As “ambiguidades diluidoras”
O dilema do PSD é profundo. Entre um partido ideologicamente diferenciado mas condenado à oposição, e um partido ideologicamente indiferenciado mas com esperança de regressar mais depressa ao poder, duvido que os militantes do PSD optem pela clareza ideológica
Nas comemorações do 5 de Outubro, Marcelo Rebelo de Sousa deixou um recado ao PSD: na hora de votar, convinha que os portugueses tivessem à disposição “vários caminhos” alternativos, já que “a existência de alternativa quanto à governação é sempre preferível às ambiguidades diluidoras, que só reforçam os radicalismos anti-sistémicos”. Que é como quem diz: escolher um António Costa laranja para liderar o PSD é capaz de não ser boa ideia. O fantasma das “ambiguidades diluidoras” é precisamente aquilo que irá assombrar as próximas eleições no PSD, que serão com quase toda a certeza um momento marcante na história da democracia portuguesa, dada a absoluta necessidade de escolher um de dois caminhos: ou o PSD guina à esquerda em nome de uma social-democracia e corre o risco de ser o Dupond do Dupont socialista; ou o PSD mantém um discurso e um rumo liberal que não tem concorrência ideológica em Portugal, mas que, para todos os efeitos, foi parcialmente derrotado no domingo (digo “parcialmente” porque a incompetência na escolha de nomes fortes para Lisboa e para o Porto nada teve de ideológico).
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Nas comemorações do 5 de Outubro, Marcelo Rebelo de Sousa deixou um recado ao PSD: na hora de votar, convinha que os portugueses tivessem à disposição “vários caminhos” alternativos, já que “a existência de alternativa quanto à governação é sempre preferível às ambiguidades diluidoras, que só reforçam os radicalismos anti-sistémicos”. Que é como quem diz: escolher um António Costa laranja para liderar o PSD é capaz de não ser boa ideia. O fantasma das “ambiguidades diluidoras” é precisamente aquilo que irá assombrar as próximas eleições no PSD, que serão com quase toda a certeza um momento marcante na história da democracia portuguesa, dada a absoluta necessidade de escolher um de dois caminhos: ou o PSD guina à esquerda em nome de uma social-democracia e corre o risco de ser o Dupond do Dupont socialista; ou o PSD mantém um discurso e um rumo liberal que não tem concorrência ideológica em Portugal, mas que, para todos os efeitos, foi parcialmente derrotado no domingo (digo “parcialmente” porque a incompetência na escolha de nomes fortes para Lisboa e para o Porto nada teve de ideológico).
Nenhuma das duas opções é isenta de riscos. A minha opção favorita é conhecida, e, pelos vistos, partilhada pelo Presidente da República: preferia que o PSD continuasse a defender abertamente menos Estado e melhor Estado, apostando na dinâmica de uma sociedade civil vitaminada, em vez de reforçar o dirigismo milenar a partir do Terreiro do Paço. Felizmente, esta opção há muito que deixou de ser solitária. Quem acompanha a opinião publicada em Portugal terá de reconhecer que nos últimos anos têm-se multiplicado os defensores do pensamento liberal, seja em blogues muito participados como O Insurgente ou o Blasfémias; seja no grande impacto do Observador e da sua secção de opinião; seja em meios académicos, com destaque para o Instituto de Estudos Políticos da Universidade Católica; seja no próprio meio político, não só com o posicionamento do PSD da era Passos, mas também com o surgimento do projecto Iniciativa Liberal, cuja ambição passa pela formação de um novo partido.
O desejo de viver num país emancipado do Estado-Papá é abundante e politicamente motivador, sobretudo para quem não vive de rendimentos públicos. Mas não é claro se este pensamento, que também é o meu, consegue ultrapassar as curtas margens de uma elite intelectual, urbana e burguesa, com muita força para mobilizar opiniões mas muito pouca força para mobilizar votos. A verdade é esta: falta testar o liberalismo em tempos de crescimento económico, e é perfeitamente possível que os cortes no intervencionismo estatal só sejam aceites pelos portugueses em casos de absoluta inevitabilidade – como aconteceu com a intervenção da troika –, não correspondendo a qualquer vontade estruturada de modificar o statu quo.
O dilema do PSD é profundo e a tentação das “ambiguidades diluidoras” demasiado forte. Entre um partido ideologicamente diferenciado mas condenado à oposição, e um partido ideologicamente indiferenciado mas com esperança de regressar mais depressa ao poder, duvido que os militantes do PSD optem pela clareza ideológica. Aliás, este é um combate tanto político quanto geracional, com os velhos barões apegados a uma ideia (já meio mitológica) de social-democracia cavaquista, e os jovens turcos a sonharem com uma democracia liberal europeia. Gostava muito que ganhassem os segundos. Desconfio que vão ganhar os primeiros.