinheiro (podendo partilhar as receitas com o utilizador que fez a publicação). No ano passado, também o Facebook criou um mecanismo para os criadores de vídeos poderem identificar cópias não autorizadas.
A proposta portuguesa, francesa e espanhola pretende que estes sistemas sejam obrigatórios para todas as plataformas, ao passo que a versão da Comissão refere apenas as que disponibilizam grandes quantidades de conteúdos. Os três países querem ainda que não seja aplicável nestes casos legislação europeia que desresponsabiliza as plataformas em algumas circunstâncias, nomeadamente quando não têm conhecimento da actividade potencialmente ilegal dos seus utilizadores. Também incluíram salvaguardas com as quais pretendem garantir que os utilizadores que colocam o conteúdo online não sejam identificados.
O documento suscitou várias críticas. Uma das mais duras veio da eurodeputada alemã Julia Reda, eleita pelo Partido Pirata Alemão, cujo programa assenta sobretudo em questões relacionadas com a sociedade da informação e as liberdades online. “Os Governos de França, Espanha e Portugal querem reforçar uma lei proposta pela Comissão Europeia que forçaria todos os tipos de plataformas de Internet a instalar uma ‘máquina de censura’ para vigiar todos os uploads”, escreveu Reda no seu site. A eurodeputada afirmou que se trata de um “ataque à liberdade de expressão” e argumentou que responsabilizar os prestadores de serviços pelos conteúdos lá colocados pelos utilizadores “mataria muitas destas plataformas na Europa e desencorajaria o desenvolvimento de plataformas novas”.
Em Portugal, o Esquerda.net, um site do Bloco de Esquerda (que apoia o Governo no Parlamento), publicou um texto em que recorre também à expressão “máquinas de censura” usada por Reeda, e no qual afirma que os filtros “seriam incapazes de garantir o direito à citação, à paródia, ou à utilização privada sem intuito comercial”.
Já o Ministério da Cultura contrapôs ao PÚBLICO que “a posição de Portugal tem sido a de procurar um equilíbrio na protecção dos direitos de autor na Internet e evitar a utilização abusiva de obras protegidas”. O ministério referiu também que a medida “não se aplica obviamente a comunicações privadas, nomeadamente actos de cópia de documentação privada/pessoal para serviços de armazenamento, ainda que situados na nuvem (como as contas pessoais na Dropbox, iCoud, [Google] Drive). Também não se aplica a actos de partilha de informação e de comunicação realizados privadamente.”