Declaração de Costa ao país fez disparar moção de censura do CDS
PSD sugere que dará apoio a iniciativa do seu antigo parceiro.
Foram as declarações do primeiro-ministro ao país, na segunda-feira à noite, que fizeram disparar a moção de censura do CDS que já estava a ser ponderada. Assunção Cristas, ao que o PÚBLICO apurou, defendeu a iniciativa com um argumento arrasador: se 104 mortos não é motivo para censurar o Governo, então o que será?
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Foram as declarações do primeiro-ministro ao país, na segunda-feira à noite, que fizeram disparar a moção de censura do CDS que já estava a ser ponderada. Assunção Cristas, ao que o PÚBLICO apurou, defendeu a iniciativa com um argumento arrasador: se 104 mortos não é motivo para censurar o Governo, então o que será?
Depois de há quatro meses, a hipótese de o CDS avançar com uma moção de censura ter sido discutida no núcleo duro do partido, uma nova tragédia nos incêndios voltou a colocar a iniciativa em cima da mesa. A gota de água terá sido o discurso de António Costa que os dirigentes do CDS consideraram não ter nada de novo face há 4 meses: Nenhuma assunção de responsabilidades nem um pedido de desculpas. Em suma, nenhuma humildade, depois da “inimaginável repetição da tragédia” de Pedrógão Grande como acabou por argumentar a líder do CDS, ao início da tarde desta terça-feira, quando anunciou aos jornalistas a apresentação da moção de censura. É a primeira que o governo de António Costa enfrenta desde que assumiu funções em Novembro de 2015, com o apoio parlamentar do PCP, BE e PEV.
A decisão de avançar com a moção, ao que o PÚBLICO apurou, não entusiasmou todos os dirigentes da mesma forma mas ganhou novos apoios internos desde que foi debatida há quatro meses. O risco é que o Governo possa sair com uma imagem reforçada – depois de uma votação a favor de toda a maioria parlamentar de esquerda – mas sobretudo que o primeiro-ministro se possa vitimizar e acabar por capitalizar a iniciativa a seu favor. Já na Juventude Popular, a proposta de avançar com uma moção de censura foi já defendida esta segunda-feira pelo seu líder – Francisco Rodrigues dos Santos – e acabou por ser aprovada por unanimidade na comissão política daquela estrutura.
Com os vice-presidentes e outros dirigentes sentados na primeira fila da sala de imprensa da sede do partido em Lisboa, Assunção Cristas justificou a iniciativa que, caso fosse aprovada, provocaria a queda do Governo: “A total incapacidade de assumir as responsabilidades, de pedir desculpas e assumir as indemnizações”. O texto deverá ser entregue na quinta-feira, o que atira o debate e votação para o início da próxima semana, já que entre a apresentação e a discussão o prazo máximo é de três dias.
O CDS aproveita também um momento em que o PSD tem uma discussão de liderança em curso e em que actual presidente está mais resguardado. Passos Coelho não deverá intervir no debate quinzenal desta quarta-feira. O PSD remete para amanhã uma decisão final sobre o sentido de voto na moção do CDS, depois de uma reunião extraordinária da bancada parlamentar, mas deverá ser no sentido de apoiar a iniciativa do seu antigo parceiro de coligação. “Não será surpresa para ninguém que o PSD não esteja disponível para apoiar o Governo cujo comportamento se tem traduzido num falhanço absoluto no exercício das suas funções e cuja passividade e incompetência ajudou a que estas tragédias acontecessem”, afirmou José Matos Correia, presidente do conselho estratégico do PSD. O dirigente desfez, no entanto, qualquer dúvida sobre se o partido iria assumir iniciativa idêntica: O PSD não avançará com uma moção de censura por “não ser tradição” nem fazer parte do seu “ADN”. Matos Correia acabou por desvalorizar a iniciativa do CDS ao dizer que “há várias formas” de manifestar indignação e que o PSD vai continuar a usar essas formas.
Tanto Passos Coelho como o Presidente da República foram informados previamente ao anúncio da moção de censura por parte de Assunção Cristas. O primeiro-ministro disse apenas que respeita a decisão “constitucional” do CDS.
Até hoje, só Cavaco foi derrubado por uma moção de censura ao Governo. Na história da democracia, houve várias moções de censura, mas só uma foi aprovada na Assembleia da República: em 1987, pela mão do PRD, que caía um executivo liderado por Cavaco Silva.