O Burundi já não é membro do Tribunal Penal Internacional
O país africano abandonou a instituição que é responsável pelo julgamento de crimes de guerra e contra a humanidade. Investigação às mortes, prisões e desaparecimentos forçados naquele país vai continuar.
O Burundi tornou-se o primeiro país membro do Tribunal Penal Internacional a formalmente abandonar aquele organismo responsável pela investigação e julgamento de genocídio e outros crimes contra a humanidade – que vários países africanos acusam de parcialidade e preconceito contra as nações do continente.
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O Burundi tornou-se o primeiro país membro do Tribunal Penal Internacional a formalmente abandonar aquele organismo responsável pela investigação e julgamento de genocídio e outros crimes contra a humanidade – que vários países africanos acusam de parcialidade e preconceito contra as nações do continente.
O processo de retirada do Burundi da instituição internacional, criada sob a égide das Nações Unidas em 2002, foi iniciado há um ano e completou-se este fim-de-semana. Outros dois países africanos, a Gâmbia e a África do Sul, que comunicaram à ONU a sua intenção de se desvincularem do tribunal na mesma altura, acabaram por arrepiar caminho e desistir da ideia. O Burundi junta-se assim ao pequeno grupo de Estados que não reconhecem a jurisdição do TPI: Estados Unidos da América, Israel, China, Rússia e Índia.
Numa primeira reacção, o TPI garantiu que a saída do Burundi não terá nenhuma implicação ou efeito sobre o trabalho dos procuradores que estão a investigar a violência e a violação dos direitos humanos naquele país, na sequência dos protestos que eclodiram em 2015 quando o Presidente Pierre Nkurunziza anunciou a sua recandidatura a um terceiro mandato.
“A retirada do Burundi não afecta a investigação preliminar da situação do país que já estava em curso, nas mãos da procuradora chefe Fatou Bensouda”, afirmou o porta-voz do TPI, Fadi El Abdallah, à Associated Press. O inquérito começou em Abril de 2016, e abrange suspeitas de assassínios, desaparecimentos forçados, detenções arbitrárias, tortura e violência sexual. Mais de 230 mil pessoas fugiram do país.
O processo envolve mais de 500 testemunhas, que identificaram membros da polícia, do Exército e dos serviços nacionais de informação como suspeitos dos crimes, assim como os membros da milícia juvenil Imbonerakure, um grupo de jovens ligados ao partido do Presidente.
Uma comissão da ONU pediu no mês passado que o tribunal acelerasse o seu trabalho, depois de constatar que crimes contra a humanidade, incluindo homicídios e violações, continuam a ocorrer no Burundi.
“A retirada do TPI é apenas o último exemplo dos deploráveis esforços do Governo do Burundi para proteger da punição da justiça aqueles que são responsáveis por graves violações dos direitos humanos”, criticou o vice-director da Human Right’s Watch, Param-Preet Singh.
Na sua cimeira deste ano, a União Africana lançou um apelo aos líderes do continente para manifestarem à ONU o seu desejo de abandonar o TPI, num braço de ferro que pretendia chamar a atenção para o que denunciam como o preconceito e parcialidade do organismo, acusando-o de manter uma “justiça selectiva” contra os países africanos. Não foi a primeira posição de força da região contra o TPI: vários países concordaram em desrespeitar o mandato internacional para a detenção do Presidente do Sudão, Omar al Bashir, emitido pelo tribunal em 2009 pelo crime de genocídio no Darfur.